sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Montaigne



«Não deverá surpreender, afirmou certa vez um antigo, que o acaso possa exercer tão grande influência sobre nós, uma vez que vivemos justamente do acaso. A quem não tenha dedicado toda a sua vida a um único objectivo, torna-se impossível dispor convenientemente das acções individuais. Quem não disponha de uma concepção única do todo jamais poderá ordenar rigorosamente as partes.

Para que servirá afinal fornecer a alguém a paleta de todas as cores, se esse alguém não souber o que pintar? Ninguém será capaz de prever toda a sua vida e somos incapazes de viver de outra forma que não seja por parcelas. Afinal, o archeiro deve conhecer primeiramente o seu alvo e só depois acomodar a mão, o arco, a corda, a flecha e os movimentos.

Nunca existirá um vento favorável para aquele que não sabe a que porto se dirigir. Somos todos apenas pedaços, e de uma textura tão informe e diversa que cada peça e cada movimento fazem o seu próprio jogo. Por isso encontramos, na relação com os outros, uma distância tão grande quanto aquela que os outros encontram na sua relação connosco.»

Montaigne, 1533–1592 (Ensaios)

(Tradução de Rui Bebiano)

2 comentários:

FL disse...

Gostei particularmente da segunda. O tradutor foi meu professor hehe.

Marco Oliveira disse...

O teu professor além de ter bom gosto também foi bastante simpático em permitir que eu copiasse o trabalho dele.
:-)