sexta-feira, 3 de setembro de 2004

Brincar às guerras

Quando eu era miúdo gostava de brincar às guerras. Com espadas e escudos improvisados, ou pistolas e cabos de vassoura transformados em metralhadoras, consoante a imaginação. O jardim de casa dos meus pais tinha árvores e recantos que permitiam organizar emboscadas ou serviam de esconderijos. A restante miudagem lá da rua alinhava naquelas guerras de fantasia.

Sempre o fizemos tranquilamente. Nunca tivemos noção do que era mesmo uma guerra. A verdadeira guerra era uma coisa séria de adultos que se passava em qualquer outro país; a nossa guerra eram filmes como O Dia Mais Longo ou série do tipo Capitão Kloss (alguém ainda se lembra dessas série polacas que a RTP passava a seguir ao 25 de Abril?).

As poucas vezes que vi operações militares foi durante o 11 de Março de 1975. Os aviões que atacaram o RALIS sobrevoavam a nossa escola; as mães correram para lá em pânico, para ir buscar os filhos. Ouviam-se tiros ao longe; na televisão liam-se comunicados Ao fim do dia, uma coluna militar atravessou o bairro. Vinham alguns veículos; e muitos soldados que caminhavam junto aos edifícios. Foi a única vez que, no meu país, a verdadeira guerra passou perto de mim.



Ontem, deparei com esta foto no site da BBC. Trata-se de um miúdo iraquiano que, tal como eu fazia há 30 anos, também brinca às guerras. Tal como eu, tenta imitar aquele jogo emocionante dos adultos que andam aos tiros. Infelizmente, é aquilo é uma brincadeira extremamente perigosa no país dele. A verdadeira guerra está muito próximo dele. Apontar uma arma de brinquedo a um soldado é um risco enorme. Foi o que ele fez à passagem de uma patrulha britânica.

Esperemos que algum adulto lhe tenha chamado a atenção para isso. Esperemos que um dia ele possa brincar tranquilamente.

(A foto faz parte de uma reportagem fotográfica de um soldado britânico em serviço no Iraque. Vale a pena ver.)

Sem comentários: