sexta-feira, 28 de outubro de 2005

Kitáb-i-Iqán (7)

A Dupla Condição dos Profetas

No Novo Testamento, as seguintes palavras são atribuídas a Jesus Cristo: “Eu e o Pai somos Um”(Jo 10:30) e “O Meu Pai é maior do que Eu”(Jo 14:28). No Alcorão, estão registadas as seguintes palavras de Maomé: “Sou o Servo de Deus”(19:31) e “Sou apenas um homem como vós”(18:110). A comparação de frases como estas é frequente por parte de cristãos e muçulmanos ao argumentar sobre a superioridade do Profeta fundador da sua religião, ou sobre a Sua condição divina. É o tipo de discussão que facilmente se torna interminável.

Relativamente a este tipo de diferenças, os ensinamentos baha’is consideram que é possível olhar para os Profetas sob duas perspectivas: a condição divina e a condição humana. Ao considerarmos os Profetas olhando à Sua condição divina, percebemos que Eles possuem as mesmas características, desempenham o mesmo papel de intermediários entre o Criador e a humanidade, e não é possível fazer distinção entre Eles.

No entanto, é com facilidade que se encontra quem faça distinção entre os Profetas, apontando alguma(s) característica(s) que um parece evidenciar e outros não. A esse respeito, Bahá'u'lláh escreveu no Kitáb-i-Íqán:
Estes atributos de Deus não são, e nunca foram, concedidos especialmente a certos Profetas e negados a outros. Não, todos os Profetas de Deus, Seus favorecidos, santos e escolhidos Mensageiros, são, sem excepção, portadores dos Seus nomes e incorporam os Seus atributos... Por não haverem estas Essências do Desprendimento manifestado, aparentemente, certo atributo de Deus, não se deve inferir, em absoluto, que estas Auroras dos Seus atributos, os Tesouros dos Seussantos nomes, realmente não o tivessem possuído. [110]
Assim, segundo os ensinamentos baha’is, ao considerarmos a condição divina dos Profetas não podemos encontrar diferenças entre Eles. O facto dos Profetas partilharem os mesmos atributos divinos, permite que se identifiquem uns com os outros, e inclusive sejam identificados pelo mesmo nome. Desta forma, cada vez que surge um novo Profeta, é correcto dizer que Ele é o regresso dos Profetas anteriores [162]. Ainda sobre este assunto é possível fazer a seguinte analogia: os Mensageiros de Deus são como o sol que surge em dias diferentes, mas é sempre o mesmo sol.

Sob uma perspectiva humana, podemos identificar alguns aspectos distintos de cada Profeta. Cada um possui um nome, uma individualidade própria, e uma Missão específica (apresentando ensinamentos de acordo com as necessidades e capacidades dos povos a quem se dirige). Desta forma, os ensinamentos éticos e sociais de cada religião apresentam diferenças entre si. Sob esta distinção material que se pode fazer entre os Profetas, Bahá'u'lláh escreveu no Kitáb-i-Íqán:
É por causa desta diferença na sua condição e missão, que as palavras e afirmações provenientes desses Mananciais do Conhecimento Divino parecem divergir... Como a maioria dos homens não soube apreciar essas condições a que Nos referimos, sente-se, portanto, confusa e perplexa perante afirmações divergentes pronunciadas por Manifestantes que são, essencialmente, um e o mesmo.[192]
Desta forma, se algum Profeta afirma “Eu sou Deus” isso é uma metáfora perfeitamente consistente com a sua condição divina; o Profeta não é fisicamente semelhante ao Omnipotente (reflectem os Seus atributos, mas não possuem a Sua Essência); e se algum Profeta afirma “Sou apenas um homem” essa afirmação deve ser considerada de acordo com a sua condição material. É extremamente importante ter presente a dupla condição dos Profetas para podermos compreender as Suas palavras e ensinamentos.

5 comentários:

João Moutinho disse...

Parabéns pelo excelnete trabalho que tens feito neste blog.
O Kitáb-i-Iqán é o selar dos sêlos de que o Apocalipse, escrito por João, fala?

Anónimo disse...

Porque não um deus humano? Um abraço.

João Moutinho disse...

Nkhululeko,
Há deuses feitos pelos homens de diverso tipos, desde ideais utópicos a imagens esculpidas mas DEUS só poder ser Um, O incogniscível.

Marco Oliveira disse...

Joao,
Segundo o livro do Daniel (12:4), os livros sagrados estariam "selados até ao tempo do fim". Numa perspectiva baha'i, isto significa que os livros sagrados, pela sua natureza e estilo possuem um conjunto de significados que apenas se torna claro com o aparecimento de um novo Profeta.

De certa forma isso foi o que aconteceu com Jesus, quando muitos dos Seus seguidores de origem judaica perceberam um novo significado nas escrituras judaicas. O mesmo se passou no tempo de Maomé, quando vários dos Seus seguidores de origem judaica e cristã perceberam novos significados nas escrituras.

No Kitáb-i-Iqán descrevem-se vários significados das escrituras das religiões anteriores e apresenta-se um modelo de interpretação dessas escrituras. Desta forma, pode-se considerar como o momento em que foi "quebrado o selo" que mantinha os livros fechados (Ap 5:9, 20:12).

Marco Oliveira disse...

Nkhululeko,
Eu acredito que Deus é transcendente. Está acima de tudo o que possamos dizer ou pensar a respeito d’Ele. Não acredito que Ele seja imanente à criação, mas antes que se reflecte na criação.
Claro que isto não é uma verdade absoluta; é apenas a minha maneira de entender a realidade (ou aquilo que me parece ser a realidade...)