sábado, 9 de maio de 2020

Um livro sobre a Epístola da Paciência

Por Christopher Buck e Foad Seddigh.


Nesta entrevista, Christopher Buck fala com o Dr. Foad Seddigh, o autor de um novo livro sobre a maravilhosa virtude da paciência.

P: Dr Seddigh, você escreveu um livro sobre a Epístola da Paciência, revelada por Bahá'u'lláh. O que o inspirou a realizar este projecto?

R: Este trabalho de Bahá'u'lláh é considerado como uma das Suas mais importantes epístolas. Bahá'u'lláh revelou a Epistola da Paciência num momento crítico, na véspera do Seu exílio de Bagdade para Istanbul. Esta saída de Bagdade assinala um novo capítulo na história da missão de Bahá'u'lláh. Este texto notável – revelado no mesmo dia em que Bahá'u'lláh declarou a Sua missão de forma aberta, ainda que em privado – é o único registo que temos das palavras exactas de Bahá'u'lláh nessa importante ocasião histórica, em 22 de Abril de 1863, o dia em que nasceu a Fé Bahá'í.

Todos estes ensinamentos, expressos de uma forma tão maravilhosa, inspiraram-me a estudar a Epístola da Paciência com o objectivo de a entender de forma mais profunda. Assim, fui preparando extensos apontamentos durante muito tempo. E por fim, tive a inspiração de me lançar num projecto de escrever este livro.

P: No Islão clássico existem os 99 “Maravilhosos Nomes de Deus”. O 99º nome de Deus, numa lista, é “o Paciente”. À luz disto, diria que “paciência é um atributo de Deus?

R: Os estudiosos Muçulmanos concordam com o número dos “Maravilhosos Nomes de Deus” – apesar dos atributos de Deus serem incontáveis. Nem todos aparecem no Alcorão, que menciona 85 destes nomes. Por exemplo: “A Deus pertencem os Nomes Mais Maravilhosos; assim, chama-O por eles” (Alcorão 7:180). Bahá'u'lláh refere os “Mais Maravilhosos Nomes” de Deus em dois parágrafos do Livro Mais Sagrado.

No entanto, existe algum debate sobre se “o Paciente” (as-Sabur, ou as-Sabir) faz parte dos 99 “Maravilhosos Nomes de Deus”. Em resumo, “Paciência” é um atributo de Deus, que se manifesta na natureza e no carácter dos Mensageiros de Deus.

P: É possível transformar a perfeição divina da “Paciência” em acções bondosas?

R: Evidentemente! Pode acontecer quando temos um desejo no coração de abarcar a perfeição divina da “Paciência” e quando, simultaneamente, fazemos um esforço concertado para a alcançar e para a incluir nas nossas acções e processos de decisão diários. Para o mundo beneficiar com a nossa paciência, necessitamos de trazê-la para a linha da frente e fazer esforços diários para a exemplificar nas nossas acções diárias.

P: Na Epístola da Paciência, o que é que Bahá'u'lláh ensina sobre a virtude da paciência?

R: Bahá'u'lláh dedica um quinto desta epístola fascinante a explicar a virtude da paciência. Em primeiro lugar, Ele apela aos crentes para que entrem na Cidade da Paciência, que tradicionalmente significa uma cidade fortificada, um local de protecção e segurança. Por outras palavras, quando se está nesse local, está-se protegido contra elementos indesejáveis. Neste contexto, a “Cidade da Paciência” é uma metáfora. Significa apenas que quando adquirimos a virtude da paciência, ficamos num ambiente espiritualmente seguro.

Depois, e com muito detalhe, Bahá'u'lláh descreve a vida do profeta Job, que demonstrou essa virtude de uma tal maneira que o nome de Job se tornou sinónimo de paciência. Bahá'u'lláh prossegue explicando os vários tipos de paciência e por fim afirma que a recompensa prometida por Deus aos que se adornam com o ornamento da paciência é ilimitada:
Além disso, sabei que por todas as boas acções é decretada uma recompensa limitada no Livro de Deus, com excepção da paciência. Este é a observação de Deus para Maomé, o Apóstolo de Deus: “Aqueles que perseveram pacientemente, em verdade, receberão uma recompensa imensurável.” (Bahá'u'lláh, Tablet of Patience, tradução provisória de Foad Seddigh)
P: Depois de estudar esta epístola, tem algum conselho para uma pessoa comum, sobre como melhorar e aprofundar a nossa capacidade de paciência – tanto no desenvolvimento do nosso carácter como para benefício dos outros?

R: Podemos reflectir aquilo que Bahá'u'lláh revelou na Epistola da Paciência e meditar profundamente neste atributo. Devemos estar constantemente conscientes sobre a paciência e aumentar a nossa compreensão sobre esta virtude. Tal como em todas as coisas, devemos trabalhar para melhorar, pouco a pouco, a nossa prática diária da paciência.

Nada se alcança imediatamente - em especial, a paciência. Precisamos de a trabalhar até a dominarmos. E devemos, em especial, seleccionar alguns aspectos da paciência que nos são mais pertinentes. E aqui está a ironia: é preciso paciência para aprofundar a nossa capacidade para ter cada vez mais paciência!

Por exemplo, nas nossas interacções diárias com amigos, vizinhos e colegas, podemos ficar impacientes ou reagir impulsivamente perante actos em situações desagradáveis de diversos graus. A virtude da paciência ajuda-nos a dar a resposta e atitude certas nessas situações. Ajuda-nos a ter a reacção adequada e ensina-nos a não reagir com base em impulsos, mas antes, a reflectir sobre a situação e depois a agir com sabedoria.

A paciência tem muitas facetas, dimensões e ramificações: a paciência no caminho de Deus e em suportar tribulações; paciência nas acções que devemos tomar e cujo resultado é incerto; paciência em relação aos nossos objectivos e ambições a longo-prazo; paciência no nosso relacionamento diário com os outros. Esta é apenas uma pequena lista de alguns aspectos da paciência. Cada um deles é necessário para desenvolver o nosso carácter e capacidade espiritual.

Vou aprofundar brevemente apenas um destes: ser pacientes com nós próprios. Cada um de nós vem a este mundo com diferentes qualidades e capacidades, que não são uma escolha pessoal. Por vezes, podemos sentir que devíamos ter recebido mais. Por exemplo, uma pessoa pode pensar que podia ter uma memória melhor, ser mais alto, etc. No entanto, nós não temos controlo sobre estas coisas. Na verdade, são-nos atribuídas, como se fossem uma oferta.

Devemos estar gratos por qualquer oferta que Deus nos faz – isso também faz parte da paciência. Devemos fazer o melhor uso possível daquilo que nos é oferecido. Se sentimos que estamos desfavorecidos, devemos olhar à nossa volta; há sempre gente ainda mais desfavorecida. Por isso, é necessária paciência. Devemos ser pacientes com nós próprios.

A virtude da paciência permite-nos olhar para a vida de uma perspectiva positiva, feliz, espiritualmente vibrante e consciente. Neste caso, cultivar a paciência depende grandemente da nossa confiança em Deus e da nossa submissão e aceitação da vontade de Deus.

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Texto original: New Teachings on the Virtue of Patience (www.bahaiteachings.org)

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Christopher Buck (PhD, JD), advogado e investigador independente, é autor de vários livros, incluindo God & Apple Pie (2015), Religious Myths and Visions of America (2009), Alain Locke: Faith and Philosophy (2005), Paradise e Paradigm (1999), Symbol and Secret (1995/2004), Religious Celebrations (co-autor, 2011), e também contribuíu para diversos capítulos de livros como ‘Abdu’l-Bahá’s Journey West: The Course of Human Solidarity (2013), American Writers (2010 e 2004), The Islamic World (2008), The Blackwell Companion to the Qur’an (2006). Ver christopherbuck.com e bahai-library.com/Buck.

Foad Seddigh é doutorado em engenharia aeronáutica pela Universidade de Oregon (Estados Unidos). Foi professor de engenharia mecânica em várias universidades durante várias décadas.

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