Aqui fica o meu texto publicado hoje na Terra da Alegria.
Na edição de hoje também se encontram textos do Zé Filipe, Vitor Mácula, Timshel, Maria da Conceição, Manuel Vieira e Carlos Cunha.
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A necessidade de partilha da experiência religiosa pessoal está na base da formação de comunidades religiosas. E nas dinâmicas comunitárias que estas partilhas suscitam podemos encontrar crentes com dois tipos de atitudes bem distintas: os que se afastam do mundo, tentando criar comunidades perfeitas, tentando seguir um estilo de vida ideal de acordo com os ensinamentos religiosos; e os que tomam o caminho oposto, tentando transformar o mundo num local melhor, e desenvolvendo diversas actividades que visam melhorar a vida dos povos.
Os parágrafos que se seguem são excertos de escrituras e palavras de teólogos de várias religiões, onde se justifica a necessidade da comunidade religiosa intervir no mundo, e de o transformar numa sociedade mais justa e mais equilibrada. As citações foram retiradas do livro The Phenomenon of Religion: A Thematic Aproach de Moojan Momen; a tradução é da minha responsabilidade.
SIKHISMO
... cada Sikh age e ora pela fraternidade universal: o Sikh ora em busca da sarbat da bhala (bem-estar para todos)...
o Sikhismo é muito claro quanto ao tipo de serviço que deve ser prestado e a quem deve ser prestado. O serviço material, assim como o proporcionar de descanso e alívio aos outros, ou a leitura das escrituras para os outros para lhes oferecer conforto espiritual é muito superior aos incontáveis fogos de sacrifício, à prática de cerimónias ou à mera meditação e conhecimento mundano... O sikhismo também contém instruções contra a oferenda de comida ou dinheiro aos chamados "renascidos"; em vez deles, são os pobres e os necessitados que devem ser auxiliados. O Guru Gobind Singh faz uma declaração claramente inequívoca a este respeito: o verdadeiro serviço é o serviço a estas pessoas (vulgares). Não estou inclinado a servir as castas elevadas; a caridade dará frutos neste e noutros mundos apenas se for dada a essas pessoas necessitadas. (Singh, Sikh Theology of Liberation, pag. 124, 127-128)
RELIGIÃO BAHÁ'Í
O quarto princípio ou ensinamento de Bahá'u'lláh é o reajustamento e equilíbrio dos padrões económicos da humanidade. Isto lida com a questão da subsistência humana. É evidente que sob os presentes sistemas e condições de governação, os pobres estão sujeitos a grandes necessidades e miséria, enquanto que outros mais afortunados vivem no luxo e com muito mais do que as suas reais necessidades. Esta desigualdade de quinhão e privilégio é um dos problemas mais profundos e vitais da sociedade humana. Que existe uma necessidade de um equilíbrio e partilha através dos quais todos possuam os confortos e os privilégios da vida, isso é evidente. O remédio é legislar sobre o reajustamento das condições. Os ricos também devem ser misericordiosos com os pobres, contribuindo voluntariamente para as suas necessidades, sem serem forçados ou compelidos a fazê-lo. A tranquilidade do mundo será assegurada através do estabelecimento deste princípio na vida religiosa da humanidade ('Abdu'l-Bahá, Promulgation of Universal Peace, p.107-108)
CRISTIANISMO
A Teologia deve vir dos pobres... A Igreja necessita da reflexão dos pobres. Eles conhecem a morte num nível íntimo que nenhum intelectual conhece.... O ponto de partida da teologia da libertação é o compromisso com os pobres, as “não-pessoas”. As suas ideias vêm das vítimas... O compromisso com os pobres é o verdadeiro local da experiência espiritual. No compromisso com os pobres... encontra-se Deus. [Gutierrez] reconheceu que Deus não é o principal tema na teologia da libertação, mas acrescentou "Estamos a trabalhar nisso"... A teologia da libertação não é optimista. Fala frequentemente de pecado e a situações de pecado. "Não temos a certeza noutra sociedade, mas temos a certeza que a presente sociedade não é viável e devemos mudá-la." (relatório de Gustavo Gutierrez dirigido a uma reunião da Associação de Teologia Católica, Junho 1978, citado em Schall, Liberation Theology in Latin America)
JUDAISMO
A teologia da libertação judaica reconhece que o mundo mudou, e que pela simples aplicação das categorias pré-holocausto e holocausto ao mundo contemporâneo fechamos os nosso olhos e ouvidos à dor e à possibilidade do presente. Ao transportar a nossa própria história, legamos à posteridade uma compreensão das lutas contemporâneas. Se estivermos esmagados, porém, pela história e procuramos esmagar os outros, a nossa memória torna-se um calço de cólera e estreiteza de espírito, um instrumento rude em vez de uma memória delicadamente nutrida... Aqueles que queriam um regresso ao Egipto recusavam o risco do deserto, certamente uma posição compreensível. Mas a liberdade estava noutro local, para lá do conhecido, e novos padrões de vida e culto seriam desenvolvidos na dor e luta pela libertação. (Ellis, Towards a Jewish Theology of Liberation, pag. 121)
5 comentários:
Gostei muito das súmulas sobre o tema. Cada vez é mais urgente que as várias religiões pratiquem o ensinamente em vez de só divagarem sobre ele. Se vemos no outro o nosso irmão e todos falam disso, porque é que não agimos em conformidade? Ao nosso irmão deixaríamos morrer à fome, ao frio. O problema é que se diz que se crê, mas muitas vezes não se pratica e aí se vê que os ricos cada vez estão mais ricos e os pobres mais pobres. É só olhar à nossa volta...
'Cheguei' hoje aqui... e ainda bem! :-)
Ha cerca de 1 ano atras, fiz uma experiencia MUITO positiva com uma familia bahai, onde percorremos o primeiro volume do 'Espirito e Vida'. A riqueza que acumulei dentro de mim ao longo dessas sessoes e incontavel! 'Sirvo-me' ate hoje dessa vivencia.
E aqui, passarei a ser visita assidua, ainda que por vezes em silencio.
PS: Sou catolica.
Boa Gente,
Mais um bom post.
Lembrei-me de "pegar" na questão colocada por Maria Lagos sobre o facto de assistirmos a que "os ricos cada vez estão mais ricos e os pobres mais pobres".
Dentro das nações cristãs transparece a ideia que nas sociedades protestantes (luteranos, Baptistas, Calvinistas e anglicanos) há uma melhor distribuição da riqueza do que de entre as católicas romanas.
Será este factor inerente à vivência religiosa das sociedades?
Marta, a maioria dos Bahá'ís em Portugal tem ascendência Católica, se a renegássemos estaríamos muito mal. Como vistante habitual do blog digo-lhe que é muito bem-vinda.
"Como vistante habitual do blog digo-lhe que é muito bem-vinda."
Tá a ver, Marta? Isto é uma categoria de blog! Até já há uma espécie de mordomo a dar as boas vindas!
Só falta mesmo ele oferecer-nos um Ferrero Rocher!
PS - Marta: vou passar a visitar o seu blog. :-)
Olá Marta.
Imagino que esse contacto com essa família baha'i tenha sido num chamado "Circulo de Estudo".
Há vários a decorrer no nosso país.
GH,
Deixa o Moutinho em paz...
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