domingo, 25 de abril de 2004

Quddus

A propósito da destruição do Santuário de Quddus no Irão, tentei recolher alguma informação sobre Quddus. Servi-me da obra de H. Balyuzi The Báb e de alguns textos da Bahá’í Library On-line. Tentei enquadrar a sua história no contexto do movimento Bábí, e apresento alguns episódios da sua vida. Se alguém quiser acrescentar algum aspecto ou episódio relevante, basta enviar-me um email.

Tentei ainda preencher o texto com fotos ou ilustrações dos locais referidos. Uma cópia original de uma epistola escrita pelo Báb e enviada a Quddus encontra-se aqui.

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O MOVIMENTO BÁBÍ
As décadas de 30 e 40 do Século XIX assistiram ao aparecimento de movimentos messiânicos em muitos países. A Pérsia foi abalada pelo chamado "movimento Bábí". Tratava-se de uma nova religião fundada por um mercador de Shiraz, que advogava o surgimento do mensageiro prometido por todas as religiões do passado. Esse jovem mercador ficou conhecido pelo título de "Báb"(que significa “A Porta”); os ensinamentos espirituais e os princípios éticos e morais que estavam associados à Sua Mensagem despertaram paixões e ódios naquele país.

A agitação social, com a sua dose de perseguições e martírios, foram testemunhadas por vários ocidentais. A vida e o martírio do Báb, o fundador do "movimento Bábí" não passaram despercebidos no Ocidente. Sarah Bernard, Leon Tolstoi e até o nosso Eça de Queirós revelaram nas suas obras simpatia pela causa Bábí.

Na história da religião Bahá’í, o Báb é frequentemente comparado com João Baptista; tal como aquela “voz que bradava no deserto” e que baptizava nas águas do Jordão, também ele antevia o aparecimento de um novo profeta libertador da humanidade.

Os primeiros discípulos do Báb formaram uma espécie de núcleo central da comunidade Bábí; depois dos primeiros contactos com o seu Profeta espalharam-se pela Pérsia para espalhar a nova Mensagem. Nesse primeiro grupo de discípulos há nomes que de alguma forma se destacam: Mullá Hussayn, o primeiro discípulo, Tahirih, uma poetisa e Quddus, o mais jovem e o último a juntar-se ao grupo.

QUDDUS
Mullá Muhammad-Ali, que mais tarde ficaria conhecido pelo título de Quddus (significa “O Mais Santo”) nasceu numa cidade perto do Mar Cáspio. Era órfão de pai e em jovem tinha ingressado numa escola religiosa ligada às correntes messiânicas da época.

Na véspera da chegada de Quddus a Shiraz, o Báb anunciou a Mullá Husayn (o primeiro discípulo) que no dia seguinte chegaria alguém cuja aceitação da nova revelação completaria o conjunto inicial de discípulos.



No dia seguinte, o Báb e Mullá Husayn regressavam a casa, quando encontraram Quddus; o jovem tinha aspecto de quem acabava de fazer uma longa viagem. Quddus, que conhecia Mullá Husayn dos tempos de estudante nas escolas messiânicas, abordou-o e perguntou-lhe se já tinha encontrado o objecto da sua busca. Surpreendido e atrapalhado com a questão, Mullá Husayn tentou fugir à pergunta. Quddus retorquiu: "Porque tentas escondê-Lo de mim? Consigo reconhecê-Lo pela Sua postura." Mullá Husayn dirigiu-se ao Báb e contou-lhe o sucedido. O Báb respondeu: "Não vos admireis do seu estranho comportamento. No mundo do espírito comunicámos com este jovem. Já o conhecemos..."

A partir daquele momento, Quddus juntava-se ao grupo dos primeiros discípulos do Báb.

PEREGRINAÇÃO
Alguns meses depois, o Báb decidiu realizar uma peregrinação a Meca. Para o acompanhar escolheu Quddus; Mullá Husayn foi enviado para Teerão para entregar a mensagem a Bahá'u'lláh. No início de Outubro de 1844, um barco levando peregrinos saiu do porto de Bushir em direcção a Jeddah, na Arábia.

Alguns passageiros nesse barco testemunharam as actividades do Báb e Quddus; descrevem como o Báb estava sempre discursando e Quddus tentava escrever todas as Suas palavras. Mesmo num momento em que uma forte tempestade envolveu o navio e os passageiros ficaram em pânico, os dois pareciam alheados do mundo que os rodeava. Uma das principais preocupações de Quddus era o registo e preservação das palavras proferidas pelo Báb.

Chegados a Jeddah, dirigiram-se a Meca, onde cumpriram os rituais da peregrinação. Cumpridos os rituais, o Báb aproximou-se da porta da Kaaba; aí, voltou-se para o grupo de peregrinos que por ali circulavam e disse numa voz clara: "Eu sou o Qa’im, cujo advento vocês têm aguardado".

Ainda em Meca, o Báb revelou e enviou uma epístola ao Sherif da Cidade; nessa epístola anunciava a sua posição divina e proclamava a sua mensagem. Quddus foi encarregue de entregar essa mensagem; o Sherif ignorou-a.

De regresso da peregrinação, em Fevereiro/Março de 1845, na cidade portuária de Bushir, o Báb anunciou a Quddus que tinha chegado o momento de se separarem:

"Os dias na Nossa companhia estão a terminar. A hora da separação aproxima-se, uma separação que não será seguida por qualquer reencontro salvo no Reino de Deus, na presença do Rei da Glória."

Quddus dirigiu-se a Shiraz, levando uma carta para o tio do Báb. Ao ouvir os relatos feitos por Quddus sobre as actividades do Báb, os Seus ensinamentos e a Sua peregrinação, o tio aderiu à causa Bábí.

BADASHT
Em Julho de 1848, quando Báb estava encarcerado, os bábis (seguidores do Báb) reuniram-se na vila de Badasht; este encontro – que ficou conhecido como Conferência de Badasht – tinha um objectivo essencial: esclarecer entre todos os participantes se a mensagem babí era apenas uma reforma do Islão ou uma nova religião.



Quddus e Bahá'u'lláh concordavam que era chegado o momento de esclarecer todos que se tratava de uma nova revelação divina. As suas opiniões prevaleceram.

O assumir do movimento Bábí como uma nova religião num país agrilhoado às leis ortodoxas do Islão, era um risco muito grande. Se nos meses anteriores os bábís tinham enfrentado uma oposição esporádica, agora iam deparar com umas perseguições sangrentas. Logo no regresso de Badasht a maioria dos participantes foi atacada.

Na sequência desse ataque Quddus foi preso e entregue a um clérigo muçulmano. No final de 1848 seria libertado após alguns contactos efectuados por Mullá Husayn, a conselho de Bahá'u'lláh.

PERSEGUIÇÕES E MARTÍRIO
Com a posição assumida em Badasht, irrompem perseguições por toda a Pérsia. O carácter brutal destas impressiona profundamente representantes diplomáticos e correspondentes de jornais estrangeiros na Pérsia.



Alguns episódios dessas perseguições levaram mesmo os bábís a pegar em armas para se defenderem; Nayriz, Zanjan e Shaykh Tabarsi são os locais onde ocorrerem os mais significativos massacres.

Quddus estava entre os Bábís capturados no incidente de Shaykh Tabarsi. Em Maio de 1849, foi levado para a sua cidade natal, Barfurush. Aí foi entregue a um sacerdote que tinha fama de sanguinário. Depois de feitas as acusações, foi sujeito a torturas brutais; no meio da sua agonia e do divertimento dos carrascos, ouviram-lhe as seguintes palavras:

"“Perdoa, ó meu Deus, os pecados destas pessoas. Acolhe-os na Tua misericórdia pois eles ainda não conhecem o que nós descobrimos e estimamos."

No dia 16 de Maio, na praça central da cidade, foi morto a golpes de machado. Seguidamente, o seu corpo desmembrado foi alvo da ira popular e posteriormente lançado numa fogueira. À noite, o que restava do seu cadáver foi recolhido por um habitante da cidade, que o colocou num túmulo digno.

Os escritos de Quddus são muito apreciados por alguns Bahá’ís. Alguns originais dos escritos de Quddus estão hoje no Museu Britânico, em Londres. É frequentemente referido como um dos grandes heróis da Fé Bahá’í.

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