sábado, 18 de novembro de 2017

O Selo dos Profetas: o encontro com Deus no Último Dia

Por Christopher Buck.


Tendo crescido e sido educado como Cristão, muitas vezes ouvi a expressão: "A Bíblia diz…" seguida de uma citação a que a pessoa identificava o respectivo capítulo e versículo.

E também era frequente ouvir uma resposta do género: "Sim, mas a Bíblia também diz…", seguida de outro versículo como justificação de uma opinião contrária. Era como se o texto sagrado estivesse a discutir consigo próprio!

Particularmente interessante em todos os textos sagrados - e problemáticos na maioria - são as profecias sobre o Último Dia, o Dia do Juízo, etc. Porquê? Porque são difíceis de entender. Lêem-se com facilidade, mas são intrigantes - sejam textos da Bíblia, sejam textos do Alcorão.

Então vamos analisar as profecias dos últimos dias no Alcorão. É verdade que o Islão radical está nas notícias todos os dias. É uma vergonha, pois isso mancha o bom nome do Islão.

Mas vamos pensar no Islão tradicional - o Islão mais conhecido - onde a maioria dos muçulmanos são pessoas comuns, como qualquer um de nós, e que apenas querem viver em paz e prosperidade, e que obtêm muita inspiração e orientação na sua Fé.

Provavelmente, a maioria dos muçulmanos (quase 2 mil milhões de muçulmanos no mundo hoje) afirmará que o Profeta Maomé é o "Selo dos Profetas".

Isto baseia-se num versículo muito importante no Alcorão: 33:40. Muitos consideram este versículo como o versículo doutrinariamente mais importante do Alcorão.

Com a possível excepção dos Ahmadiyya (um novo movimento religioso principalmente centrado no Paquistão), isso significa que os muçulmanos consideram Maomé como o último profeta. Ponto final. Assunto encerrado. Fim da conversa.

Os Bahá'ís concordam. De facto, Bahá’u’lláh enaltece Maomé da seguinte maneira, que vai um pouco ultrapassa o Alcorão 33:40:
Glorificado és tu, ó Senhor, meu Deus! Peço-Te, pelos Teus Eleitos e pelos Portadores da Tua Confiança, e por Aquele a Quem ordenaste ser o Selo dos Teus Profetas e dos Teus Mensageiros, que permitas que a Tua lembrança seja a minha companheira, e o Teu amor seja o meu objectivo, e a Tua face o meu objectivo, e o Teu nome a minha lâmpada, e a Tua vontade o meu desejo, e o Teu prazer a minha alegria. (Bahá’í Prayers, p. 74)
Agora consideremos o seguinte: os Profetas profetizam; Eles prevêem. De acordo com a Fé Bahá'í, Maomé foi o último dos Profetas, ou seja, o último daqueles que profetizam. Por outras palavras, Maomé foi o último Profeta no "Ciclo da Profecia", que começou com Adão.

Muito bem. Maomé é o último Profeta. O último a profetizar. E o que vem depois? Quem vem depois?

A profecia termina quando começa o cumprimento. Depois do "Ciclo da Profecia" vem o "Ciclo de Cumprimento".

E o que significa isso, podemos perguntar?

É simples: as profecias predizem o futuro. Quando as profecias se tornam realidade, então elas cumprem-se. A profecia torna-se a realidade. É assim que funciona.

Cerca de um terço do Alcorão prediz o Último Dia. O Último Dia é um bom exemplo do que os Bahá’ís pretendem dizer com "Ciclo de Cumprimento".

Apesar dos profetas profetizarem, as suas profecias nem sempre são claras, e muitas vezes exigem interpretação. Para iniciar a interpretação de qualquer profecia temos de colocar esta questão fundamental: "A profecia é literal ou figurada?"


Vamos ver a primeira profecia que surge no Alcorão após o versículo 33:40. Ela aparece apenas quatro versículos mais à frente, no 33:44:
No dia em que eles forem levados à presença do seu Senhor, a sua saudação de uns para os outros será: "A paz esteja contigo". Deus preparou-lhes uma recompensa honrosa. (Alcorão 33:44, tradução de Muhammad Sarwar)
Outra tradução do mesmo versículo afirma o seguinte:
A sua saudação, no dia em que O encontrarem, será "Paz!" E Ele preparou-lhes uma generosa retribuição. (Alcorão 33:44, tradução de A.J. Arberry)
A tradução de Arberry ("O encontrarem") é literal. A tradução de Sardar ("levados à presença do seu Senhor ") é figurada. Isso está mais em consonância com a perspectiva Bahá’í.

Agora vamos usar nossa chave de quatro passos para compreender a linguagem profética:

Passo 1: Se é impossível, então não é literal. Porque é que a leitura literal é impossível aqui? Porque é impossível conhecer Deus directamente, frente a frente. O próprio Alcorão diz: "Nenhuns olhos mortais podem vê-Lo, mas Ele pode ver todos os olhos. Ele é Todo-Generoso e Omnisciente." (6:103, tradução de Muhammad Sarwar)

Passo 2: Se não literal, então é figurado. Qual é a comparação ou analogia aqui representada? O que se compara a "conhecer Deus"? Temos de concordar com isto: "encontrá-Lo" é literal. E isso é impossível. O que é possível é ser "levado à presença do seu Senhor", tal como traduz Sarwar.

Passo 3: Se é figurado, então é simbólico. Quais são as características que esse símbolo representa? O que significa "encontrar Deus"? Seja qual for o significado de "presença do seu Senhor", é certamente um evento em que a vontade de Deus é comunicada e divulgada de forma clara. Se não podemos encontrar-nos directamente com Deus, a próxima melhor coisa é encontrar o embaixador de Deus, o mensageiro de Deus, ou aquilo a que os Bahá’ís chamam "Manifestante de Deus", que expressa "Deus" em natureza, mas não em essência.

Passo 4: Se é simbólico, então é espiritual e social. Quem (ou o que) representa essas características? De acordo com os ensinamentos Bahá’ís, quando Deus envia um mensageiro à humanidade, esse mensageiro vem da presença de Deus e, portanto, representa Deus. Quem tem a graça e a bênção de encontrar o mensageiro de Deus, conseguiu - numa forma figurada e simbólica - "encontrar Deus" ao ser "levado à presença do seu Senhor".

Pensemos na "presença de Deus" como o carisma divino, uma aura de santidade, o nimbo do sagrado, o efeito de halo. Talvez seja uma surpresa saber que que o "carisma" é realmente um termo científico usado no mundo académico: os sociólogos da religião falam sobre os fundadores das grandes religiões mundiais como tendo "carisma".

Fiz o melhor que pude para simplificar a perspectiva Bahá'í sobre estes dois versículos-chave do Alcorão, que representam um grande plano dos dois ciclos: o Ciclo da Profecia, seguido pelo Ciclo de Cumprimento. Bahá’u’lláh deixa claro neste importante parágrafo do seu Livro de Certeza, dirigido ao mundo islâmico:
E no entanto, através do mistério do primeiro versículo [Alcorão 33:40], eles afastaram-se da graça prometida pelo segundo [Alcorão 33:44], apesar do facto do “alcançar da Presença divina” no “Dia da Ressurreição” ser explicitamente afirmada no Livro. Foi demonstrado e provado definitivamente, através de evidências claras, que por “Ressurreição” se pretende significar o aparecimento do Manifestante de Deus para proclamar a Sua Causa, e por “alcançar da Presença Divina” se pretende significar o alcançar da presença da Sua Beleza na pessoa do Seu Manifestante. Pois, em verdade, “Nenhum olhar O percebe, mas Ele percebe todos os olhares” [Alcorão 6: 103]. Não obstante todos estes factos indubitáveis e exposições claras, eles agarraram-se loucamente ao termo “selo”, e permaneceram totalmente privados do reconhecimento d’Aquele Que é o Revelador tanto do Selo como do Princípio, no dia da Sua presença [Baha’u’llah]. (Kitab-i-Íqán, ¶182) (citações do Alcorão em parêntesis rectos)

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Texto original: The Seal of the Prophets: Meeting God on the Last Day (www.bahaiteachings.org)

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Christopher Buck (PhD, JD), advogado e investigador independente, é autor de vários livros, incluindo God & Apple Pie (2015), Religious Myths and Visions of America (2009), Alain Locke: Faith and Philosophy (2005), Paradise e Paradigm (1999), Symbol and Secret (1995/2004), Religious Celebrations (co-autor, 2011), e também contribuíu para diversos capítulos de livros como ‘Abdu’l-Bahá’s Journey West: The Course of Human Solidarity (2013), American Writers (2010 e 2004), The Islamic World (2008), The Blackwell Companion to the Qur’an (2006). Ver christopherbuck.com e bahai-library.com/Buck.

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