sábado, 28 de novembro de 2015

A aposta de Pascal

Por David Langness.


No mundo humano, se nós não compreendemos o mundo divino, será isso uma prova de que o mundo de Deus não existe? (‘Abdu'l-Bahá, Divine Philosophy, p. 117)
O leitor gosta de fazer apostas? Quer arriscar fazer uma pequena aposta?

Blaise Pascal, o físico, matemático e filósofo francês que viveu no século XVII, escreveu a famosa “aposta de Pascal”, um dos argumentos mais influentes e revolucionários sobre religião e crença alguma vez apresentados. Pascal afirmou que todos fazemos uma aposta com as nossas vidas sobre a eternidade. Vejamos o seu raciocínio:
  • Deus existe, ou não existe. A vida continua após a morte, ou acaba.
  • Temos de apostar a nossa própria vida num ou noutro. Já existimos; por isso devemos apostar.
  • A razão não pode tomar a decisão, porque Deus, por definição, transcende a nossa capacidade de raciocínio.
  • Então, vamos avaliar ganhos e perdas da aposta:
  • Se Deus existe e você acredita, então você ganha um valor infinito - a vida e a felicidade eternas.
  • Se Deus existe e a vida é eterna, e você aposta contra essa possibilidade, então as perdas serão enormes no outro mundo.
  • Se Deus não existe e você decide a acreditar e agir como se Ele existisse, então você perde muito pouco.
  • Consequentemente, uma pessoa racional deve procurar a espiritualidade, planear viver eternamente, e viver como se Deus existisse.
Esta ideia inovadora e de simplicidade aparente, causou muitos e prolongados debates e discussões nos últimos 400 anos. A aposta de Pascal criou uma área de estudo chamada Teoria da Decisão; e assinalou um grande avanço no que hoje é conhecido como Probabilidade ou Teoria dos Jogos; contribuiu muito para os novos ramos da filosofia como o existencialismo e o pragmatismo. E tornou-se uma das primeiras vezes em que um filósofo aplicou lógica e racionalidade a uma escolha espiritual.

Na sua aposta, Pascal aconselhou-nos a tomar as nossas decisões importantes da vida com base numa análise racional de risco e recompensa:
... Você tem de apostar. Não é opcional. Você já está envolvido. Qual será a sua escolha, então? Vejamos. Porque você tem de escolher, vamos ver o que lhe interessa menos. Você tem duas coisas a perder, a verdade e o bem; e estão duas coisas em jogo, a sua razão e a sua vontade, o seu conhecimento e a sua felicidade; e sua natureza deve fugir de duas coisas, do erro e da miséria. A sua razão não fica mais chocada por escolher um ou outro, pois é necessário escolher. Este ponto está resolvido. Mas, e a sua felicidade? Vamos avaliar o ganho e a perda em apostar que Deus existe. Vamos estimar essas duas possibilidades. Se você ganhar, ganha tudo; se você perder, não perde nada. Apostemos, então, sem hesitação, que Ele existe. (Pascal, Pensées)
Esta forma racional de olhar e avaliar uma escolha essencialmente espiritual também teve um profundo impacto sobre a forma como as pessoas pensam sobre as suas crenças - trazendo a tomada de decisão pessoal, a liberdade de escolha e a investigação independente da verdade para a equação.

No tempo de Pascal, dificilmente alguém tinha o luxo de fazer uma escolha pessoal em matéria de religião. Em vez disso, as pessoas nasciam num sistema de crenças como se fosse um peso da sua herança, cultura ou localização geográfica, não tendo oportunidade de procurar a verdade religiosa por si próprias, e com reduzida margem de escolha nesta matéria. Na era do Iluminismo, porém, as coisas mudaram. O aumento dos níveis de educação e alfabetização fez com que cada vez mais pessoas pudessem decidir por si próprias, depois de considerar cuidadosamente os prós e contras, e avaliar o que seu próprio intelecto e intuição lhes dizia sobre a verdade.

Assim, basicamente, Pascal pede-nos que analisemos a crise da nossa existência, e ao mesmo tempo admite a nossa falta de compreensão plena. Ele reconhece os limites da razão, mas diz que devemos confiar nela. Ele descreve a humanidade como um grupo de seres finitos cercado por uma realidade infinita e essencialmente incognoscível; e acrescenta que nos encontramos "empurrados do não-ser para o ser, durante uma vida breve, apenas para sair novamente, sem qualquer explicação sobre o 'Porquê?'"

Sendo impossível provar através da razão a existência e a não existência de Deus, Pascal afirma que cada pessoa deve pesar as possíveis consequências da sua crença e tomar uma decisão pragmática e bem fundamentada com esses factores em mente. ‘Abdu’l-Bahá e Pascal concordariam que está muita coisa em jogo:
... O homem é imortal e eterno. Aqueles que acreditam em Deus, que estimam o Seu amor, e que atingiram a certeza, gozam aquela vida abençoada a que chamamos vida eterna; mas aqueles que estão velados de Deus, ainda que estejam dotados de vida, vivem nas trevas e a sua vida, em comparação com a dos crentes, é não-existência. (‘Abdu'l-Bahá, Some Answered Questions, (newly revised version), p. 281)

-----------------------------
Texto original: Exploring the New Scientific Proofs for God’s Existence (www.bahaiteachings.org)

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

Sem comentários: