sábado, 17 de março de 2018

Pode uma religião manter-se unida?

Por David Langness.


Os Bahá'ís têm - todos eles - ideias e opiniões semelhantes?

Quando se começa a investigar a Fé Bahá’í, indo às primeiras reuniões Bahá'ís, participando em cursos sobre a sua história e princípios, lendo artigos de notícias sobre as suas actividades ou pesquisando sites como BahaiTeachings.org, pode-se ficar com a impressão inicial que a resposta a esta pergunta é sim.

No fundo, a Fé Bahá’í - uma religião global com crentes de quase toda as culturas e origens - não tem seitas, denominações ou cismas. É um sistema de crenças unificado em qualquer parte do mundo; isso significa que as comunidades Bahá’ís na Índia, no Indiana (EUA) e numa reserva de índios têm uma espiritualidade com mais semelhanças do que diferenças. Um conjunto único de princípios, transmitidos directamente por Bahá’u’lláh e 'Abdu'l-Bahá, serve como a luz orientadora da religião Bahá'í. Um corpo eleito democraticamente - a Casa Universal da Justiça, com nove membros - existe para responder, mediar e resolver problemas entre os Bahá'ís. Segundo esta perspectiva, parece que os Bahá'ís devem ter ideias, pontos de vista e opiniões semelhantes.

Mas não é assim. Os Bahá'ís têm uma vasta gama de pontos de vista - porque não têm as mesmas experiências, culturas, origens ou educações, não têm apenas uma opinião.

Na verdade, essa é a definição clássica de um culto fundamentalista: um grupo altamente manipulador que controla rigorosamente as ideias, os pensamentos e as opiniões dos seus membros, geralmente com um líder carismático que insiste em impor uma ortodoxia rígida que obriga à perda de identidade pessoal.

Assim, por definição, a Fé Bahá’í é exactamente o oposto de um culto: um grupo global de pessoas amplamente diversificado, sem qualquer clero ou liderança carismática dominante, que encoraja verdadeiramente a investigação independente da verdade e o surgimento de opiniões e pontos de vista distintos.

Normalmente, seria de esperar que uma religião com estas características estivesse agora fragmentada numa multiplicidade de seitas e cismas, após quase duzentos anos de existência - mas isso não aconteceu. A religião que ensina a unidade manteve-se unida. Porquê?

Sede da Casa Universal de Justiça
A Fé Bahá’í - global na natureza, múltipla na realidade, extremamente diversificada nos seus membros - apresenta à humanidade um conjunto único de princípios globais. Primeiramente promulgada por Bahá’u’lláh, o profeta e fundador da Fé; expandida pelo Seu filho e exemplo Bahá’í, ‘Abdu’l-Bahá; interpretada e explicada pelo Guardião da Fé Bahá’í, Shoghi Effendi; e depois protegida e promovida pela Casa Universal de Justiça democraticamente eleita; estes princípios permaneceram como um conjunto unitário de ensinamentos durante quase dois séculos.

A Aliança Bahá’í, que estabelece esse processo ordenado e sequencial da transferência de autoridade, permitiu que os Bahá’ís permanecessem juntos e com a mesma Fé.

Embora, em algumas situações, tenham sido feitas tentativas por pequenos grupos de pessoas para se separarem do corpo principal da Fé Bahá'í, todos os cismas sectários fracassaram. Isso significa que, pela primeira vez na história humana, uma religião mundial conseguiu manter a sua coerência, unidade e totalidade originais, não apenas durante o seu primeiro século, mas também no segundo.

Quem estudar a história das anteriores religiões mundiais, perceberá que uma unidade tão prolongada e sustentada é altamente incomum.

A maioria das religiões dividiu-se rapidamente em diferentes denominações rivais, cismas e seitas após a morte dos seus fundadores. A unidade Cristã, por exemplo, começou a fragmentar-se durante o primeiro século. Mais tarde, o Catolicismo e a Igreja Ortodoxa Oriental dividiram os Cristãos em duas facções durante o Grande Cisma; e posteriormente o Protestantismo acelerou o processo. Hoje, a maioria dos historiadores religiosos identifica seis grandes ramos no Cristianismo: Católicos, Protestantes, igrejas Ortodoxas (do leste), Anglicanos, igrejas Ortodoxas orientais e a Igreja Assíria do Oriente. Segundo o Center for the Study of Global Christianity (Centro para o Estudo do Cristianismo Global), estes seis ramos dividiram-se em cerca 41.000 denominações e seitas cristãs no mundo de hoje.

No Islão, as denominações sunitas e xiitas formaram-se logo após o falecimento de Maomé, e hoje existem muitas seitas diferentes no Islão, apesar da advertência de Maomé no Alcorão: "...não se dividam entre vós". No Hinduísmo e no Budismo, existem tantas seitas e crenças que as mensagens originais de Krishna e Buda nem sempre são reconhecíveis em todas elas. O Judaísmo, geralmente visto como constituído por três denominações muito distintas - ortodoxos, conservadores e reformadores - tem muitas sub-denominações em cada uma destas categorias. Nenhuma grande religião mundial, excepto que a Fé Bahá’í permaneceu como uma única religião.

Isto levanta questões complicadas: como é que uma religião global pode permanecer unida? Se as pessoas vêm de diferentes culturas, contextos e civilizações e, inevitavelmente, têm opiniões e pontos de vista muito diferentes, que perspectiva comum ou conjunto de leis e princípios podem possivelmente mantê-las juntas? Num mundo onde a religião geralmente é sinónimo de lutas ideológicas e sectárias, porque é que a Fé Bahá’í conseguiu proteger sua unidade?

Nos próximos artigos vamos explorar estes temas importantes e perceber como é que os Bahá’ís, no panteão das religiões mundiais, mantiveram a sua unidade intacta.

-----------------------------
Texto original: Can Religion Stay Unified? (www.bahaiteachings.org)

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

Sem comentários: