Recentemente, um post do Rui A., do Blasfémias, apresentava uma interessante reflexão sobre temas como Deus e o sentido da vida. Algumas das ideias ali expressas mexeram comigo; não consegui resistir a dar a minha opinião. Assim, sem querer dar lições ou apresentar respostas definitivas, aqui vai a minha perspectiva. Acredito que outros bahá'ís poderiam ter respostas de ligeiramente diferentes das que expresso aqui.
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"Deus, a existir, não terá privilegiado uns tantos em detrimento de muitos outros, a quem não foi dada a graça de O escutar pela forma romano-católica da revelação, ou não a tenham sabido ou, mesmo até, querido ouvir"
"A grandeza de Deus, a existir, não faria depender a Sua graça da geografia, da cultura, da sensibilidade ou do tempo de cada um"
Estou plenamente de acordo. Acredito que Deus se revela de tempos a tempos à humanidade. Fá-lo através de Profetas (ex: Abraão, Moisés, Jesus, Maomé, Buda e outros). Estes Profetas (que fundam as grandes religiões mundiais) trazem ensinamentos adequados à capacidade e necessidade dos povos. São os ensinamentos desses profetas que estão na génese das grandes civilizações e servem de orientação divina a vários povos e sociedades que se formam nessas civilizações.
Poderá haver outras formas de manifestação divina? Talvez. Mas não creio que possam servir de orientação divina para a humanidade. Há quem afirme ter tido experiências de carácter místico, mas creio que se tratam de experiências pessoais, apenas são importantes para quem passa por elas.
"No Deus humanizado das religiões reveladas, não é fácil crer. No Deus bom e misericordioso, que olha por cada um de nós, não. Definitivamente, não. Não existe qualquer ordem moral objectiva no mundo que o confirme, nem a eternidade poderá justificar o que neste mundo se vive"
O que se vive neste mundo pode ser entendido como resultado da acção simultânea de dois processos: a construção de uma nova ordem mundial (a tal ordem em que a terra será um só país e a humanidade os seus cidadãos) e a desintegração da velha ordem. Desta forma vamos sentindo as convulsões de um mundo que vai morrendo e a as dores de parto de um mundo que está a nascer. É doloroso. Tremendamente doloroso.
A nível individual, o que vivemos durante a nossa existência neste mundo pode ser entendido se compararmos a vida neste mundo com a vida de um bebé no ventre materno. Tal como um bebé no ventre materno tem de desenvolver uma série de características físicas para se preparar para o mundo seguinte, nós neste mundo temos de desenvolver características espirituais para o mundo que se segue depois deste.
Não teremos um Deus que olha e nos protege a cada instante, mas sim um Deus que nos lança neste mundo tal como um agricultor lança sementes num campo à espera que sestas germinem, cresçam e produzam alguma coisa.
"A nossa forma de vida é humana, excessivamente humana, para que nela possamos ver a centelha divina"
Pois é nesta forma de vida excessivamente humana que eu consigo discernir a centelha divina. Na nossa capacidade de amar o próximo, na vontade de ajudar o nosso semelhante, na capacidade de ser solidário... Nada na criação reflecte tão bem a centelha divina como o ser humano.
É certo que o ser humano é capaz do melhor e do pior. Mas aí entra a questão do livre arbítrio. Temos possibilidade de escolha. Não é uma simples questão maniqueísta de escolha entre o bem e o mal. Se não tivéssemos livre-arbítrio, que sentido teria a vida? Como se distinguiria a rectidão da injustiça?
"Sempre achei que a dimensão de Cristo, a Sua grandeza e a Sua tragédia, é humana, demasiadamente humana, para poder ser divina."
Pois eu considero a dimensão de Cristo, a Sua grandeza e a Sua tragédia profundamente divinas. Essa sua dimensão expressou-a o evangelista ao atribuir-lhe as palavras "Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonaste?" (Mt 27:46) numa alusão ao salmo 22, um salmo vitorioso. É que da aparente derrota que foi a Sua morte, surgiu a civilização cristã; com esta, a humanidade transformou-se e evoluiu. Como se poderia explicar esta transformação na humanidade senão fosse pelo carácter divino do fundador do Cristianismo? Como se poderiam explicar tantas e tão nobres causas e iniciativas que se tomam ainda hoje ao abrigo dos ideais pregados por Jesus Cristo? Não consigo aceitar que tudo isso seja um mero acaso ou capricho da história.
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