sábado, 13 de fevereiro de 2016

Política, Religião e Tirania

Por David Langness.


Os ensinamentos Bahá’ís opõem-se de forma determinada e veemente ao despotismo e à tirania.

Durante os últimos quarenta anos da Sua vida, Bahá'u'lláh sofreu a tortura, o exílio e a prisão; tudo isso foi decretado e executado por tiranos e déspotas dos governos persa e otomano. Ele manifestou-Se repetidamente contra esses déspotas e seus regimes opressivos; chegou mesmo a enviar de uma série de cartas e epístolas aos Reis, governantes e líderes religiosos do mundo, anunciando a revelação que Ele tinha recebido e convocando-os para a paz universal, unidade e cooperação internacional.

Bahá'u'lláh pediu aos líderes políticos do mundo que estabelecessem a paz com outras nações, tratassem dos seus assuntos com justiça, reduzissem a impostos injustos destinados a financiar armas e guerras, e enfrentassem a terrível pobreza entre os seus povos. Além da forte oposição de Bahá'u'lláh ao poder dos governos tirânicos, as escrituras Bahá'ís defendem um modelo de federação de nações numa ordem mundial unida. 'Abdu'l-Bahá expressou este princípio Bahá'í fundamental a um alto funcionário do governo dos Estados Unidos, dizendo:
Podeis melhor servir o vosso país se, na vossa capacidade de cidadão do mundo, envidardes todos os esforços que contribuam para a aplicação futura do princípio do federalismo subjacente ao governo do vosso próprio país nas relações já existentes entre os povos e nações do mundo. (The World Order of Baha’u’llah, p. 37)
Assim, considerando este sólido conceito Bahá'í de uma federação descentralizada de nações sem tirania ou despotismo, podem os Bahá'ís participar na actividade política?

Não. Os Bahá'ís evitam a política partidária, e vêem a sua fé como essencialmente não-política.

Então como é que os Bahá'ís concebem uma futura ordem mundial, se não como uma organização política? E muitas pessoas perguntam como pode mesmo existir uma ordem mundial sem algum tipo de embate e envolvimento político? Não é o sistema político partidário algo inevitável? E quanto ao princípio Bahá'í da unidade mundial: se isso acontecer, não irão os Bahá'ís querer participar na governação do mundo?

Para começar a responder a essas perguntas, vamos começar por analisar como os ensinamentos Bahá'ís concebem uma futura ordem mundial, a partir dos escritos de Shoghi Effendi, o Guardião da Fé Bahá'í:
A unidade da raça humana, tal como previsto por Bahá'u'lláh, implica o estabelecimento de uma comunidade mundial em que todas as nações, raças, credos e classes estão íntima e permanentemente unidas, e em que a autonomia dos seus Estados membros, e a liberdade e iniciativa pessoais dos indivíduos que as compõem estão definitiva e completamente salvaguardadas. Esta comunidade deve, tanto quanto a podemos visualizar, incluir um parlamento mundial, cujos membros, enquanto fideicomissários de toda a humanidade, irão, em última análise, controlar todos os recursos de todas as nações que o constituem, e promulgar leis que sejam necessárias para regular a vida, satisfazer as necessidades e organizar as relações entre todas as raças e povos. Um executivo mundial, apoiado por uma força internacional, executará as decisões e aplicará as leis promulgadas por este parlamento mundial, e protegerá a unidade orgânica de toda a comunidade mundial. Um tribunal mundial julgará e emitirá o seu veredicto vinculativo e final em todas e quaisquer disputas que possam surgir entre os vários elementos que constituam este sistema universal. (The World Order of Baha’u’llah, p. 202)

Montesquieu
A visão Bahá'í de uma nova comunidade mundial das nações inclui os três elementos clássicos - um órgão legislativo mundial democraticamente eleito; um executivo mundial; e um tribunal mundial. A ideia destes componentes governamentais equilibrados é familiar para os cidadãos de muitos países soberanos do mundo; foi proposta pela primeira vez por Aristóteles, usada pelos gregos e romanos nas suas incipientes democracias, e, posteriormente, desenvolvida em 1748, por Montesquieu, o filósofo político francês do Iluminismo. Designado sistema tripartite, esta separação interna de poder político entre os três ramos do governo - legislativo, executivo e judicial - evita a excessiva centralização e a potencial tirania de uma oligarquia ou ditadura. Os governos democráticos mais avançados de hoje usam este sistema, e os ensinamentos Bahá'ís recomendam a sua aplicação numa escala mundial.

As escrituras Bahá'ís afirmam que esta visão de uma comunidade mundial, o sonho de poetas, filósofos e profetas durante milénios, só pode acontecer quando:
... um certo número de seus soberanos ilustres e magnânimos ... deve, para o bem e a felicidade de toda a humanidade, erguer-se, com firme determinação e visão clara, para estabelecer a causa da Paz Universal. Eles devem fazer da Causa da Paz o objecto de consulta geral, e procurar, por todos os meios ao seu alcance, estabelecer uma União das nações do mundo. Eles devem criar um tratado vinculativo e estabelecer uma aliança cujas cláusulas sejam sólidas, invioláveis e bem claras. Devem proclamá-la a todo o mundo e conseguir para ela a sanção de toda a raça humana. Este empreendimento supremo e nobre - a verdadeira fonte de paz e bem-estar de todo o mundo - deve ser considerado sagrado por todos os que habitam na terra. Todas as forças da humanidade devem ser mobilizadas para garantir a estabilidade e permanência dessa Mais Grandiosa Aliança. Neste Pacto abrangente, os limites e fronteiras de cada nação devem ser claramente fixados, os princípios subjacentes às relações entre governos devem ser definitivamente estabelecidos, e todos os acordos e obrigações internacionais devem ser averiguados. De igual modo, a dimensão dos armamentos de cada governo deve ser estritamente limitada, pois se fosse permitido aumentar os preparativos para a guerra e as forças militares de qualquer nação, isso despertaria a suspeita das outras. (Abdu'l-Bahá, The Secret of Divine Civilization, p. 64)

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Texto original: Politics, Religion and Tyranny (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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