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sábado, 26 de julho de 2025

Quem gostaria de ser famoso?

Por David Langness.


Recentemente, uma menina de 12 anos surpreendeu-me quando lhe fiz aquela pergunta padrão dos adultos: "O que queres ser quando fores grande?". Entusiasmada, respondeu: "YouTuber! Influencer! Qualquer coisa que me torne famosa!".

Entre as gerações criadas nas redes sociais, este desejo de fama tem-se tornado uma tendência cada vez mais evidente.

Sondagens e inquéritos também identificaram esta tendência — um estudo recente de uma revista de psicologia descobriu que as crianças dos 9 aos 11 anos identificam agora a fama como o seu primeiro valor. Em 1997, quando as redes sociais estavam apenas a começar, a fama ocupava o 15º lugar.

Numa entrevista ao Palm Beach Post sobre o seu artigo "Poder, Fama e Recuperação", o conceituado psiquiatra norte-americano Reef Karim afirmou: "As crianças de hoje não querem ser médicas ou advogadas. Só querem ser famosas." Caramba!

Como me interesso por esta tendência de obsessão por celebridades — e também me sinto um pouco horrorizado com ela — comecei a fazer a pergunta «o que gostarias de ser?» a todas as crianças e jovens que conheço, e adivinhem? Os resultados do meu inquérito informal revelam que muitos jovens, salvo raras excepções, gostariam muito de ser famosos. Alguns não o admitem de imediato, mas, quando me aprofundo um pouco, o desejo de fama parece estar presente na maioria das crianças mais velhas e dos adolescentes que encontro.

Talvez isso não seja surpreendente. Obviamente, vivemos numa era que venera a fama. Grande parte da cultura ocidental centra-se agora nas celebridades — basta testemunhar a glorificação infinita daqueles que consideramos famosos, em todos os meios de comunicação e por qualquer motivo.

Sim, todos gostaríamos de ser vistos, valorizados, amados — mas qual a melhor forma de o fazer? Os ensinamentos Bahá’ís apresentam uma enorme sabedoria sobre o assunto, por isso vamos aprofundá-los.

‘Abdu’l-Bahá — filho e sucessor de Bahá’u’lláh, o profeta e fundador da Fé Bahá’í — proferiu um importante discurso em Paris, em 1911, sobre o tema da busca da fama mundana:

A vida de alguns homens está ocupada apenas com as coisas deste mundo; as suas mentes estão tão circunscritas pelos costumes exteriores e pelos interesses tradicionais que eles ficam cegos para qualquer outro reino da existência, para o significado espiritual de todas as coisas! Pensam e sonham com a fama mundana, com o progresso material. Prazeres sensuais e ambientes confortáveis limitam o seu horizonte; as suas maiores ambições centram-se nos sucessos em condições e circunstâncias mundanas! Não refreiam as suas propensões inferiores; comem, bebem e dormem! Tal como o animal, não pensam para além do seu próprio bem-estar físico. É certo que essas necessidades devem ser satisfeitas. A vida é um fardo que deve ser carregado enquanto estamos na Terra, mas não se deve permitir que os cuidados com as coisas inferiores da vida monopolizem todos os pensamentos e aspirações de um ser humano. As ambições do coração devem ascender a um objetivo mais glorioso, a actividade mental deve elevar-se a níveis superiores! Os homens devem manter nas suas almas a visão da perfeição celestial e aí preparar uma morada para a inesgotável dádiva do Espírito Divino.

Que a vossa ambição seja a consecução de uma civilização celestial na Terra! Peço para vós a bênção suprema, para que estejais tão plenos da vitalidade do Espírito Paradisíaco que possais ser a causa da vida para o mundo.

Por isso, em vez de procurarmos a fama — que está inevitavelmente condenada a desaparecer— os ensinamentos Bahá'ís sugerem que conservemos nas nossas almas "a visão da perfeição celestial" e estabeleçamos como nossa principal ambição "a consecução de uma civilização celestial na Terra". Estas ambições grandiosas não se centram no indivíduo, mas na massa da humanidade. De certa forma, são exactamente o oposto de querer ser famoso — em vez disso, incentivam-nos a esforçarmo-nos para sermos humildes, compassivos e centrados no bem maior.

A fama mundana, salientam os ensinamentos Bahá'ís, é efémera — nunca é duradoura. Pela sua própria natureza, e devido aos caprichos inconstantes do que é popular no momento, quase toda a fama é passageira. Por isso, em vez de empenharmos esforços procurando algo tão temporário e, por isso, sem sentido, ‘Abdu’l-Bahá recomendou que todos procurássemos uma fonte de honra mais permanente e duradoura:

Cada alma procura um objetivo e nutre um desejo, e de dia e de noite esforça-se para atingir o seu objetivo. Uma anseia por riquezas, outra tem sede de glória e ainda outra anseia por fama, arte, prosperidade e coisas do género. No entanto, no final, todos estão condenados à perda e à desilusão. Todos eles deixam para trás tudo o que lhes pertence e, de mãos vazias, correm para o reino além, e todos os seus esforços serão em vão. Todos regressarão ao pó, despidos, deprimidos, desanimados e em completo desespero.

Mas, louvado seja o Senhor, tu estás empenhado naquilo que te assegura um ganho que durará eternamente; e isto não é mais do que a tua atracção pelo Reino de Deus, a tua fé e o teu conhecimento, a iluminação do teu coração e o teu sincero esforço para promover os Ensinamentos Divinos.

Em verdade, esta dádiva é imperecível e esta riqueza é um tesouro do alto!

Esta dádiva imperecível — a iluminação do nosso próprio coração, o conhecimento interior, a fé e o amor duradouro pelos outros — durará para sempre. Bahá’u’lláh prometeu:

Assim como a conceção da fé existe desde o princípio, que não tem princípio, e perdurará até ao fim, que não tem fim, da mesma forma o verdadeiro crente viverá e perdurará eternamente. O seu espírito circulará eternamente em torno da Vontade de Deus. Ele perdurará enquanto o próprio Deus perdurar.

Quem trocaria uma fama temporária e fugaz por uma eterna?

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Texto original: How Would You Like To Be Famous? (www.bahaiteachings.org)


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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site BahaiTeachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

sábado, 8 de outubro de 2022

As Soluções Científicas e Religiosas para o Crescimento Populacional

Por David Langness.


As Nações Unidas estimam que o nosso pequeno planeta, neste século, terá mais três mil milhões de pessoas do que hoje, projectando que chegaremos a 8 mil milhões em 2022 e 11 mil milhões em 2100.

Alimentar, alojar e gerir a utilização de recursos para todas essas pessoas pode exceder a capacidade da Terra. Infelizmente, ninguém conhece os limites externos dessa bio-capacidade, porque nunca os sobrecarregámos tão severamente antes.

Hoje produzimos comida suficiente para alimentar todas as pessoas no planeta – mas poderemos aumentar a produtividade das colheitas em mais de 30% durante este século, com o planeta a ficar mais quente todos os anos? Ainda podemos respirar o ar, beber a água e viver na maioria dos lugares da Terra; mas isso será verdade em 2100? Hoje geramos energia suficiente (na maioria das vezes) para alimentar o planeta, mas com as crescentes necessidades das nações em desenvolvimento e o previsível enorme aumento da população, teremos o suficiente para amanhã?

Nas últimas décadas, a maioria dos especialistas que estudou estes assuntos graves respondeu a estas três perguntas cruciais com um assertivo “Não!”

Esses difíceis desafios continuam a atormentar cientistas, urbanistas e líderes mundiais. Então, sem qualquer manual do utilizador, instruções ou experiência anterior, como pode a humanidade lidar com esta questão de superpopulação? Deveriam todos os países do, como a China, limitar o número de filhos que as famílias podem ter? Devemos fazer esforços gigantescos para aumentar o rendimento das colheitas dos agricultores em todo o mundo para que possamos alimentar esses novos milhares de milhões? Ou não devemos fazer nada, e simplesmente aceitar o crescimento exponencial da espécie humana, acreditando que o nosso planeta e nossa engenhosidade humana podem de alguma forma apoiar todas essas pessoas – e enfrentar o desastre humanitário global que pode ocorrer se estivermos errados?

Religião e Ciência a trabalhar juntas


Na perspectiva Bahá'í, estas questões sobre o aumento de população da Terra envolvem a religião e a ciência - e, na verdade, exigem que as duas trabalhem juntas.

Os ensinamentos Bahá'ís sustentam que temos um manual do utilizador para o nosso planeta e para as pessoas aqui vivem - a revelação contínua e progressiva do Criador para a humanidade através do sistema religião único e em evolução.

Os Bahá'ís acreditam que a humanidade tem apenas uma religião, que nos tem sido dada ao longo do tempo por vários mensageiros e profetas. Essas religiões são designadas com nomes diferentes, embora partilhem princípios espirituais comuns. Todas essas religiões ensinam a Regra de Ouro. Essas religiões aconselham a compaixão, a bondade e o amor. Essas religiões pedem que nos tratemos uns aos outros com respeito. Essas religiões dão-nos a orientação espiritual destinada a fazer evoluir as nossas vidas pessoais e as nossas civilizações. Essas religiões pedem-nos para fazer as pazes uns com os outros e amar uns aos outros.

A nossa Fé única universal, afirmam as Escrituras Bahá'ís, tem tentado transmitir-nos gentil e amorosamente, ao longo da história humana, as melhores e mais espirituais formas de lidarmos uns com os outros. Os ensinamentos Bahá'ís mantêm essa orientação. No livro de 'Abdu'l-Bahá, O Segredo da Civilização Divina, encontramos um apelo à humanidade para que aja de forma a promover a "glória e grandeza do homem", que:

... não consiste em ser ávido de sangue e de garras afiadas, em destruir cidades e espalhar o caos, em massacrar militares armados e civis. O que se entende por um futuro brilhante para ele seria a sua reputação pela justiça, pela sua bondade para com toda a população, seja nobre ou humilde, pela sua construção de países e cidades, vilas e regiões, por tornar fácil, pacífica e feliz a vida dos seus semelhantes, por estabelecer os princípios fundamentais para o progresso, por elevar os padrões e aumentar a riqueza de toda a população.

A sobrevivência, prosperidade e felicidade derradeiras do nosso mundo dependem de uma coisa, dizem os ensinamentos Bahá'ís - da nossa capacidade de nos unirmos. Quando as nações, as raças, os géneros, as classes e as perspectivas políticas encontrarem formas de construir um futuro juntas, teremos a capacidade de construir um mundo onde reinem a paz, a justiça e a equidade. Bahá'u'lláh escreveu:

O bem-estar da humanidade, a sua paz e segurança são inatingíveis a menos que, e até que, a sua unidade seja firmemente estabelecida. A unidade nunca poderá ser alcançada a menos que os conselhos que a Pena do Altíssimo revelou deixem de passar despercebidos.

Através do poder das palavras que Ele proferiu, toda a raça humana pode ser iluminada com a luz da humanidade… (Gleanings from the Writings of Baha’u’llah, CXXXI).

Neste contexto, a frase de Bahá'u'lláh "a Pena do Altíssimo" refere-se aos profetas e mensageiros divinos que fundaram as religiões do mundo. Enquanto rejeitarmos os seus conselhos espirituais, continuando a fazer guerra violenta uns contra os outros, separando-nos segundo a raça, a classe e a nacionalidade, privilegiando os ricos acima dos pobres, oprimindo as mulheres e diminuindo a sua participação plena na sociedade, permitindo que ocorram tremendas injustiças e destruindo o ecossistema do mundo, então ameaçamos e, em última análise, corremos o risco de destruir o futuro colectivo da humanidade.

Se, por outro lado, aceitarmos os conselhos de Bahá'u'lláh aprendendo a amar-nos uns aos outros, renunciando às nossas diferenças, transcendendo as nossas fronteiras e reunindo-nos em unidade, todos nós poderemos antecipar com expectativa um futuro brilhante para a raça humana.

Esta parte da equação ciência-religião não pode ser resolvida por tecnologia, ou novas leis, ou formas mais produtivas de produzir alimentos. Só pode ser resolvida no coração humano, que sabemos ter uma profunda necessidade de espiritualidade, de amor, de ligação com os outros.

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Texto original: The Scientific – and Religious – Solutions to Overpopulation (www.bahaiteachings.org)


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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site BahaiTeachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

sábado, 20 de agosto de 2022

Os efeitos da violência em jogos de vídeos, filmes e programas de TV

Por Radiance Talley.


Um relatório de 2002 do Departamento de Educação dos Estados Unidos e dos Serviços Secretos examinou 37 incidentes de tiroteios e ataques em escolas ocorridos entre 1974 e 2000 nos EUA e descobriu que “mais da metade dos agressores demonstraram algum interesse pela violência através de filmes, jogos de vídeo, livros e outros meios.”

Será isto uma coincidência? Ou poderá a exposição a conteúdos violentos durante a infância provocar comportamento violento mais tarde na vida? Quais serão os efeitos negativos de jogos de vídeo violentos, programas de televisão e filmes no cérebro e no comportamento?

A Prevalência da Violência em Jogos de Vídeo, Filmes e Programas de TV


Uma “vida santa, com as suas implicações de modéstia, pureza, comedimento, decência e mente limpa, envolve nada menos do que o exercício da moderação em tudo o que diz respeito ao vestuário, à linguagem, às diversões e todas as vocações artísticas e literárias”, escreveu Shoghi Effendi, o Guardião da Fé Bahá'í.

Infelizmente, o consumo de jogos de vídeo, filmes e programas de TV ultrapassou os limites da moderação para a maioria das pessoas e tornaram-se partes significativas da vida das crianças.

De acordo com um artigo publicado em 2007 no “Journal of Adolescent Health”, “as crianças nos Estados Unidos passam uma média de 3 a 4 horas por dia a ver televisão” e “mais de 60% dos programas contêm alguma violência, e cerca de 40% deles contêm violência elevada.”

Os jogos de vídeo também estão presentes em 83% dos lares com crianças, e “94% dos jogos classificados (pela indústria de jogos) como apropriados para adolescentes são descritos como contendo violência”. Crianças entre 8 e 10 anos gastam em média 65 minutos por dia com jogos de vídeo, e 8,5% das crianças de 8 a 18 anos sofrem de “distúrbio de jogo” – o vício em jogos de vídeo que agora está incluído na Classificação Internacional de Doenças.

'Abdu’l-Bahá, uma das figuras centrais da Fé Bahá'í, disse que “há perigo de que o passatempo degenere em perda de tempo. A perda de tempo não é aceitável na Causa de Deus.” Esse consumo excessivo de entretenimento não apenas tira o tempo de servir a humanidade e progredir espiritualmente, mas também pode perverter o carácter e o comportamento de uma pessoa.

Os Efeitos a Curto Prazo da Violência em Jogos, Filmes e Programas de TV


As experiências provaram que “a exposição à violência mediática aumenta imediatamente a probabilidade de comportamento agressivo em crianças e adultos no curto prazo”.

Quer fossem crianças do ensino pré-escolar ou do ensino fundamental, adolescentes ou adultos que estavam a ser testados, aqueles que assistiram a imagens violentas comportaram-se de forma mais agressiva e adoptaram crenças mais tolerantes à violência. Isso acontece devido ao estímulo, aumento da excitação emocional e mimetismo que ocorrem ao nível neurológico.

Os psicólogos Brad Bushman e Craig Anderson descobriram que os jogos de vídeo violentos estavam relacionados ao aumento de pensamentos agressivos, crenças, atitudes, comportamentos e excitação fisiológica e diminuição do “comportamento pró-social (de ajuda)”.

Os Efeitos a Longo Prazo da Violência em Jogos, Filmes e Programas de TV


Os estudos também mostraram que “a exposição habitual precoce à violência mediática na meia-infância proporciona um aumento da agressividade 1 ano, 3 anos, 10 anos, 15 anos e 22 anos depois na idade adulta, mesmo controlando a agressividade precoce”.

E as crianças que achavam a violência que assistiam era realista e se identificavam com o agressor que a infligia eram especialmente propensas a adoptar crenças e comportamentos mais agressivos devido à aprendizagem observacional que ocorria. Por exemplo, um acompanhamento de 15 anos com essas crianças, que estavam “no quartil superior em relação à violência no meio da infância”, descobriu que “11% dos homens haviam sido condenados por um crime (em comparação com 3% para outros homens), 42% “empurrou ou agarrou o seu cônjuge” no ano anterior (em comparação com 22% dos outros homens) e 69% “empurrou uma pessoa” quando ficou com raiva no ano anterior (em comparação com 50% de outros homens). Para as mulheres, 39% das espectadoras de elevada violência “atiraram algum objecto contra o seu cônjuge” no ano passado (em comparação com 17% das outras mulheres) e 17% “esmurraram, espancaram ou estrangularam” outro adulto quando estavam com raiva no ano passado (em comparação com 4% das outras mulheres).”

“Ó amantes de Deus!”, escreveu ‘Abdu’l-Bahá, “Neste ciclo do Deus Omnipotente, a violência e a força, a coacção e a opressão, são todas condenadas.”

Se condenamos a violência, não deveríamos condenar também os jogos e os espectáculos que a promovem? A exposição à violência de jogos de vídeo, filmes e programas de TV aumenta o risco de comportamento violento, tal como crescer um ambiente cheio de violência real. Neurocientistas e psicólogos entendem hoje que esses efeitos a longo prazo são resultado da aprendizagem observacional e da dessensibilização que ocorre automaticamente em crianças que testemunham essa violência.

De acordo com o Dr. L. Rowell Huesmann, “as crianças adquirem automaticamente modelos para os comportamentos que observam ao seu redor na vida real ou nos meios de comunicação, juntamente com reacções emocionais e cognições sociais que apoiam esses comportamentos. Os processos de comparação social também levam as crianças a procurar outras pessoas que se comportam de maneira agressiva semelhante nos meios de comunicação ou na vida real, levando a um processo de espiral descendente que aumenta o risco de comportamento violento”.

Permitir que crianças assistam a espectáculos violentos é um sério risco para a saúde pública. Conforme declarado no “Journal of Adolescent Health”, a correlação entre violência nos meios de comunicação e agressão é maior do que a correlação entre tabagismo passivo no trabalho e cancro de pulmão, exposição ao chumbo e níveis de QI em crianças, adesivos de nicotina e cessação do tabagismo, ingestão de cálcio e massa óssea, trabalhos de casa e desempenho académico, exposição ao amianto e cancro de laringe e auto-exames e extensão do cancro da mama.

O Dr. Rowell Huesmann afirmou: “Embora a criança já agressiva que assiste ou joga muitos jogos violentos possa tornar-se o jovem adulto mais agressivo, a investiçaão mostra que mesmo as crianças inicialmente não agressivas se tornam mais agressivas ao ver a violência nos meios de comunicação”.

E acrescentou: “Em resumo, a exposição à violência nos meios de comunicação eletrónicos aumenta o risco de crianças e adultos se comportarem de forma agressiva a curto prazo, e das crianças se comportarem agressivamente a longo prazo”.

É claro que, como qualquer ameaça à saúde pública, nem toda criança exposta à ameaça assimilará a doença. No entanto, isso não diminui a necessidade de abordar o risco. Se queremos que a próxima geração seja bondosa, generosa e inocente, não podemos continuar a bombardeá-la com conteúdos agressivos e perversos. 'Abdu'l-Bahá escreveu:

Toda criança é potencialmente a luz do mundo — e simultaneamente a sua escuridão; portanto, a questão da educação deve ser considerada como de importância primordial.

Desde a sua infância, a criança deve ser cuidada no seio do amor de Deus e nutrida no abraço do Seu conhecimento, para que possa irradiar luz, crescer em espiritualidade, encher-se de sabedoria e aprendizagem e assumir as características do anjo hospedeiro.

As crianças nascem puras – e indefesas. Eles precisam da orientação e protecção da sua família e comunidade. Vamos fazer um esforço para evitar que essas luzes puras entre nós sejam extintas pelas trevas ao seu redor.

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Texto original: The Effects of Violence in Video Games, Movies, and TV Shows (www.bahaiteachings.org)


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Radiance Talley é licenciada em comunicação pela Universidade de Maryland. Além da escrita, do desenho, e da comunicação em público, Radiance tem um profundo conhecimento da teoria da construção, técnicas de negociação, gestão de conflitos, comunicação organizacional e intercultural, antropologia e sociologia.

sábado, 27 de abril de 2019

Proteger Mulheres e Meninas contra Abusos e Violência

Por Layli Miller-Muro.


A caridade é agradável e louvável aos olhos de Deus e é considerada principesca entre as boas acções. (Baha'u'llah, Tablets of Baha'u'llah, p. 71)
No Tahirih Justice Center, a nossa missão de beneficência inclui a protecção de corajosas mulheres e meninas imigrantes que não aceitam ser vítimas de violência.

Utilizando o sistema legal dos EUA, o Tahirih funciona como uma organização nacional sem fins lucrativos que apoia mulheres e meninas de todo o mundo que decidiram enfrentar a sua opressão. Oferecemos-lhes serviços jurídicos e advocacia totalmente gratuitos nos tribunais, nas comunidades e no Congresso. O Tahirih protege mulheres e meninas que procuram protecção contra abusos dos direitos humanos, incluindo violência doméstica, agressão sexual, tráfico de seres humanos, mutilação genital feminina, crimes de honra e casamento forçado.

O Tahirih - uma organização de inspiração Bahá’í - foi fundada na convicção de que atingir a igualdade total entre mulheres e homens é necessária para o progresso da sociedade.

Desde a sua fundação, em 1997, Tahirih ajudou mais de 15.000 mulheres e meninas a conseguir justiça. Actualmente, a organização tem aproximadamente cinquenta funcionários a tempo inteiro, incluindo advogados, assistentes sociais, procuradores e outros funcionários de apoio, que trabalham em Washington (DC), Houston (Texas) e Baltimore (Maryland). Uma rede de mais de mil e duzentos advogados em mais de duzentos grandes escritórios de advocacia que oferecem o seu tempo e competências legais para ajudar os clientes do Tahirih - todos eles multiplicam o impacto dos esforços do Tahirih. O Tahirih Justice Center também tem parceria com médicos, psicólogos, tradutores e outros profissionais para servir os seus clientes. Aproveitando estes serviços profissionais voluntários - avaliados em 13 milhões de dólares americanos em 2013 - o Tahirih transforma cada dólar que lhe é doado num impacto de 4,50 dólares. O Tahirih tem uma taxa de sucesso de 99% nos casos de litígio, mesmo quando se trata de casos extremos, legalmente complexos, considerados como “perdidos” por outros advogados.


A sustentabilidade institucional do Tahirih é assegurada por um corpo de Direcção Administrativa, uma estratégia alargada de captação de recursos financeiros e uma ampla rede de doadores generosos, incluindo indivíduos, empresas, fundações e o próprio governo dos Estados Unidos. Embora o Tahirih receba apoio de Bahá’ís individuais, não é financiado pelas instituições Bahá’ís.

Estrategicamente comprometido com a protecção de curto e longo prazo de mulheres e meninas contra a violência, o Tahirih utiliza uma abordagem em três frentes para capacitar as pessoas a transformar as suas vidas, ajudar as comunidades a reestruturar a questão da violência contra as mulheres no seu contexto cultural e a facilitar mudança nas políticas públicas e na lei. Concretamente, o Tahirih fornece:
  • Serviços legais e sociais gratuitos, que permitem que mulheres e crianças imigrantes de baixos rendimentos consigam os direitos que lhes são garantidos pela lei dos EUA, assegurando protecção legal para si e para as suas famílias, e proporcionando-lhes os recursos necessários para recuperar e reconstruir as suas vidas;
  • Educação pública, divulgação, formação e assistência técnica individualizada, que proporcionam a profissionais (incluindo agentes da lei, prestadores de serviços sociais, advogados, clérigos, profissionais de saúde, etc.) e comunidades maior capacidade para responder às necessidades específicas de imigrantes vítimas de violência de género; e
  • Defesa de políticas públicas, que dão voz aos seus clientes para estimular o diálogo não partidário e as leis que promovam protecção sistémicas da segurança, do bem-estar e dos direitos humanos de mulheres e crianças vulneráveis.
Líder nacional no discurso público e na defesa de mulheres imigrantes contra a violência, o Tahirih foi autor de uma legislação inovadora para proteger as chamadas noivas por correspondência da indústria internacional de casamentos e outras leis para proteger os que fogem da perseguição de género. Além disso, Tahirih é líder de pensamento nos Estados Unidos no tema da violência contra mulheres imigrantes, liderando várias associações nacionais e colaborando com mais de setecentas organizações com ideais semelhantes em questões como casamento forçado e infantil, mutilação genital feminina e tráfico de seres humanos.

Fazemos tudo isto com alegria e satisfação, porque acreditamos na igualdade dos sexos, na unidade da humanidade e nas exortações dos ensinamentos Bahá’ís para ajudar todas as vítimas de opressão:
Sede pais amorosos para o órfão, e um refúgio para os indefesos, e um tesouro para os pobres e uma cura para os enfermos. Sede o auxílio de toda a vítima de opressão, os patronos dos desfavorecidos. Pensai em todos os momentos em prestar algum serviço a todos os membros da raça humana. Não deis ouvidos à aversão e rejeição, ao desprezo, à hostilidade, à injustiça: agi de maneira oposta. Sede sinceramente bondosos, e não apenas na aparência. Que cada um dos amados de Deus centre a sua atenção nisto: ser a misericórdia do Senhor para com o homem; ser a graça do Senhor. Que ele faça algo de bom a cada pessoa cujo caminho ele cruza, e lhe leve algum benefício. Permiti-lhe melhorar o carácter de cada um e de todos, e reorientar as mentes dos homens. Deste modo, a luz da orientação divina resplandecerá, e as bênçãos de Deus embalarão toda a humanidade: pois o amor é luz, em qualquer morada que habite; e o ódio é escuridão, não importa onde possa fazer o seu ninho. (‘Abdu'l-Bahá, Selections from the Writings of Abdu'l-Bahá, pag. 3)
E a honra e distinção do indivíduo consistem nisto: que ele entre todas as multidões do mundo se torne uma fonte de bem social. Será concebível alguma bênção maior do que esta, que um indivíduo, olhando para si próprio, descubra que, com a graça confirmadora de Deus, ele se tornou a causa da paz e do bem-estar, da felicidade e do proveito dos seus semelhantes? Não, pelo Deus único e verdadeiro, não há felicidade maior, nem prazer mais completo. ('Abdu'l-Bahá, The Secret of Divine Civilization, pags. 2–3)

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Texto original: Protecting Women and Girls from Abuse and Pain (www.bahaiteachings.org)

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Layli Miller-Muro é fundadora e directora do Tahirih Justice Center (www.tahirih.org), uma organização sem fins lucrativos de inspiração Bahá’í dedicada à protecção de mulheres e meninas contra abusos de direitos humanos. O seu envolvimento nesta organização valeu-lhe vários prémios e distinções, tendo sido mencionada no “150 Fearless Women in the World” (150 Mulheres Destemidas no Mundo) da Newsweek Magazine/Daily Beast. Vive com o marido e três filhos em Washington, DC (EUA).

sábado, 20 de outubro de 2018

O que Podemos Fazer pelos Refugiados no Mundo?




Cuidar dos refugiados do mundo e dos sem-abrigo é uma tarefa difícil, porque as necessidades normalmente superam largamente os meios disponíveis.

Numerosas organizações governamentais e humanitárias fazem o possível para ajudar esses refugiados, fornecendo terrenos, abrigos temporários, comida, bebida, roupas, escolas e muito mais; com isso, os cada vez maiores campos de refugiados no mundo podem responder temporariamente às necessidades de milhões de pessoas deslocadas.

Recentemente, o ACNUR - a Agência das Nações Unidas para os Refugiados - informou que o número de pessoas deslocadas no mundo aumentou para 65,6 milhões - mais do que toda a população do Reino Unido. Esse número surpreendente (inclui um aumento de 300.000 em relação ao ano anterior) é o maior número de refugiados alguma vez registado.

O que pode uma pessoa fazer em relação a esta crise global? Temos a responsabilidade de agir ou devemos deixar essa tarefa para organizações e governos?

Do ponto de vista de Bahá’í, ajudar os refugiados sem lar é um assunto para todos. Bahá’u’lláh - Ele próprio um refugiado e exilado - escreveu:

Ó ricos da terra! Não fujais da face do pobre que jaz no pó; pelo contrário, sede amigos dele e permiti-lhe que conte a história dos males com que o inescrutável decreto de Deus o afligiu. Pela rectidão de Deus! Enquanto estiveres com ele, a Assembleia no alto estará a olhar por vós, a interceder por vós, a louvar os vossos nomes e a glorificar a vossa acção. (Gleanings fromthe Writings of Baha’u’llah, sec. CXLV)

‘Abdu’l-Bahá, que também foi refugiado e prisioneiro juntamente com o Seu Pai, afirmou:

Que todos vós possais estar unidos, que possais concordar, que possais servir a solidariedade da espécie humana.  Que possais ser os bem-intencionados para toda a humanidade. Que possais ser os auxiliadores de todo o pobre, que possais ser os enfermeiros do doente. Que possais ser fontes de conforto dos que têm o coração despedaçado. Que possais ser um refúgio para o vagabundo. Que possais ser uma fonte de coragem para o assustado. Assim, com o favor e assistência de Deus poderá erguer-se o estandarte da felicidade humana no centro do mundo e a insígnia da concórdia universal será desfraldada. (The Promulgation of Universal Peace, p. 425)

Como exemplo do quão terrível se tornou a actual crise de refugiados no mundo, vejamos o pequeno Líbano. Com 10.000 km2, é um dos países mais pequenos do mundo em termos de superfície terrestre. Durante a década de 1960, o Líbano era conhecido como "a Suíça do Oriente" e Beirute, a sua capital, "a Paris do Médio-Oriente ".

Como sabemos, o Líbano tem como vizinhos a Síria (a norte e a leste) e Israel (a sul). O Líbano tem sido atormentado por violência sectária e guerra civil; em 1990, a guerra civil terminou e havia quase um milhão de libaneses deslocados. Algumas partes do Líbano ficaram em ruínas, e a Síria foi uma potência ocupante até 2005. Seguiram-se uma série de assassinatos de líderes libaneses, facto que dificultou a formação de um governo estável. Depois, em 2012, a guerra civil na Síria ameaçou transbordar para o Líbano e, em 2013, mais de 677.000 refugiados sírios atravessaram a fronteira libanesa, procurando a segurança relativa do país. Hoje o Líbano tem mais de 1 milhão de refugiados sírios, aproximadamente um sétimo da população do país.

Mas o Líbano não é o único país com pessoas deslocadas e sem-abrigo. Como podemos nós, indivíduos, lidar com essas questões urgentes e prestar ajuda aos deslocados, aos sem-abrigo e aos refugiados? Quem pode servir como exemplo na ajuda a essas multidões indefesas?

Em 1932, Shoghi Effendi escreveu sobre uma Bahá’í que fez exatamente isso:

O rebentar da Grande Guerra deu-lhe mais uma oportunidade para revelar o verdadeiro valor do seu caráter e libertar as energias latentes no seu coração. A residência de 'Abdu'l-Bahá em Haifa estava rodeada, durante todo aquele conflito sombrio, por um grupo de homens, mulheres e crianças famintas, que a má administração, a crueldade e a negligência dos funcionários do governo otomano tinham levado a procurar ajuda para as suas aflições. Das suas mãos [de Bahiyyih Khanum, irmã de Abdu'l-Bahá], e da abundância do seu coração, essas vítimas infelizes de uma tirania abjecta recebiam, dia após dia, provas inesquecíveis de um amor que aprenderam a invejar e a admirar. As suas palavras de alegria e conforto, a comida, o dinheiro, as roupas que ela distribuía livremente, os medicamentos que, por um processo próprio, ela mesma preparava e ministrava diligentemente - tudo isso teve a sua parte no confortar do inconsolável, no recuperar da visão do cego, no abrigar do órfão, no curar do doente e auxiliar o desalojado e o vagabundo. (Baha’i Administration,, p. 193)

A Grande Guerra foi a Primeira Guerra Mundial; o cenário era a Palestina; a Folha Mais Sagrada era o título da Bahiyyih Khanum, a irmã mais velha de Abdu'l-Bahá.

Durante a Primeira Guerra Mundial, quando a Palestina esteve isolada do mundo e ameaçada pela fome, Bahiyyih Khanum e ‘Abdu’l-Bahá tornaram-se exemplos brilhantes de cuidado pelos pobres e necessitados, pelos destituídos, pelos desafortunados e pelos refugiados – o tipo de exemplo que começa no coração dos indivíduos, e inspira grupos e nações que hoje fornecem ajuda:

Nem as autoridades britânicas foram lentas em expressar a sua gratidão sobre o papel que ‘Abdu’l-Bahá desempenhou no aliviar do fardo dos sofrimentos que oprimiam os habitantes da Terra Santa durante os dias tenebrosos daquele conflito angustiante. (Shoghi Effendi, God Passes By, p. 306)

O governo britânico atribuiu o título de Cavaleiro a ‘Abdu’l-Bahá devido ao seu trabalho que evitou a fome entre o povo da Palestina durante a guerra.

Apenas o envolvimento pessoal, o amor e a unidade – unidade de pensamento, de vontade e de acção – pode dar início a soluções permanentes. Essa unidade, essa fraternidade global, esse amor, podem nascer das soluções espirituais e práticas proclamadas por Bahá’u’lláh.

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Texto original: What Can One Person Do about the World’s Refugees? (bahaiteachings.org)


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Rodney Richards é escritor técnico de profissão e trabalhou durante 39 anos para o Governo Estadual de New Jersey. Reformou-se em 2009 e dedicou-se à escrita (prosa e poesia),tendo publicado o seu primeiro livro de memórias Episodes: A poetic memoir. É casado, orgulha-se dos seus filhos adultos, e permanece um elemento activo na sua comunidade.

sábado, 13 de outubro de 2018

Como seria um Mundo Pacífico?

Por David Langness.


Mais do que qualquer outra coisa, os ensinamentos Bahá’ís focam-se no alcançar a paz universal através da unidade global – a unidade das raças, religiões e nações.

A visão de Bahá’u’lláh para o futuro da humanidade centra-se em torno da construção da unidade do planeta, estabelecendo laços de fraternidade entre todos os povos e nações, e descobrindo o nosso rumo, enquanto espécie, para uma paz global duradoura, justa e unificadora:
Tão poderosa é a luz da unidade que pode iluminar toda a terra. Esforçai-vos para que consigais alcançar esta condição transcendente e mui sublime, uma condição que pode assegurar a protecção e segurança de toda a humanidade. (Gleanings from the Writings of Baha’u’llah, CXXXII)
Todos os dias milhões de Bahá’ís celebram, honram e trabalham diligentemente para este ideal irresistível. Shoghi Effendi - o Guardião da Fé Bahá’í e historiador e intelectual educado em Oxford - resumiu esse ideal quando, em 1936, delineou brevemente a visão Bahá’í da unificação da humanidade:
A unidade da raça humana, tal como antecipada por Bahá'u'lláh, implica o estabelecimento de uma comunidade mundial em que todas as nações, raças, credos e classes estão íntima e permanentemente unidas, e em que a autonomia dos seus Estados membros, e a liberdade e iniciativa pessoais dos indivíduos que as compõem, estão definitiva e completamente salvaguardadas.

Esta comunidade deve, tanto quanto a podemos visualizar, incluir um parlamento mundial, cujos membros, enquanto fideicomissários de toda a humanidade, irão, em última análise, controlar todos os recursos de todas as nações que a integram, e promulgar leis que sejam necessárias para regular a vida, satisfazer as necessidades e organizar as relações entre todas as raças e povos.

Um executivo mundial, apoiado por uma força internacional, executará as decisões e aplicará as leis promulgadas por este parlamento mundial, e protegerá a unidade orgânica de toda a comunidade mundial.

Um tribunal mundial julgará e emitirá o seu veredicto vinculativo e final em todas e quaisquer disputas que possam surgir entre os vários elementos que constituam este sistema universal.

Um mecanismo de intercomunicação mundial será concebido, envolvendo todo o planeta, livre de entraves ou restrições nacionais, e funcionando com maravilhosa rapidez e perfeita regularidade.

Uma metrópole mundial actuará como centro nervoso de uma civilização mundial, foco para onde convergirão as forças unificadoras da vida e da qual emanarão as suas influências estimulantes.

Uma língua mundial será inventada ou escolhida entre as línguas existentes e será ensinada nas escolas de todas as nações federadas como auxiliar à sua língua materna.

Uma escrita mundial, uma literatura mundial, um sistema universal e padrão de moeda, pesos e medidas simplificará e facilitará o relacionamento e a compreensão entre nações e raças da humanidade.

Nessa sociedade mundial, ciência e religião, as duas mais poderosas forças da vida humana, reconciliar-se-ão, cooperarão e desenvolver-se-ão harmoniosamente.

A imprensa, num tal sistema, dará um espaço pleno à expressão das diversificadas opiniões e convicções da humanidade e deixará de ser manipulada de forma maliciosa por interesses poderosos, sejam privados ou públicos, e libertar-se-á da influência de governos e povos rivais.

Os recursos económicos do mundo serão organizados, as suas fontes de matérias primas serão aproveitadas e totalmente utilizadas, os seus mercados serão coordenados e desenvolvidos, e a distribuição dos seus produtos será regulada equitativamente.

Rivalidades, ódios e intrigas entre nações cessarão e a animosidade e o preconceito racial serão substituídos pela amizade, compreensão e cooperação raciais.

As causas de luta religiosa serão permanentemente removidas, as barreiras e as restrições económicas serão completamente abolidas, e a desmesurada distinção entre classes será suprimida.

A indigência, por um lado, e a acumulação grosseira de bens, por outro, desaparecerão.

A enorme energia que se gasta e desperdiça na guerra, seja económica ou política, será consagrada a objectivos, como o alargamento do alcance das invenções humanas e o desenvolvimento técnico, o aumento da produtividade da humanidade, o extermínio da doença, o alargamento da investigação científica, a melhoria do nível de saúde física, o aperfeiçoamento e refinamento do cérebro humano, a exploração dos recursos insuspeitos e não utilizados do planeta, o prolongamento da vida humana e a promoção de qualquer outro meio que estimule a vida intelectual, moral e espiritual de toda a raça humana. (The World Order of Bahá’u’lláh, p. 203.)
Esta poderosa e emocionante visão Bahá’í sobre uma nova ordem mundial - caracterizada pela justiça, paz e unidade - inspira Bahá’ís e os seus apoiantes em todo o mundo a trabalhar para o dia em que as forças unificadoras da vida culminem num mundo pleno de esperança, alegria e harmonia.

Se essa visão agita a sua alma e intriga a sua mente, talvez lhe interesse saber mais sobre como o plano de paz Bahá’í pretende trazer esse mundo justo e pacífico à existência. Vamos analisar, no próximo texto desta série, como os ensinamentos Bahá’ís recomendam que façamos o desarmamento do nosso planeta.

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Texto original: What Would a Peaceful World Look Like? (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

sábado, 29 de setembro de 2018

Abandonar o Consumismo

Por Christine Muller.


Vivemos num mundo onde um número crescente de pessoas consome cada vez mais coisas – e este consumo excessivo prejudica a humanidade.

Este consumismo esgota os recursos da Terra; polui perigosamente o nosso ar, águas e solos; e é a principal causa do aquecimento global. Já não há dúvidas: o crescimento económico contínuo é irrealista num planeta finito.

As Nações Unidas abordaram este tremendo problema no documento Desenvolvimento Sustentável Objectivo 12: Consumo e Produção Responsáveis, em que afirma que devemos “reduzir urgentemente a nossa pegada ecológica, mudando a forma como produzimos e consumimos bens e recursos”.

Simultaneamente, há demasiadas pessoas que não conseguem satisfazer as suas necessidades básicas. Necessitam de ser apoiadas no desenvolvimento sustentável e devem ter direito à sua parte de recursos da Terra. Isto torna ainda mais importante a redução do consumo das pessoas mais ricas do mundo – o que inclui a maioria das pessoas que vivem em países desenvolvidos, assim como pessoas abastadas e da classe média no mundo desenvolvido.

O desafio que enfrentamos é enorme porque as actuais gerações cresceram numa cultura de consumismo. Nunca experimentaram outro modo de vida. As pessoas consideram os bens de consumo como garantidos e sentem que têm direito a possuí-los.

Apesar da possibilidade para usufruir de bens materiais numa escala e qualidade sem precedentes na história humana, muitas pessoas não são felizes; uma crise de saúde mental está a espalhar-se atingindo números cada vez maiores de pessoas atormentadas com depressões e vícios - com algumas propensas ao suicídio e a actos violentos. Os estudos mostram que quando se satisfazem as necessidades básicas, uma maior quantidade de bens materiais não aumentam a felicidade.

Assim, materialismo e consumismo não respondem às verdadeiras necessidades das pessoas, e na verdade, acabam por destruir os sistemas vitais da Terra, colocando em perigo a sobrevivência da civilização humana.

Todas as grandes religiões advertem contra a ganância. Por exemplo, o Tao Te Ching afirma “Não há calamidade maior do que satisfazer a ganância”. A Bíblia declara “Olhai, guardai-vos de toda a ganância, porque, mesmo que um homem viva na abundância, a sua vida não depende dos seus bens.” (Lc 12:15). O Islão adverte: “Ó filhos de Adão,… comei e bebei, mas não sejais extravagantes. Na verdade, Ele não gosta dos que cometem extravagâncias”. (Alcorão 7:31)

Isto não significa que devamos ir para o outro extremo, o ascetismo. Podemos usufruir das coisas boas que o mundo nos oferece, e simultaneamente reduzir o nosso consumo de forma significativa.

Tudo isto significa que precisamos de repensar o propósito das nossas vidas, considerando que os seres humanos são seres espirituais. Se não alimentarmos as nossas almas, ficaremos famintos, mesmo que usufruamos de uma enorme quantidade de coisas materiais. Os ensinamentos Bahá’ís dizem que:
… o mundo é apenas um espectáculo, com aspecto de realidade. Não ponham os vossos afectos nele… o mundo é como o vapor no deserto, que o sedento sonha ser água e se esforça com todo o seu poder por atingi-lo, até que a alcança e descobre que é mera ilusão. (Selecção das Escrituras de Bahá'u'lláh, CLIII)
Mas pedir apenas às pessoas que reduzam os seus consumos será provavelmente inútil. O seu vazio deve ser preenchido com uma ligação espiritual, com um sentido e sensação de pertença. Uma compreensão mais profunda sobre o propósito da vida será uma base para uma redução substancial do consumo. Seguidamente, as promessas vazias do materialismo já não serão necessárias. As pessoas estarão mais abertas para enfrentar a realidade da crise ambiental do nosso planeta – e viver uma vida mais simples e ambientalmente sustentável.

A adoração do bezerro de ouro do materialismo e o mito do crescimento económico ilimitado poderão, então, ser substituídos pela ligação entre a nossa essência espiritual e o Criador.

A Torá afirma: “Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração e com toda a tua alma e com toda a tua força.” (Deuteronómio 6:5). E Jesus disse: “Amarás o teu próximo como a ti próprio.” (Mc 12:31). O amor a Deus e à Sua criação leva-nos a preocuparmo-nos mais com todas as pessoas que são exploradas no actual sistema económico, e a preocuparmo-nos com todas as outras criaturas da Terra que sofrem (ou estão à beira da extinção) porque perdem o seu habitat, são afectados pela poluição ou por alterações climáticas.

Esse amor cria um propósito na nossa vida e também um sentimento de pertença.

Os Bahá’ís acreditam que todas as pessoas são criadas como seres nobres e devem ter direitos iguais. Simultaneamente, cada ser humano partilha a responsabilidade pelo bem-estar da sociedade. Os ensinamentos Bahá’ís dizem que as pessoas encontram a felicidade na promoção dos “...melhores interesses dos povos… da terra” (Selecção das Escrituras de Bahá’u’lláh, CXVII)

Bahá’u’lláh disse: “Que a vossa visão seja de âmbito mundial em vez de se confinar ao vosso próprio ser.” (Idem, XLIII). Essa atitude altruísta vem do fundo de um individuo e é a chave para a felicidade individual – assim como um pré-requisito para mudanças de maior escala necessárias para criar uma civilização sustentável.

Imaginemos uma sociedade que se preocupa com o bem-estar de cada pessoa e onde os indivíduos desejam contribuir para o bem comum. Servir juntos para tornar o mundo um local melhor torna as pessoas verdadeiramente felizes. Dá às suas vidas um objectivo profundo e um sentimento de pertença a um círculo social significativo. Existem muitas áreas de acção social onde podemos fazer a diferença em vez de gastarmos o nosso tempo, mente e coração em compras sem sentido.

A questão complicada é como chegamos lá. Ao longo das últimas décadas, a Comunidade Bahá’í tem experimentado um modelo de transformação social que parece dar resultados. As comunidades capacitam-se com aulas de estudo que proporcionam alimento espiritual, valores éticos e também competências e experiência para serviço prático à comunidade. Este modelo tem sido usado com adultos, jovens e crianças em quase todos os países do mundo.

Estes esforços educativos podem ser alargados e replicados. Já mostraram que produzem resultados e são promissores, pois lançam as bases da transformação social. As pessoas não sentem necessidade de consumo excessivo porque têm uma vida preenchida e com sentido.

Os ensinamentos Bahá’ís dizem:
...a honra e a distinção do individuo consiste nisto: que ele, entre as multidões do mundo, se torne uma fonte de bem social. Será possível conceber uma dádiva maior que esta, quando o individuo olha para si próprio e vê que, através da graça confirmadora de Deus, ele se tornou uma fonte de paz e bem-estar, de felicidade de progresso para os seus semelhantes? Não, pelo Deus Uno e Verdadeiro, não existe alegria maior, nem deleite mais completo. (‘Abdu’l-Bahá, The Secret of Divine Civilization, pp. 2-3)

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Texto original: We Can Overcome Consumerism (www.bahaiteachings.org)

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Christine Muller estudou música e é uma apaixonada pelo meio-ambiente e pela Fé Bahá’í. Actualmente é professora no Wilmette Institute no curso sobre alterações climáticas.

sábado, 8 de setembro de 2018

Obrigado aos Jornalistas!

Por Jaine Toth.


A preocupação e a valorização das pessoas que nos protegem - militares, bombeiros e policias - é comum e por bons motivos. A nossa segurança é sua principal prioridade.

Eles protegem a nossa integridade física e os nossos bens; e porque o medo pode ter efeitos prejudiciais, as suas acções também servem como protecção para nossa saúde psicológica e emocional.

Poucos de nós têm o mesmo apreço pelos jornalistas - mas devíamos ter. Jornalistas de investigação e fotojornalistas colocam-se frequentemente em perigo para manter as nossas mentes livres e informadas - e também, para manter as nossas sociedades livres de mentiras e corrupção.

Um repórter que conheço, David Leeson, trabalhou como fotógrafo (para um jornal) e como fotojornalista de 1977 a 2008. Mesmo depois de ter sido ferido quando cobria os protestos no Panamá durante o período que antecedeu a queda de Manuel Noriega, Leeson continuou a cobrir acontecimentos em todo o mundo, e também aqui nos EUA. Recebeu prémios famosos, incluindo o Pulitzer em 2004 para Reportagem Fotográfica pela sua cobertura da guerra no Iraque, da qual a sua esposa e amigos ficaram aliviados quando ele regressou vivo e ileso.

No Arizona, onde eu vivo, basta dizer o nome Don Bolles e as pessoas fecham os olhos e abanam a cabeça, lembrando o seu assassinato. A maioria dos leitores pode não conhecer a história de Bolles; aqui fica um breve resumo do AZCentral.com:
Em 2 de Junho de 1976, uma bomba explodiu debaixo do carro do jornalista do Arizona Republic Don Bolles. Onze dias depois, ele morreu. Hoje, ainda há quem acredite que o assassinato de Bolles é um mistério. Os procuradores dizem que ele foi morto devido às suas histórias que atacavam o poderoso empresário Kemper Marley. Outros pensam que ele morreu devido ao que escreveu sobre o crime organizado. E há ainda quem acredite que o crime foi combinado pelos dois. A verdade está enterrada nas mentes, ou nos túmulos, dos que estiveram envolvidos.
Em numerosos países, os jornalistas geralmente não podem escrever ou filmar nada que não esteja de acordo com a posição oficial do governo; é o governo que decide aquilo que as pessoas podem (ou não) saber. Há criminosos que não querem que os seus crimes sejam divulgados; e também há políticos corruptos com a mesma atitude.

Os ensinamentos Bahá’ís elogiam o jornalismo e enaltecem o seu papel numa sociedade livre e desenvolvida:
Podemos determinar o progresso, ou retrocesso, de uma nação pelo seu jornalismo... Os jornalistas devem escrever artigos relevantes, artigos que fomentem o bem-estar público. Se o fizerem, serão os primeiros agentes do desenvolvimento da comunidade. (‘Abdu’l-Bahá, from the Pennsylvania Public Ledger.  Texto de Mina Yazdani’s no livro Abdu’l-Baha’s Journey West)
Em todo o mundo, os jornalistas que concordam com estas palavras de ‘Abdu'l-Bahá e que arriscam as suas vidas para descrever factos reais aos seus leitores, por vezes acabam na prisão ou são executados. Morrem em guerras. Arriscam tudo para nos trazer a verdade.

Mesmo aqui nos Estados Unidos, há muitas pessoas poderosas que tentam subverter o trabalho dos jornalistas. E há jornalistas que enfrentam perigos para descobrir segredos incómodos que o público deve - e precisa - conhecer.

David Gilkey
Em 2016, um ataque no Afeganistão tirou a vida do fotógrafo e editor de vídeo da NPR, David Gilkey, e do repórter afegão Zabihullah Tamanna. Encontravam-se com um pequeno grupo de jornalistas da NPR e viajavam com uma unidade do exército afegão quando a sua coluna foi atacada.

O general do exército dos EUA, John W. Nicholson, comandante da missão de apoio dos EUA-NATO no Afeganistão emitiu uma declaração sobre os jornalistas mortos. Dizia: "Temos o maior respeito pelo seu trabalho, bem como o de outros que suportam as dificuldades que surgem quando se faz cobertura noticiosa em zonas de conflito".

Gilkey, que fazia a cobertura noticiosa da situação no Afeganistão desde os ataques de 11 de Setembro nos Estados Unidos, e que começou a trabalhar para a NPR em 2007, recebeu a honra de ser eleito Fotógrafo do Ano de 2011 pela Associação de Fotógrafos da Casa Branca.

Funcionários da NPR também falaram sobre a importância do trabalho feito por estes jornalistas e pelos seus colegas. "Ele dedicou-se a ajudar o público a ver essas guerras e as pessoas apanhadas por elas", disse Michael Oreske, vice-presidente e director da NPR. “Ele morreu mantendo esse compromisso... Como homem e como fotojornalista, o David trouxe a humanidade de todos ao seu redor. Ele permitiu-nos ver o mundo e ver-nos uns aos outros através dos seus olhos. ”

Jarl Mohn, presidente e CEO da NPR, afirmou: “Eventos horríveis como este lembram-nos o papel importante que os jornalistas têm na vida cívica dos Estados Unidos. Eles ajudam-nos a entender além dos cabeçalhos e títulos, e a ver a humanidade nos outros”.

Pessoas como Gilkey, Tamanna e os seus colegas jornalistas merecem o nosso mais profundo respeito e apreço. Os seus esforços mostram que o custo da guerra afecta as pessoas, especialmente as inocentes. Eles partilham as suas histórias para que o mundo preste atenção e entenda.

As escrituras Bahá’ís dizem-nos:
Incumbe a cada alma gastar estes poucos dias de vida na veracidade e justiça... (Bahá’u’lláh, Bahá’í Scriptures, p. 85)
… Devemos falar a verdade; de outra forma não agiremos com sabedoria… Os maiores talentos do homem são a razão e a eloquência de expressão. ('Abdu'l-Bahá, Divine Philosophy, p. 103)
Falar a verdade no jornalismo também pode ajudar a:
(…) extinguir, através do poder da sabedoria e da força da vossa palavra, o fogo da inimizade e do ódio que arde no coração dos povos do mundo. (Bahá’u’lláh, Epistle to the Son of the Wolf, p. 12)
Assim, gostaria de agradecer a todos os jornalistas de investigação e fotojornalistas: vocês merecem a nossa mais profunda gratidão. A vossa coragem e integridade ajudam-nos a manter a nossa independência e ajudam-nos a dar-nos os factos que usamos para formar as nossas próprias opiniões e tomar as nossas decisões.

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Texto original: Thanking Journalists: First Responders for the Truth (www.bahaiteachings.org)

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Jaine Toth é actriz, escritora e formadora. Vive no Arizona (EUA), perto do Desert Rose Baha'i Institute. É autora de uma coluna semana num jornal.

sábado, 25 de agosto de 2018

Os Bahá’ís e as Armas de Fogo

Por David Langness.


Cresci a caçar e a pescar no estado de Washington (EUA). Os meus pais tinham cinco filhos, e pouco dinheiro; por isso, durante minha infância, apanhávamos ou matávamos muita de nossa comida.

O meu pai, oficial de infantaria nos fuzileiros durante a Segunda Guerra Mundial, ensinou-me a disparar com armas de fogo. Era um atirador experiente e tinha treinado fuzileiros no campo de tiro; preocupava-se profundamente com a segurança das armas. Eu era o mais velho dos seus filhos e ele ensinou-me a conhecer e a compreender o poder das armas, a usá-las com cuidado extremo e a respeitar o perigo grave que representavam.

Quando eu vinha da escola, a minha mãe costumava pedir-me para ir buscar o jantar. Não ia à loja. Em vez disso, pegava na minha espingarda de calibre 16 e no Jinx (o meu cão de caça) e andava pelos campos da quinta à procura de um faisão, um pato ou um ganso que pudéssemos comer naquela noite.

Não passávamos fome. À mesa durante o jantar, tinha um jogo com os meus irmãos e irmãs - enquanto comíamos os pássaros que meu pai ou eu tínhamos caçado, tentávamos ver quem encontrava na sua comida o maior número de chumbos da munição da espingarda. Juntávamos os nossos pratos e contávamos os chumbos. Quem encontrava mais chumbos comia a sobremesa primeiro.

Quando fiz 12 anos, chegou o momento do ritual padrão de passagem na vida de um menino na América rural - caçar o meu primeiro veado. O meu pai, que trazia suficiente carne de veado para casa todos os anos para nos alimentar durante o inverno, levou-me a caçar. Depois de um dia frio na floresta, vimos um grande macho. Apontei a minha arma. Então, de repente, percebi, ao olhar para aquele animal lindo através da mira telescópica na espingarda do meu pai, que não conseguia puxar o gatilho. Sabia que o animal representava comida para a minha família - mas, por alguma razão desconhecida, tomei a decisão de não disparar. Senti-me muito mal, mas o meu pai – honra lhe seja feita - compreendeu. Agora, olhando para trás, acredito que aquele momento representou o surgimento de algo espiritual em mim.

Naquele dia, larguei as armas para sempre.

Seis anos mais tarde, quando tinha 18 anos, tomei duas decisões importantes. Tornei-me Bahá’í e registei-me no recrutamento militar como objector de consciência. Os ensinamentos Bahá'ís ensinaram-me claramente que eu deveria perder a minha própria vida em vez de tirar a vida de outra pessoa:
Que ninguém lute contra outro, e que nenhuma alma mate outra; isto, em verdade, é o que vos foi proibido… O quê? Mataríeis aquele a quem Deus vivificou, a quem Ele dotou de espírito através do seu sopro? Severa seria, então, a vossa transgressão perante o Seu trono! (Bahá’u’lláh, The Kitab-i-Aqdas,¶73)
Quando li estas palavras no Livro Mais Sagrado de Bahá’u’lláh, percebi imediatamente que não podia matar outro ser humano. Assim, com o apoio dos Bahá’ís e da minha nova Fé, solicitei e recebi o estatuto de objector de consciência; isto significava que podia ser chamado para o Exército, mas não usaria armas, nem seria treinado para matar.

Em Julho do ano seguinte, o Exército enviou-me para o Vietname e, durante um ano, vi o que as armas fazem aos seres humanos. Sim, elas matam pessoas, mas não apenas com balas. Elas também matam o espírito do assassino. A carnificina e a morte ao meu redor fizeram-me perceber a sabedoria do mandamento de Bahá’u’lláh.

Quarenta anos depois, infelizmente, as nossas sucessivas guerras ajudaram a transformar a América numa cultura de armas. Existem mais armas mortais do que pessoas no nosso país. As armas tornaram-se fáceis de obter e fáceis de usar, e nos EUA morrem mais pessoas devido a armas de fogo do que em qualquer outra nação industrializada.

Então, o que acreditam os Bahá’ís sobre armas? Primeiro, uma vez que Bahá’u’lláh disse que é melhor ser morto do que matar, os Bahá’ís não tiram a vida dos outros. Além disso, Bahá’u’lláh apelou ao desarmamento de todo tipo de armas, não apenas por nações, mas por indivíduos. Consequentemente, a lei Bahá’í apenas permite a posse e o porte de armas se for absolutamente necessário:
Bahá’u’lláh confirma uma determinação que torna ilegal o porte de armas, a menos que seja necessário fazê-lo. Em relação às circunstâncias em que o porte de armas pode ser “essencial” para um indivíduo, ‘Abdu’l-Bahá dá permissão a um crente para autoprotecção num ambiente perigoso. Há uma série de outras situações em que as armas são necessárias e podem ser legitimamente usadas; por exemplo, em países onde as pessoas caçam a sua comida e roupas, e em desportos como tiro desportivo, tiro com arco, e esgrima. (The Kitab-i-Aqdas, p. 240)
Descrevendo os Bahá’ís, Bahá’u’lláh disse:
Deus misericordioso! Estas pessoas não precisam de armas de destruição, na medida em que elas se prepararam para reconstruir o mundo. As suas hostes são as hostes das boas acções e as suas armas as armas da conduta íntegra. (Baha'u'llah and the New Era, p. 170)
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Texto original: Baha’is and Guns (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

domingo, 24 de setembro de 2017

A minha amiga que tentou suicidar-se

Por David Langness.


Tive uma amiga no ensino secundário, viva e magnética, com cabelo ruivo flamejante. Um dia ela parecia que estava um pouco triste e desanimada. Quando vinha da escola e regressava a casa, parei na casa dela e perguntei-lhe: "Tu estás bem?"

E enquanto ficámos frente a frente, à porta da casa, ela não resistiu e começou a soluçar. As lágrimas caíam como dois rios sobre a sua face. Aproximei-me e abracei-a; ela chorou ainda mais e todo o seu corpo se afundou um choro convulsivo.

Após cerca de dez minutos, ela mostrou-me um enorme frasco de comprimidos que tinha na mão. "Estava quase a tomar isto tudo", disse ela. E acrescentou que tinha feito uma promessa silenciosa a si própria: que, se durante todo aquele dia, ninguém lhe perguntasse como é que ela estava, ela suicidar-se-ia.

Aconteceu que o seu namorado tinha terminado a relação com ela no dia anterior, e, na mesma noite, o seu pai anunciou que ele e a sua mãe se iam divorciar. A minha amiga sentiu que a sua vida esta a desabar e que nunca mais voltaria a ser feliz. Por isso, decidiu acabar com a sua vida, a menos que alguém interferisse. Por sorte, e sem saber disso, eu interferi nos seus planos.

Sentámo-nos na sala de estar e conversámos. Eu ainda não era Bahá’í, mas disse-lhe que os ensinamentos Bahá’ís, tal como os ensinamentos de todas as grandes religiões, proíbem o suicídio. A vida é considerada como uma oferta do Criador:
Deus criou o homem sublime e nobre, tornou-o um factor dominante na criação. Especializou o homem com favores supremos, conferiu-lhe mente, percepção, memória, abstracção e os poderes dos sentidos. Estas dádivas de Deus para o homem tinham como objectivo fazer dele a manifestação das virtudes divinas, uma luz radiante no mundo da criação, uma fonte de vida e um agente construtivo nos campos infinitos da existência. Devemos, pois, destruir este grande edifício e as suas próprias fundações, derrubar este templo de Deus, o corpo social ou político? (‘Abdu’l-Bahá, The Promulgation of Universal Peace, p. 352)
Todos os anos, em todo o mundo, há quase um milhão de pessoas que se suicida - e isso sem contar com os excessos de drogas ou álcool, muitas vezes rotulados como "morte acidental", mas que são realmente intencionais. Imagine o que essas almas abandonadas poderiam ter dado à humanidade e ao mundo se tivessem decidido viver. Imagine os danos permanentes que as suas mortes causam nos seus entes queridos. Imagine, também, o que poderia ter acontecido se elas tivessem decidido superar pacientemente os seus testes e provações, e reconhecer que os caprichos da vida significam que nossos problemas acabam por passar:
Não deveis ferir-vos ou suicidar-vos... Não é permitido... Se alguém, em algum momento, encontrar situações difíceis e intricadas, deve dizer a si próprio: "Isto em breve passará." (‘Abdu'l-Bahá, Star of the West, Volume 7, p. 280)
A minha amiga, que tinha 15 anos naquela altura, não pôs termo à sua vida. Cresceu, teve um casamento feliz, foi mãe de três filhos maravilhosos, que hoje são adultos e têm os seus próprios filhos. Ela também se tornou uma artista de sucesso, cujas belas pinturas valorizaram milhões de vidas.

No entanto, os ensinamentos Bahá’ís não condenam, nem castigam, aqueles que põem termo às suas próprias vidas. Apesar das leis Bahá’ís proibirem o suicídio, os Bahá’ís entendem que algumas pessoas simplesmente não conseguem enfrentar outro momento neste plano difícil da nossa existência. Na verdade, os ensinamentos Bahá’ís consideram o suicídio como triste e deplorável - mas também reconhecem o ímpeto subjacente que todas as pessoas enfrentam e vêem-no com piedade e compaixão. Essa compreensão amável, exemplificada nesta carta de ‘Abdu’l-Bahá a uma mulher cujo marido acabara com a sua própria vida, assegura-nos que as condições de depressão grave, angústia e tristeza que levam ao suicídio serão aliviadas no próximo mundo:
Ó buscadora do Reino! A tua carta foi recebida. Escreveste sobre a grave calamidade que te aconteceu - a morte do teu respeitável marido. Esse homem honrado foi sujeito a tamanho stresse e tensão neste mundo que o seu maior desejo era libertar-se dele. Assim é esta morada mortal: um armazém de aflições e sofrimento. É a ignorância que o liga ao homem, pois nenhum conforto se pode assegurar a qualquer alma neste mundo, desde o monarca até o mais humilde dos plebeus. Se, numa ocasião esta vida oferece um cálice doce a um homem, seguir-se-ão cem amargos; essa é a condição deste mundo.

O homem sábio, portanto, não se liga a esta vida mortal e não depende dela; em alguns momentos, até, ele desejará ansiosamente a morte, para que, com isso, se possa libertar dessas dores e aflições. Assim, vê-se que alguns, sob extrema pressão da angústia, se suicidaram.
Quanto ao teu marido, tem a certeza: ele será imerso no oceano de perdão e da indulgência e tornar-se-á o receptor da graça e do favor. (Selections from the Writings of Abdu’l-Baha, nº 170)
Hoje, 10 de Setembro, é o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. A Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio tem uma série de sugestões no seu site para ajudar quem pensa em suicidar-se. Também descreve os casos de muitas pessoas suicidas que não queriam morrer, mas preferiram que alguém interferisse e as parasse - que esperavam e procuravam activamente alguém que sentisse o seu desespero e lhes perguntasse se elas estavam bem.

Às vezes, as pessoas suicidas dizem que fizeram uma promessa a si próprias: que se alguém lhes perguntasse, contariam tudo e permitiriam que interferissem, tal como aconteceu com a minha amiga ruiva.

A próxima vez que um amigo, um membro da família ou algum estranho parecer estar em baixo ou deprimido, você vai perguntar-lhe?

Todos sabemos que a vida é preciosa e, por vezes, precária. Durante algum momento particular de grande sofrimento, depressão ou tristeza, quase toda a gente pensa que a morte pode ser mais fácil do que a vida. Então, perder um minuto para falar com alguém e perguntar-lhes se está bem - seja um estranho, um amigo ou um familiar próximo - pode mudar o rumo daquela vida, e da sua também.

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Texto original: My Friend Who Tried to Kill Herself (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.