domingo, 5 de fevereiro de 2017

Música: a linguagem do coração



Ser músico e ser Bahá’í permite-me ter duas perspectivas que prendem a minha atenção – especialmente quando convergem.

Os ensinamentos Bahá’ís dizem muito sobre a música e o seu impacto arrebatador na alma humana:

Tornámos legítimo para vós ouvir música e canto. Acautelai-vos, porém, para que a sua audição não vos leve a ultrapassar os limites da conveniência e da dignidade. Que o vosso prazer seja o prazer nascido do Meu Mais Grandioso Nome, um nome que trouxe arrebatamento ao coração e encheu de êxtase as mentes daqueles que se aproximaram de Deus. Em verdade, fizemos da música uma escada para as vossas almas, um meio pelo qual elas se possam elevar ao reino no alto; não a façais, pois, como asas para o ego e a paixão. Em verdade, repugna-nos ver-vos contados entre os insensatos. (Bahá’u’lláh, The Most Holy Book, ¶ 51)

Com isto em mente, vamos ver no dicionário a definição de quatro palavras-chave nesta citação: conveniência, dignidade, ego e paixão:

Conveniência: o que convém a alguém; qualidade do que é apropriado ao fim a que se destina; adequação; conformidade; pertinência; vantagem; interesse; proveito;
Dignidade: título ou cargo que confere a alguém uma posição elevada; cargo honorífico; honraria; qualidade moral que infunde respeito; respeitabilidade; autoridade moral; decência; gravidade; modo digno de proceder; atitude nobre; nobreza; grandeza; consciência do próprio valor; pundonor;
Ego: o ser enquanto entidade consciente; auto-estima;
Paixão: sentimento intenso e geralmente violento (de afecto, ódio, alegria, etc.) que dificulta o exercício de uma lógica imparcial; objecto desse sentimento; grande predilecção; parcialidade; grande desgosto; sofrimento intenso;

Obviamente, estas palavras têm muitas conotações com coisas em que podemos pensar quando vemos o que se passa hoje no mundo da música.

É verdade que não estamos no século 19, mas no século 21. No entanto, os ensinamentos Bahá’ís pedem-nos que clarifiquemos as definições que seguimos – as que vêm do nosso Criador ou as definições mais correntes e populares prontamente disponíveis para todos nós através de vários meios, nomeadamente a TV, o cinema, a literatura e também a música.

Músicos e artistas Bahá’ís vêem o nosso papel como expoentes de uma Nova Ordem Mundial. Fazemos música para elevar a alma humana “ao reino no alto”, o que ajuda a criar unidade e harmonia entre a humanidade. Esse caminho não se encontra numa qualquer tendência popular à nossa volta, mas compete-nos criar uma sinfonia e um coro diversificado de novas vozes para estes novos tempos que abraçámos:

A arte da música deve ser levada aos mais altos níveis de desenvolvimento. Pois esta é uma das mais maravilhosas artes e nesta era gloriosa do Senhor da Unidade é essencial conseguir o seu domínio. No entanto, devemos esforçar-nos por conseguir um grau de perfeição artística e não ser como aqueles que deixam os assuntos por acabar. (‘Abdu’l-Bahá, de uma epístola traduzida do persa)

O grande humanista Albert Schweitzer fez um estudo sobre Bach e escreveu:

Com Bach, a música é um acto de adoração. A sua actividade artística e a sua personalidade baseiam-se ambas na sua piedade. Toda a grande arte, mesmo a secular, é em si religiosa aos seus olhos, pois para ele, os sons não morrem, mas ascendem a Deus como louvores demasiado profundos para serem proferidos.

Schweitzer prossegue citando as regras e princípios de acompanhamento que Bach prescreveu aos seus alunos:

Tal como em toda a música, o baixo figurado (que era o princípio harmónico da música) não deve ter outro fim e propósito senão a glória de Deus e a recriação da alma; se não se tem isto em mente, não há verdadeira música, mas apenas ruídos e gritos infernais.

Acho muito interessante perceber que a referência de Bach àquilo à verdadeira música, se assemelhe aos comentários de Bahá’u’lláh e ‘Abdu’l-Bahá, feitos 200 anos depois. Os ensinamentos Bahá’ís designam a música como “o alimento espiritual de corações e almas”:

Entre as nações do Oriente, a música e a harmonia não eram aprovadas, mas a Luz Manifesta, Bahá’u’lláh, neste período glorioso revelou em Epístolas Sagradas que o canto e a música são o alimento espiritual de corações e almas. Nesta dispensação, a música é uma das artes que é altamente aprovada e é considerada como sendo causa de exaltação dos corações tristes e desanimados.

A música é muito importante. A música está no coração da própria linguagem. AS suas vibrações elevam o espírito; é uma arte grande e bela. (’Abdu’l-Bahá, Star of the West, Volume 9, p. 131)

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Marvin “Doc” Holladay é saxofonista barítono que fez carreira no jazz, tendo tocado com músicos como Duke Ellington, Dizzy Gillespie, Charles Mingus e Ella Fitzgerald.

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