sábado, 12 de setembro de 2015

Por uma ecologia integral

Por Arthur Dahl.


Os Profetas de Deus devem ser considerados como médicos cuja tarefa consiste em promover o bem-estar do mundo e de seus povos, para que, através do espírito da unidade, possam curar a doença de uma humanidade dividida (Bahá'u'lláh, SEB, XXXIV)
Depois de diagnosticar as muitas doenças - tal como Bahá'u'lláh, o Fundador da Fé Bahá'í, fez no século XIX e as instituições internacionais Bahá'ís têm feito mais recentemente - a recente encíclica do Papa Francisco descreve a transformação fundamental das necessidades mundiais para resolver os seus graves problemas ambientais e económicos. Não será suficiente - declaram os ensinamentos Bahá'ís e a encíclica papal - realizar uma série de acções urgentes e parciais para os problemas imediatos da poluição, degradação ambiental e esgotamento dos recursos naturais:
Deveria ser um olhar diferente, um pensamento, uma política, um programa educativo, um estilo de vida e uma espiritualidade que oponham resistência ao avanço do paradigma tecnocrático. (¶111)

Se a crise ecológica é uma expressão ou uma manifestação externa da crise ética, cultural e espiritual da modernidade, não podemos iludir-nos de sanar a nossa relação com a natureza e o meio ambiente, sem curar todas as relações humanas fundamentais… Com efeito, não se pode propor uma relação com o ambiente, prescindindo da relação com as outras pessoas e com Deus. (¶119)

Não haverá uma nova relação com a natureza, sem um ser humano novo. (¶118)

O que está a acontecer põe-nos perante a urgência de avançar numa corajosa revolução cultural. A ciência e a tecnologia não são neutrais, mas podem, desde o início até ao fim dum processo, envolver diferentes intenções e possibilidades que se podem configurar de várias maneiras. Ninguém quer o regresso à Idade da Pedra, mas é indispensável abrandar a marcha para olhar a realidade doutra forma, recolher os avanços positivos e sustentáveis e ao mesmo tempo recuperar os valores e os grandes objectivos arrasados por um desenfreamento megalómano. (¶114)
Não podemos segregar o coração humano do ambiente exterior e dizer que assim que um deles for reformado tudo será melhor. O homem é orgânico com o mundo. A sua vida interior molda o ambiente e é, também ela própria, profundamente afetada por este. Um actua sobre o outro e cada mudança permanente na vida do homem é o resultado destas reacções mútuas. (de uma carta escrita em nome da Casa Universal de Justiça, de Março de 1985).
Os primórdios dessa mudança já são aparentes. "A humanidade autêntica, que convida a uma nova síntese, parece habitar no meio da civilização tecnológica de forma quase imperceptível" (¶112). Este tema também foi abordado nas declarações da Comunidade Internacional Bahá'í nas Nações Unidas, tais como "Repensar a Prosperidade: Forjando Alternativas para a cultura de consumismo" (2010)

A encíclica do Papa Francisco, no capítulo 4, apela a uma ecologia integral, que respeite claramente as suas dimensões social e humana:
A ecologia estuda as relações entre os organismos vivos e o meio ambiente onde se desenvolvem. E isto exige sentar-se a pensar e discutir acerca das condições de vida e de sobrevivência duma sociedade, com a honestidade de pôr em questão modelos de desenvolvimento, produção e consumo. Nunca é demais insistir que tudo está interligado. (¶138)

Isto impede-nos de considerar a natureza como algo separado de nós ou como uma mera moldura da nossa vida. Estamos incluídos nela, somos parte dela e compenetramo-nos... É fundamental buscar soluções integrais que considerem as interacções dos sistemas naturais entre si e com os sistemas sociais. Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise sócio-ambiental. As directrizes para a solução requerem uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza. (¶139)
"Mas, ao mesmo tempo, torna-se actual a necessidade imperiosa do humanismo", diz o Papa Francisco, "que faz apelo aos distintos saberes, incluindo o económico, para uma visão mais integral e integradora" (¶141). "A ecologia humana implica também algo de muito profundo que é indispensável para se poder criar um ambiente mais dignificante: a relação necessária da vida do ser humano com a lei moral inscrita na sua própria natureza." (¶155). É animador ver o Papa a abordar temas a que muitos de nós temos dedicado as nossas vidas, e que por isso reflectem claramente a perspectiva Baha'i:
Todos se devem unir e concordar: todos são gotas de um rio, águas de um mar, brisas de um jardim, regatos que fluem de uma fonte, pássaros voando de uma montanha, jacintos que adornam um parque intoxicados com um vinho, e com os seus corações arrebatados por uma melodia. ('Abdu'l-Bahá, Star of the West, Volume 10, p. 173.)
Na sua encíclica, o Papa também reconhece a necessidade de abordagens que atinjam o nível da comunidade local e que tornem a ciência mais acessível. A ecologia apela a uma maior atenção às culturas locais quando se estudam os problemas ambientais, favorecendo um diálogo entre a linguagem técnico-científica e a linguagem do povo. A cultura é mais do que simplesmente o que herdámos do passado; é também, e acima de tudo, uma realidade viva, dinâmica e participativa, que não pode ser excluída quando repensamos a relação entre os seres humanos e o meio ambiente. Isso inclui a importante contribuição das culturas indígenas e a necessidade de uma maior participação no planeamento urbano.

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Texto original: An Integral Ecology, Based on Oneness (bahaiteachings.org)


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Arthur Lyon Dahl foi investigador do Museu de História Natural de Washington e consultor da UNCED (United Nations Conference on Environment and Development). É autor de diversas publicações e actualmente é Presidente do Forum Ambiental Internacional, em Genebra (Suiça)

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