Por Brittany Betts.
Estou
sentada na sala de espera do hospital e o meu filho de um ano de idade está no
bloco operatório há quatro horas. A ansiedade é um eufemismo.
O meu bebé
ainda tem aguentar mais quatro horas de operação, se a enfermeira que acabou de
me sussurrar a informação estiver correcta. Esta é a sua terceira cirurgia
neste ano; e ele tem apenas um ano de vida. Hoje, sou capaz de explodir se alguém
me disser que as pessoas apenas são testadas de acordo com a sua capacidade.
Hoje sinto-me abandonada por todas e quaisquer versões de Deus.
Olho para a
sala espera cheia de gente. Casais tranquilos, mães, pais, irmãos, amontoam-se em
círculos apertados. Bebendo café, olhando pela janela, olhos vidrados. Sei que
não estou sozinha nos meus pensamentos; não nesta sala e não no mundo.
As pessoas
falam sobre os momentos da vida em que duvidamos. Quando perguntamos porquê,
quando não compreendemos, quando a nossa dor ou a dor que testemunhamos no
mundo nos faz chorar de frustração, raiva, e até fúria. Este é um dos meus
momentos. Não é um processo de pensamento passivo ou hipotético. É real, é
pessoal e é difícil. Esta palavra "fé" não é brincadeira.
Olho para
uma mãe sentada numa poltrona a poucos metros de mim, junto a um carrinho de
criança vazio. Tem a cabeça curvada, os cabelos caídos, penso que talvez esteja
derrotada, mas depois ela ergue a face e vejo os seus olhos fechados, as mãos
apertadas e os lábios movendo-se silenciosamente. Está rezar.
O que leva
esta mãe solitária a pedir a ajuda de Deus? O que a faz levantar o rosto numa
expectativa silenciosa? Onde é que ela encontrou a fé?
O sinal do amor é a força moral sob o
meu decreto e a paciência sob as Minhas provações. (Baha'u'llah, As PalavrasOcultas, árabe, #48)
O primeiro sinal de fé é o amor. ('Abdu'l-Bahá, The Promulgation ofUniversal Peace, p. 336)
Terá a sua
fé aumentado a sua capacidade de lidar com as tristezas, ou de ser paciente
durante provações severas? Isso permite-lhe estar sozinha, sentada ao lado do
seu carrinho de criança vazio com calma interior?
As suas
orações, embora silenciosas, afectam-me como um sofrimento pessoal. Dentro de
mim, também quero que a minha fé seja forte; quero confiar em Deus para guiar
os cirurgiões, para proteger o meu filho, para que o seu sofrimento seja
mínimo, para que a sua recuperação seja rápida. Quero que a minha fé me leve, e
leve o meu filho, através desta e de todas as suas provações.
E agora dou-vos um mandamento que
será sobre uma aliança entre vós e eu - que tenhais fé; que a vossa fé seja
firme como uma rocha, que nenhuma tempestade mundana possa abalar, que nada
possa perturbar, e que subsista por todas as coisas até o fim... Assim como
tiverdes fé, também serão os vossos poderes e bênçãos. (‘Abdu'l-Bahá, Baha’i
Readings, p. 313)
Compreendo.
As orações silenciosas desta mãe são orações silenciosas para manter sua fé; ao
fazê-lo, dão-lhe força, poder e bênçãos.
Penso na
pessoa que eu era há um ano atrás. Estava afortunadamente inconsciente da
obscura desordem genética que se apossou do meu filho. Como é que isso me
mudou? Olho para os desconhecidos na sala de espera com os quais me sinto
inexplicavelmente ligada, a mãe que reza em silêncio e a quem me liguei com um
simples olhar, o mundo desconhecido do qual sou agora um habitante cúmplice mas
ferozmente leal. Estes sentimentos são bênçãos. Bênçãos estranhas e terríveis,
mas belíssimas. Será que eu teria estas coisas se minha fé não tivesse sido
testada? Teriam os meus olhos ficado assim tão abertos? Seria capaz de sentir
oceanos de ternura e compaixão feroz?
... o espírito humano, a menos que
seja auxiliado pelo espírito de fé, não pode conhecer os mistérios divinos e as
realidades celestiais. É como um espelho que, embora claro, brilhante e polido,
ainda precisa de luz. Só quando um raio de sol cai sobre ele, é que se pode
descobrir os mistérios divinos. (‘Abdu’l-Bahá, Some Answered Questions, newly
revised edition, p. 242)
Então, se o
"primeiro sinal de fé é o amor" e se o sinal do amor é
"paciência sob as Minhas provações", vou começar por aí.
Olho para o
meu relógio. Ainda me dói o coração. Talvez doa sempre durante estes dias.
Talvez seja suposto doer. As dores dão-me a conhecer os "mistérios
divinos" e as "realidades celestiais" - com tamanho realismo que
percebemos que é fácil pensar que temos fé quando nunca fomos desafiados.
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Texto Original: A Question Of Faith
(www.bahaiteachings.org)
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Brittany
Betts formou-se na Universidade de Oxford e é CEO da The International
Educator. Cresceu em Portugal e pertence à quarta geração de Bahá’ís na sua
família. Actualmente vive na Califórnia (EUA).
3 comentários:
Obrigado, Brittany, de todo o coração, por escrever este testemunho tão franco, tão honesto e inspirador. Precisamos disso.
Grato por partilhar, Brittany. Cori
Obrigada. FÉ.
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