sábado, 2 de julho de 2016

Como acabar com a corrupção?

Por David Langness.


Ó povo, não causes corrupção na terra e não disputes com os homens; pois, em verdade, isso não é digno de quem escolheu uma condição que, de facto, permanecerá segura, ao abrigo do seu Senhor. (Bahá’u’lláh, Tablet of the Branch)
Quando inicialmente se deu a fuga de informação dos Papéis do Panamá - cerca de 11,5 milhões de documentos - surgiram manchetes sensacionalistas em todo o mundo. Líderes políticos, magnatas e celebridades foram referidos e identificados como directores de empresas de fachada que escondiam milhares de milhões de dólares da tributação legítima. Fizeram-se ouvir protestos indignados de muitos lados, exigindo que os países alterem as suas leis bancárias e parem de servir como paraísos fiscais para os super-ricos. A corrupção e suborno também tinham uma presença forte nesta história, porque muitos dos políticos e líderes eleitos não tinham qualquer fonte de rendimento visível além dos seus salários relativamente pequenos.

No fundo, é difícil compreender que uma pessoa acumule mil milhões de dólares, quando o seu salário somado ao longo de mil anos não atinge esse valor.

Muito especialistas e comentadores acreditam e afirmaram, que este tipo de corrupção óbvia vai deixar as pessoas ainda mais desconfiadas em relação aos governos. O que pensa disto?

Em todo o mundo, a confiança nos governos caiu dramaticamente ao longo das últimas décadas. O alheamento em relação ao processo político, já está em níveis muito elevados, tem aumentando rapidamente. Os “candidatos de protesto” externos ao sistema político; uma sensação de impotência e isolamento; uma crença generalizada de que todos os governos são corruptos; e uma convicção geral de que o governo já não trabalha para o bem do povo, mas apenas serve uma elite rica; cada um destes sintomas de alienação política tem demonstrado uma força crescente em todo o mundo.

As sondagens mostram que a erosão da confiança pública no governo - um fenómeno mundial - começou na década de 1960, quando proliferaram tumultos, assassinatos, guerras desnecessárias e escândalos políticos ; e também quando a comunicação social noticiava cada vez mais sobre estes problemas. O Pew Research Center tem perguntado aos americanos se eles confiam no seu governo desde 1958; os resultados mostram que em 1964, 77% confiavam. Mas passada uma década, o nível de confiança caiu para menos de 25%. Hoje, está no nível mais baixo alguma vez medido: 19%.

A Gallup World Poll chegou a conclusões semelhantes na sua recente sondagem sobre confiança global nos governos nacionais dos países desenvolvidos realizada para a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). Realizada em todos os 34 países membros da OCDE, revelou que a confiança geral também tinha recuado para um novo mínimo de 40%.

Em geral, parece que não confiamos nos nossos dirigentes. Então o que podemos fazer em relação a essa falta de confiança? Como podemos erradicar e libertar-nos da corrupção que parece ser uma doença na nossa política e nos nossos governos?

Os ensinamentos Bahá’ís apresentam uma solução:
É óbvio que somente quando o povo for educado, somente quando a opinião pública estiver correctamente focada, somente quando os funcionários governamentais - mesmo os de mais baixo escalão - estiverem livres do mais pequeno vestígio de corrupção, pode o país ser devidamente administrado. Só quando a disciplina, a ordem e a boa governação atingirem um nível em que um indivíduo, mesmo que faça os maiores esforços, seja incapaz de se desviar da rectidão, na medida da espessura de um fio de cabelo, poderão as desejadas reformas serem consideradas totalmente estabelecidas.

Além disso, toda e qualquer instituição, mesmo que seja o instrumento do maior bem para a humanidade, pode ser mal utilizada. O seu uso adequado, ou abuso, dependem dos vários níveis de discernimento, capacidade, fé, honestidade, dedicação e magnanimidade dos líderes de opinião pública. (‘Abdu’l-Bahá, The Secret of Divine Civilization, p. 16)
As virtudes civilizadoras da honestidade, do dever, da lealdade tão centrais ao progresso humano são cultivadas pela linguagem do coração e pela voz da consciência. Imperativos legais e penalizações, apesar de essenciais, são limitados na sua eficácia. Perceber as raízes espirituais que estão no coração da identidade e propósito humanos é libertar o único impulso que pode garantir a transformação social genuína. Assim, na perspectiva Bahá’í, o aparecimento de instituições públicas geradoras de confiança pública e isentas de corrupção, está intimamente ligada ao processo de desenvolvimento moral e espiritual. Tal com Bahá’u’lláh confirma: “Enquanto a natureza de uma pessoa se entregar às paixões malignas, o crime e a transgressão prevalecerão” (Overcoming Corruption and Safeguarding Integrity in Public Institutions: A Baha’i Perspective, statement from the Baha’i International Community, pp. 2-3)
Fundamentalmente, os Bahá’ís acreditam que o carácter moral de cada líder - e de cada ser humano - baseia-se no nível de desenvolvimento espiritual da pessoa:
Depois de reajustar o aspecto moral da humanidade, então realizar-se-á a maior unidade; mas sem este reajustamento moral é impossível estabelecer a harmonia e a concórdia, pois é um facto que a guerra, conflito, atrito e luta, são apenas os resultados visíveis de deterioração da moralidade e da corrupção de carácter. ('Abdu’l-Bahá, Divine Philosophy, pp. 176-177)
A única forma real e duradoura de acabar com a corrupção, dizem os ensinamentos Bahá'ís, é começar pelo indivíduo:
Para vós, desejo distinção espiritual - isto é, deveis tornar-vos eminentes e distintos na moral. No amor de Deus, deveis tornar-vos distintos de tudo o resto. Deveis tornar-vos distintos por amar a humanidade, pela unidade e pela harmonia, pelo amor e pela justiça. Em resumo, deveis tornar-vos distintos em todas as virtudes do mundo humano - pela lealdade e pela sinceridade, pela justiça e pela fidelidade, pela firmeza e pela constância, pelas obras filantrópicas e serviços ao mundo humano, pelo amor para com todos os seres humanos, pela unidade e pela harmonia com todas as pessoas, pela remoção de preconceitos e promoção da paz internacional. ('Abdu’l-Bahá, The Promulgation of Universal Peace, p. 187)

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Texto original: How Do We Really End Corruption? (www.bahaiteachings.org)

Artigo anterior: Imposto Único ou Imposto Progressivo?

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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