domingo, 10 de julho de 2016

Morrer por alguma coisa? As mortes de Cristo e do Báb

Por Hussein Ahdieh.


Você morreria por alguma coisa? Consegue pensar em alguma coisa - a sua família, as suas crenças, os seus valores, as suas convicções - que tenha mais valor do que a sua vida física?

Neste ano, durante a comemoração do Martírio do Báb, dei comigo a pensar nestas questões e sobre de sacrifício final do Bab. O Báb, o arauto da Fé Bahá'í, deu a Sua vida desejando fazer levar avante vários ideais e trazer ao mundo um novo conjunto de convicções progressistas. Depois, o meu pensamento foi para o martírio de Tahirih - essa grande seguidora do Báb e defensora da emancipação das mulheres - e em seguida, para os outros, incluindo os meus próprios antepassados. Estes incluíam homens válidos que morreram lutando em defesa própria durante os tumultos de Nayriz em 1850 e 1853, e também mulheres, idosos e até mesmo crianças que morreram numa marcha da morte de Nayriz para Shiraz, em 1853. Todos eles seguiam os novos ensinamentos das religiões Bábi e Bahá’í e todos eles sofreram tremendamente pelas suas crenças. Para além destes casos óbvios, testemunhamos agora milhares de Bahá’ís contemporâneos cujas vidas são interrompidas ao ser-lhes negada a assistência médica, ou prejudicadas pela humilhação diária ou negação de acesso ao ensino superior.

Os martírios do Báb e Tahirih foram consentidos. Eles proclamaram um novo sistema de crença que ameaçava a autoridade e política e eclesiástica; e como resultado, foram vítimas de assassinato decretado pelo Estado. Eles aceitaram as suas mortes físicas resolutamente. Depois deles, milhares de Bábis e Bahá’ís morreram com a mesma atitude nas mãos de multidões ou do Estado. A sua conduta espiritual, tal como os mártires cristãos no Império Romano, identificou-os como pessoas comuns que apenas queriam viver pacificamente e seguir uma nova religião. Por causa disso, foram submetidos a horrores indescritíveis.

Local de Martírio do Báb, em Tabriz (Irão)
Mas porque a Fé Bahá'í valoriza a racionalidade acima da obediência cega aos mullahs locais, os Bahá’ís tinham tendência a ser melhor sucedidos do que os seus vizinhos, frequentemente agarrados a processos tradicionais. E porque os princípios Bahá’ís destacam a importância da educação das raparigas, as futuras mães de todos, as gerações seguintes de Bahá’ís floresceram. Isso provocou inveja entre os que ficaram para trás devido à ignorância; e a inveja em grande escala levou a mais perseguições.

Até agora, todas as gerações de Bábis e Bahá’ís no Irão sofreram. Além disso, o nosso sofrimento tem sido voluntário. Poderíamos afastar-nos da nossa Fé. Mas não o fizemos, não o fazemos e não o faremos.

Ninguém sabe o que o futuro pode trazer - que testes e dificuldades irão surgir. Mas sabemos que as qualidades da perseverança e do sacrifício, quando confrontam a adversidade, dão uma nova esperança mundo. Agora, os esforços e as confirmações dos Bábis e dos primeiros Bahá’ís são uma fonte de inspiração. Shoghi Effendi, o Guardião da Fé Bahá'í, comparou o martírio do Bab ao martírio de Cristo:
Na realidade, não seria exagero dizer que em lugar algum de toda a extensão da literatura religiosa mundial, excepto nos Evangelhos, encontramos algum registo relacionado com a morte de qualquer um dos fundadores das religiões do passado comparável ao martírio sofrido pelo Profeta de Shiraz [o Bab]. Um fenómeno tão estranho, tão inexplicável, confirmado por testemunhas oculares, corroborado por homens de reconhecida competência, e admitido pelo governo, assim como por historiadores não-oficiais entre as pessoas que tinham jurado hostilidade eterna à Fé Bábí, pode ser considerado verdadeiramente como a mais maravilhosa manifestação das potencialidades únicas com as quais tinha sido dotada a Dispensação prometida por todas as Revelações do passado. A paixão de Jesus Cristo, e, na verdade, todo o Seu ministério público, por si só oferece um paralelo com a Missão e morte do Báb, um paralelo que nenhum estudante de religião comparada pode deixar de perceber ou ignorar. Na juventude e humildade do Inaugurador da Dispensação Bábi; na extrema brevidade e turbulência do Seu ministério público; na rapidez dramática com que esse ministério atingiu o seu clímax; na ordem apostólica que Ele instituiu, e na primazia que Ele conferiu a um dos seus membros; na coragem do Seu desafio às convenções rituais e leis consagradas pelo tempo, que tinham sido tecidas pela religião em que Ele próprio tinha nascido; no papel que uma hierarquia religiosa, oficialmente reconhecida e firmemente arreigada, desempenhou como principal instigador dos ultrajes que Ele sofreu; nas indignidades que se acumularam sobre Ele; na brusquidão da Sua prisão; no interrogatório a Que foi submetido; no escárnio derramado, e na flagelação infligida sobre Ele; na afronta pública que Ele aguentou; e, por fim, na Sua suspensão ignominiosa perante o olhar de uma multidão hostil - em tudo isto não podemos deixar de discernir uma semelhança notável com as características distintivas da carreira de Jesus Cristo.

Deve ser lembrado, no entanto, que, além de o milagre associado à execução do Báb, Ele, ao contrário do fundador da religião Cristã, não deve ser apenas considerado como o autor independente de uma Dispensação divinamente revelada, mas também deve ser reconhecido como o Arauto de uma nova Era e inaugurador de um grande ciclo profético universal. Nem o facto importante deve ser esquecido que, enquanto os principais adversários de Jesus Cristo, durante a Sua vida, foram os rabinos judeus e os seus associados, as forças formadas contra o Báb representavam os poderes civis e eclesiásticos combinados da Pérsia, que, desde o momento da Sua declaração até à hora da Sua morte, persistiram, uniram-se e, com todos os meios à sua disposição, conspiraram contra os defensores e difamaram os princípios da sua Revelação. (Shoghi Effendi, God Passes By, p. 56)
Ambos, Cristo e o Báb, morreram voluntariamente por um conjunto de ideais universais centrados no amor, na paz e na unidade. Os Seus sofrimentos e os Seus triunfos deviam fazer-nos perguntar se há alguma coisa pela qual podíamos morrer.

-----------------------------
Texto original: What Would You Die For? The Deaths of Christ and the Bab (www.bahaiteachings.org)

 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Hussein Ahdieh nasceu em Nayriz, no Irão. Na sua adolescência foi viver para os Estados Unidos, onde mais tarde estudou História da Europa e concluiu um Doutoramento em Educação. Foi um elemento chave na criação da Harlem Preparatory School, de Nova Iorque; foi director do Programa de Estudos Superiores da Universidade de Fordham. É autor dos livros Abdu'l-Bahá in New York, AWAKENING: A History of the Babí and Bahá'í Faiths in Nayriz e de numerosos artigos e ensaios.

Sem comentários: