segunda-feira, 27 de março de 2006

Será que um Baha'i deve acreditar cegamente em Bahá'u'lláh?

Uma questão que coloquei a vários bahá'ís. Aqui ficam as respostas.
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Claro que deve acreditar cegamente em Bahá'u'lláh, pois Ele tem em si os nossos olhos!

(JMF)


É pá a tua pergunta, de alguma forma deveria ser melhor explicada, mas segundo aquilo que entendi, a minha resposta é a seguinte:

Se estás a falar de um bahá'í apronfundado nas Escrituras Sagradas, idealmente não só as Escrituras Bahá'ís, com experiência, e que tenha aceitado Bahá'u'lláh quer pela razão mas também pelo coração, deve ou não acreditar em Bahá'u'lláh cegamente, eu respondo que sim. Não há razão para persistir na dúvida depois de se fazer uma descoberta intensa e bem estruturada. Muita gente hoje em dia caí no erro de se viciarem no processo de busca, pelo que mesmo quando encontram o que procuram, não querem acreditar e seguem procurando porque de alguma forma dão mais valor ao processo de busca do que ao objectivo dele.

Agora, para um novo bahá'í que ainda não conhece bem as leis bahá'ís, e a própria Revelação de Bahá'u'lláh, acho de alguma forma justificável e aceitável que hajam dúvidas na sua Fé. O processo de desenvolvimento espiritual de um bahá'í, é em tudo idêntico ao dos outros crentes das outras religiões, requer tempo, desejo e empenho da própria pessoa. É claro, uns precisam mais tempo do que outros.

Em resumo: Acho que o resultado final do processo de busca e conhecimento do Manifestante Divino é chegar ao ponto de não haver dúvidas sobre a realidade do Manifestante Dívino, neste caso falamos de Bahá'u'lláh, logo acreditar cegamente nas Suas palavras e leis. Mas isso só é válido se a busca for verdadeira e pura, o que a meu ver significa, ser impulsionada pelo coração e suportada pela razão.

(Pedro Reis)


Marco, para mim é claro. Acreditamos com toda a visão dos nossos olhos interiores em Bahá'u'lláh! O "cegamente" é paleio de quem só usa os olhos limitados que estão imbutidos na face. Estes dão-nos a perspectiva de uma realidade limitada e incompleta.

Beijinhos!

(Stella)


Em princípio, penso que sim, mas aí tudo depende da Fé de cada um.

Antes de nos tornarmos baha'is, como é natural, temos todo o direito de O questionarmos, mas uma vez que O aceitemos como um Mensageiro de Deus, então creio que isso deixa de fazer sentido.

Porém, como não somos perfeitos, nossa fé costuma ter altos e baixos, e às vezes fraquejamos.

(Coriolano J. S. Corrêa)


Questão dificil Marco, porque acho que acima de tudo é uma questão de Fé e coração e não puramente intelectual e da mente. Duvido que alguem se torna Baha'i meramente via debate intelectual ou provas materiais. A dada altura, ou algo nos toca a alma e coração ou nada ...achamos tudo muito bonito e até podemos achar os principio validos mas isso em si não prova divinidade a ninguem :-)

(Navid)


Não penso que seja essa a Sua vontade.

(JMoutinho)


Se Bahá'u'llah ensinou a livre investigação da verdade, teria querido que todas as pessoas que O conhecessem viessem a pôr em causa algumas das coisas sobre as quais falou, escreveu e que fazem parte integrante da Sua Mensagem. Um Bahá'i deve ser alguém que aceita conscientemente os princípios da Fé Bahá'i.

Como é evidente, há coisas que nós não entendemos e que nos parece que não se aplicam aos nossos dias, mas deve haver boas razões, por parte do Manifestante de Deus para as ter citado como parte de um código de vida. Essas coisas, têm a ver mais com o desenvolvimento da Sociedade em que nos inserimos, pois os princípios espirituais são imutáveis e muito semelhantes a tudo o que os outros Manifestantes de Deus disseram. Portanto, acho que alguém que acredita em Bahá'u'llah não O aceitou "cegamente". Reconheceu nele as qualidades ensinadas pelos Manifestantes que O precederam e acredita que os ensinamentos que nos deixou, levarão à construção de um mundo mais equilibrado onde a Humanidade seja como as "ondas de um só mar" e "as flores de um só jardim".

Ser bahá'i não é abdicar dos ensinamentos dos outros Manifestantes de Deus, é conseguir um "valor acrescentado" à Mensagem Divina, ao aceitar Bahá'u'llah!

(Maria Lagos)


Great question! The answer is, I believe, no. Here are a few quotes and links:

A humanity which has come of age no longer needs the language of parable and allegory; faith is not a matter of blind belief, but of conscious knowledge. Nor is the guidance of an ecclesiastical elite any longer required: the gift of reason confers on each individual in this new age of enlightenment and education the capacity to respond to Divine guidance."(Baha'i International Community Office of Public Information, Baha'u'llah, 1991, p. 5)

"[Baha'i]Apologetics must show that faith is not blind belief but is the culmination of the full exercise of humankind's essential nature as 'the rational soul'." (Ian Klug "Apologetics: A Personal Vision")

"I believe that reason and faith do not contradict each other but are two mutually reinforcing means to comprehend reality. The Baha'i principle of the harmony between science and religion highlights this matter. According to this principle, Science, without religion, will lead mankind into an age of materialism and can be abused to produce dangerous and destructive developments that are in contrast to the purpose of science, which is to be of benefit to humankind.
Pursue of religion on the other hand, without a belief in science, is going to result in blind superstition." (Carlo Schroeder, "My Faith and Me")

(George Dannells)


I'm not sure the question really applies. Because Baha'u'llah says that we should seek out the truth for ourselves, we must be educated. At the same time, we must have faith that if we believe in Him, we must follow His laws, regardless of whether we understand all of the reasons behind them. Faith and reason must go hand in hand, otherwise religion becomes superstition.

(Please don't use my name. :-))


Creo que un bahá'í debe creer en Bahá'u'lláh con tanta certeza como cree que el agua es fluida, que el fuego consume, y que el sol saldrá mañana, pero debe buscar respuestas, así como un verdadero investigador busca conocer y entender la naturaleza del agua, del fuego, y el movimiento de rotación de la tierra.

(Husayn Villar)

11 comentários:

GWD disse...

Thank you for posing such great questions, Marco!

Anónimo disse...

Marco

Metendo a colher numa pergunta que não me foi feita, mas querendo “alimentar” um pouco a discussão, cito-te de um post recente: “Quando a interpretação literal dos textos sagrados vai contra a ciência, então devemos procurar os significados simbólicos do texto.”
Nesta perspectiva os bahais nunca podem acreditar “cegamente” em Bahá'u'llháh. O que hoje parece algo indiscutível pode muito bem amanhã tornar-se totalmente diferente (significado simbólico) sob a luz da Ciência. Aliás, nesta perspectiva, para os bahais a Ciência seria a única regra que aceitariam “cegamente”. Mas mesmo aqui há um problema: ela também está sujeita à mudança. Em que ficamos então? Talvez o Bahais acreditem apenas “cegamente” no presente, no momento histórico em que vivem. E isso talvez tenha alguma consistência com a “revelação progressiva”, a “evolução”, que é uma das bases da sua crença.

Anonymous #2

Maria Lagos disse...

Comentando o Anónimo:

Estamos a falar na forma como acreditamos em Bahá'u'llah e nos Seus ensinamentos e se listarmos os ensinamentos básicos, eles contêm toda a sabedoria para a unidade do mundo e para o desenvolvimento do espírito do homem, nesta época. É a mensagem eterna, legado deixado aos poucos pelos anteriores manifestantes de Deus e compilada e ampliada por Bahá'u'llah. Já lá dizia Jesus o Cristo:"Trago-vos um mandamento novo - que vos ameis uns aos outros como irmãos" - Bahá'u'llah chega no ciclo da unidade de toda a humanidade. Esta é necessária e urgente. Todos os Seus ensinamentos giram à volta dela.
Por outro lado, ao investigador, Bahá'u'llah explica que os princípios espirituais estarão em consonância com a ciência e a razão. São verdades gémeas e não antagónicas; logo a livre investigação da verdade deve ser um desafio para toda a gente e não um entrave. Há muita coisa que a ciência ainda não revelou, mas cada vez vemos que mais cientistas, na sua ânsia de descobrir o oculto, declaram que, mesmo em relação ao cérebro humano e às suas reacções há coisas que a ciência ainda não consegue explicar e que só a fé explica (ver PSICOLOGIA DA CONSCIÊNCIA - do Prof Mário Simões)
Acima de tudo não devemos ser fanáticos. Ter uma mente aberta, pronta a redescobrir Deus dentro de nós, levar-nos-á, certamente, a ter uma fé muito mais consciente e esse é o grande desafio que a Fé Bahá'i nos traz.

Marco Oliveira disse...

Meu caro Anonymous #2,

As tuas “colheradas” só ajudam! :-)

Tanto a ciência como a religião são construções mentais que tentam descrever a realidade. Diria que são complementares; e acrescento que nenhuma é absoluta ou definitiva. O nosso entendimento de Deus, dos Seus Manifestantes e da nossa caminhada colectiva e individual em direcção ao Criador tem evoluído ao longo dos tempos. E o nosso conhecimento do mundo natural também tem evoluído; não podemos acreditar na ciência como um conjunto de verdades absolutas e definitivas. Parece, pois que a única coisa constante que temos é a evolução e a mudança.

Como baha'i, acho que não devo acreditar cegamente em Bahá’u’lláh. Isso seria abdicar da faculdade de raciocínio; e Ele próprio disse que a razão é a maior dádiva concedida por Deus ao ser humano. Aliás há duas ou três questões em que eu tenho dificuldade em compreender os ensinamentos baha'is. Um dia destes ainda vou escrever sobre isso.

Anónimo disse...

Marco a tua resposta leva-me a colocar-te uma questão sobre a qual eu me tenho interrogado ultimamente:
Tu próprio dizes que tens dificuladades em te rever nos ensinamentos bahais quanto a algumas questões...eu revejo-me em muitas coisas dos ensinamentos bahais. A questão que eu agora te coloco é: o quê que é essencial para alguém se considerar bahai e o quê que é susceptivel de ser entendido de forma diversa por cada um sem que isso ponha em causa a sua identidade bahai?

Marco Oliveira disse...

A identificação com uma religião e a adesão a uma comunidade religiosa implicam uma aceitação de vários princípios, leis e ensinamentos. Mas nesse processo deve haver bom senso.

Na religião baha’i existem princípios básicos que um crente deve aceitar e tentar vivê-los no seu dia a dia. Entre esses princípios poderia referir o abandono de todas as formas de preconceito, a igualdade de oportunidade entre homens e mulheres, o reconhecimento da unidade e relatividade da verdade religiosa, e a eliminação dos extremos de pobreza e de riqueza.

Também existem ensinamentos que um baha’i não pode negar: Deus existe, revela-se progressivamente à humanidade, os Seus Mensageiros (e respectivos ensinamentos) são o melhor meio para conhecermos o Criador. Como eu costumo dizer a mensagem de Bahá’u’lláh pode resumir-se à frase "a terra é um só país e a humanidade os seus cidadãos"; este é outro ensinamento que não podemos negar.

Como escrevi, em relação a tudo isto deve haver bom senso para perceber o que é essencial e o que é acessório. Por exemplo, para mim, os princípios e ensinamentos que enunciei nos parágrafos anteriores são essenciais e inquestionáveis. Mas por exemplo, a posição baha’i relativamente ao nascimento de Cristo (que é semelhante à da Igreja Católica) para mim é difícil de compreender. Mas esse não é um ensinamento essencial da religião baha’i; não é algo que me impeça de me identificar como baha'i, ou que se transforme num obstáculo entre mim e a Fé.

Também é importante que quem deseja aceitar a Fé Bahá'í tenha conhecimento certas leis como não tomar bebidas alcoólicas e não-envolvimento em actividades políticas partidárias. Não faz sentido uma pessoa querer aderir à Comunidade Bahá'í e manter reservas relativamente a leis como estas.

Anónimo disse...

Há uma questão sobre a fé Bahai que tu focas que eu só descobri recentemente e por isso ainda não pude confrontar os bahais que conheço com ela:
qual é o fundamento para que um bahai prescinda de uma parte da sua cidadania ao não poder participar em actividades politicas?
E se participar, é expulso da comunidade?

Marco Oliveira disse...

João,
Eu não tenho dúvidas que a democracia é um sistema preferível a qualquer ditadura. Mas a democracia é um sistema que pode ser aperfeiçoado.

A política partidária tal como a conhecemos nos sistemas democráticos tem vários problemas. Na teoria, cada partido tenta ser um "pacote de ideias e sugestões". E o que pode fazer um cidadão que defende a ideia X do partido A e a ideia Y do partido B? Nesta situação, não terá ele a sua cidadania "estrangulada" ao ser obrigado a votar num partido A ou B?

O envolvimento na política partidária acaba por ser uma aposta num sistema que sabemos ter limitações (e até pode ter aspectos menos claros, se considerarmos os que por vezes os partidos são a fachada de vários lobbies). Envolvermo-nos nas guerrilhas e intrigas inerentes àquilo que eufemisticamente se designa por “combate político” será um acto de cidadania?

Recordo que o sistema de administração da comunidade baha’i se apresenta como um modelo alternativo às actuais democracias. Assim, como baha’i sinto que tenho obrigação de mostrar que o sistema administrativo baha’i funciona e é uma melhoria face aos sistemas democráticos tal como estamos habituados; é como se quisesse mostrar ao mundo que existem alternativas viáveis. Foi com base nisso que apresentei aqui uma proposta de reformulação do nosso sistema eleitoral.

No entanto, isto não significa que os baha’is sejam abstencionistas crónicos. Eu sempre voto em todas as eleições. Mas quando o faço, tenho mais em conta as pessoas em que voto dos que as ideias dos partidos que elas integram (e por isso torna-se mais fácil para mim votar em eleições presidenciais).

Regra geral, os baha’is que se envolvem na política partidária perdem os seus direitos administrativos (não podem votar, nem ser eleitos nas eleições baha’is, e não podem participar em algumas reuniões da comunidade). A expulsão é uma penalização muito rara; só sei de dois casos e trataram-se de pessoas que se diziam baha’is, mas atacavam toda e qualquer coisa que se identificasse com a Fé.

Anónimo disse...

Esta questão é complexa e, sinceramente, se relativamente a muitos principios eu me identifico sem quaisquer reservas com a fé bahai, neste aspecto fico um bocado de "pé atrás". Não tanto pelo desejo de fazer carreira politica, que não o tenho, mas mais pelo carácter exclusivista e limitador desta regra que não vai de encontro à ideia que eu faço da fé bahai, mas enfim admito que é uma questão sobre a qual não meditei devidamente...é mais a sensação que causa!
Os casos de expulsão que conheces são do teu conhecimento pessoal ou são "históricos". Se for esta ultima hipótese podes dar mais pormenores sobre eles? (pelos vistos sobre este tema ainda não escreveste nenhum post-:)

Marco Oliveira disse...

João,
Os casos que conheço melhor são "históricos".
Essencialmente essas situações aconteceram após o falecimento de Baha'u'llah, o falecimento de 'Abdu'l-Bahá e o falecimento de Shoghi Effendi.

Nesses três momentos, houve quem não concordasse com o processo de sucessão (mesmo quando existia um testamento por escrito que o legitimava). Essas pessoas que se revoltaram contra a sucessão, foram expulsas da comunidade.

O livro "The Covenant of Baha'u'llah" (de Adib Taherzadeh) tem longas descrições sobre estas situações.

Anónimo disse...

Nossa, só encontrei esse post hoje, queria tê-lo visto em 2006 haha. Bem existe uma lógica em aceitar cegamente a vontade de Deus (através dos manifestantes), mas, eis que o próprio Manifestante pede para que procuremos entender. Existe uma confusa entre a submissão ao Clero de outrora e ao próprio Deus então, seguir cegamente,se tornava uma coisa muito perigosa. Mas a busca pela compreensão dos Escritos e seus estudos, que são questionamentos, são ótimas maneiras de se desenvolver a fé (mas não as únicas). Se muitas pessoas em todas as religiões o fizessem, buscando o espírito do que foi dito e não a literalidade citada, provavelmente teriam aceitado as Manifestações de Deus em tantas épocas.