terça-feira, 10 de junho de 2014

Meninas, Livros e Terror

Um texto de David Langness.


O que assusta  os fundamentalistas fanáticos e terroristas mais do que qualquer outra coisa? Uma menina com um livro.

Sei que soa como uma piada de mau gosto, mas é uma triste verdade.

Na semana passada, a República Islâmica do Irão permitiu que os seus Guardas Revolucionários profanassem e destruíssem o cemitério Bahá'í em Shiraz, onde está sepultada Mona Mahmudnizhad.

Mona Mahmudnizhad
Talvez se lembrem de Mona, se já eram nascidos em 1983 e estivessem atentos. Era uma adolescente entusiasta e brilhante com óptimo aproveitamento escolar, que se ofereceu para dar aulas para crianças e ajudava num orfanato. Tinha dezassete anos quando foi enforcada.

O mundo reagiu com indignação. As condenações vieram de todos os lados. Todas as nações civilizadas se manifestaram contra as sentenças de morte. Vários artistas escreveram livros e músicas em honra de Mona.

Enviado para o cadafalso com outras nove mulheres Bahá’ís, todos foram mortas por enforcamento, em vez de negar a sua fé. Elas não violaram qualquer lei, mas o governo iraniano fez a temível acusação de apostasia - o terrível crime de pertencer a uma religião progressista, que promove a paz no mundo, a unidade racial, a igualdade entre homens e mulheres e a unidade essencial de todas as religiões.

Três dessas corajosas almas eram mulheres casadas - Nusrat Yalda'i, Mrs. Tahirih Siyavushi, e 'Izzat Janami Ishraqi. As outras sete eram adolescentes e jovens solteiras com cerca de 20 anos: Roya Ishraqi, Zarrin Muqimi, Shirin Dalvand, Akhtar Sabit, Simin Saberi, Mahshid Nirumand, e Mona Mahmudnizhad.

Tentem imaginar o momento na sala do tribunal em que o juiz diz: "Se negares a tua fé, deixamos-te sair. Se não o fizeres, serás enforcada."

Todas as dez mulheres se recusaram a pronunciar as palavras que salvariam as suas vidas.

Para a maioria de nós, esse nível de coragem excede os limites da imaginação. Penso muitas vezes nessas dez mulheres, e fico maravilhado com a coragem e firmeza da sua recusa colectiva a curvarem-se perante a coerção final. Eles deram a vida pelas suas convicções, enfrentaram os homens que as desonraram, e disseram "não" a um estado fundamentalista; elas não se submeteram à sua intolerância e ao ódio. Elas desafiaram mecanismo de extermínio fanático do Irão, e triunfaram.

Como? Na morte, estas dez mulheres nunca serão esquecidas. Pensem nisso só por um instante. Os seus torturadores, os seus perseguidores, o juiz que deliberou as suas ímpias sentenças, os políticos brutais e os chamados clérigos que se abstiveram de intervir, o carrasco que colocou a corda nos seus pescoços – quem se lembrará deles? Quando eles forem para as suas sepulturas, como iremos todos nós, as suas vidas estarão para sempre manchadas pela sua injustiça e crueldade; o mundo vai esquecê-los de forma completa e absoluta. O pó dos seus ossos irá misturar-se com a terra sob os seus caixões, enquanto nós continuaremos a homenagear o carácter e a coragem das suas vítimas.

Recentemente, quando os terroristas do Boko Haram na Nigéria sequestraram cerca de 300 alunas, pensei novamente em Mona e nas mulheres Bahá’í que morreram com ela. E perguntei-me: o que há de tão ameaçador sobre as meninas educadas?

Parece que uma menina com um livro assusta algumas pessoas mais do que qualquer coisa.

Malala Yousefzai, a menina paquistanesa com quinze anos de idade que os Talibans balearam na cabeça por defender a educação universal, deu ao mundo um excelente exemplo dessa cobardia inimiga das meninas. Mona e as suas compatriotas mostraram que o governo iraniano, que espanca publicamente as mulheres por não se "cobrirem", tem o mesmo receio de mulheres modernas, capacitadas e educadas. Os terroristas do Boko Haram, ao sequestrarem centenas de estudantes cristãs e ao forçá-las a converterem ao seu tipo de Islão fundamentalista - um acto bárbaro que todos os muçulmanos civilizados abominam e rejeitam – partilham obviamente desse mesmo terror sobre meninas com livros. Aparentemente, os Talibans, o Boko Haram e os mullás fundamentalistas iranianos sabem que as jovens educadas representam o fim do seu poder e dos seus privilégios.

Mas não se pense que este medo é um problema que se confina ao fundamentalismo islâmico. Em todo o mundo, literalistas de diferentes espécies ocupam-se activamente a negar uma educação escolar às meninas. Muitas sociedades "tradicionais" entre hindus, budistas e judeus e cristãos e até mesmo algumas culturas não-religiosas fazem exactamente a mesma coisa, reprimindo, contendo e controlando firmemente a população feminina, negando às jovens qualquer tipo de educação e impedindo-as de desenvolver o seu potencial.

Do ponto de vista Bahá’í, nada poderia ser mais repreensível e retrógrado:
De acordo com o espírito desta época, as mulheres devem progredir e cumprir a sua missão em todos os sectores da vida, tornando-se iguais aos homens. Elas devem estar ao mesmo nível que os homens e gozar os mesmos direitos. Esta é a minha oração fervorosa e é um dos princípios fundamentais de Bahá'u'lláh. (‘Abdu’l-Bahá, Baha’u’llah and the New Era, p. 147).
Na verdade, os Bahá'ís acreditam que o mundo não pode alcançar a paz sem conceder a todas as mulheres a plena igualdade:
A emancipação da mulher - a concretização da plena igualdade entre os sexos - é um dos pré-requisitos mais importantes, embora dos menos reconhecidos, para o estabelecimento da paz. A negação dessa igualdade perpetra uma injustiça contra metade da população do mundo, e promove entre os homens atitudes e hábitos nocivos que são transportados do ambiente familiar para o local de trabalho, para a vida política, e, em última análise, para a esfera das relações internacionais. Não existem quaisquer fundamentos morais, práticos ou biológicos que justifiquem essa privação. Só quando as mulheres forem bem recebidas em todos os campos de actividade humana, em condições de igualdade, é que se criará o clima moral e psicológico do qual poderá emergir a paz internacional. (A Casa Universal de Justiça, A Promessa da Paz Mundial)
Se você está interessado em alcançar a igualdade, promover a paz e terminar com a opressão em todo o mundo, eduque uma menina.

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Texto original: Girls, Books and Terror (bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site BahaiTeachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

1 comentário:

Simplesmente Sônia Maria disse...

Marco , lindissima e importante argio,,Repassei para minhas Comunidades no Google..Um abraço.Sonia