sábado, 13 de março de 2021

O que fazer quando a nossa democracia vacila?

Por V. M. Gopaul.

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Hoje, podemos sentir as pressões de conflitos irrompendo por todos os lados. Como podemos impedir que as forças da corrupção, da injustiça e da desunião destruam a nossa democracia?

Embora reconheçam que a democracia não é necessariamente um sistema ideal, as Escrituras Bahá’ís elogiam-na fortemente como sistema de governação, afirmando: 

Sob um governo autocrático, as opiniões dos homens não são livres e o desenvolvimento é sufocado, enquanto que na democracia, porque o pensamento e o discurso não são reprimidos, testemunha-se o maior progresso. (‘Abdu’l-Bahá, The Promulgation of Universal Peace, p. 197.)

Também afirmam que a democracia “será capaz de a concretizar [a paz mundial] e o estandarte da concórdia internacional será desfraldado.

Durante anos, não participei em eleições. Olhando para trás, eu não acompanhava as questões cívicas a sério. Além disso, a apatia pode ter contribuído para o não cumprimento do meu dever cívico. Vivo no Canadá e, na última década, prestei muita atenção às políticas e ao rumo que gostaria que o país seguisse. E estando ciente do princípio Bahá’í de examinar o carácter de um candidato, e não considerar a política partidária, agora participo das eleições nacionais, provinciais e municipais.

A democracia como sistema de governação apareceu pela primeira vez no século V a.C. nas cidades-estado gregas, especialmente em Atenas; significa "governo do povo", uma ideia que contrasta com o governo da aristocracia. A democracia expandiu-se após a Segunda Guerra Mundial. Em 1950, havia apenas um punhado de países democráticos, mas em 2007 existiam 123 países com democracias eleitorais. Embora a democracia liberal tenha começado nos países ocidentais, ela tem-se espalhado pelo mundo. Hoje, a democracia está profundamente enraizada tanto nas ilhas Maurício, onde nasci, como no Canadá, onde moro.

Hoje, as eleições livres e justas tornaram-se a base da vida moderna - tanto que, muitas vezes as consideramos garantidas. Embora nossas democracias estejam longe de ser perfeitas, e a injustiça e a corrupção ainda prevaleçam em muitos sistemas eleitorais, há um foco maior nos cidadãos que participam activamente das escolhas para o seu país, protegendo os direitos humanos e tornando esses direitos iguais para todos.

Mas a democracia é bem-sucedida através do funcionamento correcto das instituições, como o sistema judicial, a polícia e os direitos humanos - como a liberdade de expressão, igualdade racial e de género, liberdade de religião, de casamento, de educação e outras. Esses edifícios da modernidade são cruciais e a sua relevância não pode ser subestimada. Os activistas sociais em todo o mundo têm dedicado as suas vidas e os seus recursos à preservação da integridade desses pilares.

Os alarmes soam quando os políticos tentam destruir essas instituições para ganhar, ou manter, o poder. Algumas pessoas declaram guerra aos males da sociedade prometendo proteger os direitos dos trabalhadores, cobrar impostos às grandes empresas, garantir a segurança ou ajudar os pobres - mas muitas vezes, depois de obter a simpatia da maioria, surgem abusos. Segundo a Freedom House, “a partir de 2005, houve onze anos consecutivos em que os declínios nos direitos políticos e liberdades civis em todo o mundo superaram as melhorias, à medida que forças políticas populistas e nacionalistas ganharam terreno em toda a parte”.

Temos de reconhecer que as instituições sozinhas não podem construir democracias. São os valores fortes gravados na consciência das pessoas que fazem a verdadeira democracia acontecer.

O que protege a integridade destas instituições são os valores consagrados nas constituições de cada país. A lei fundamental de cada país é uma construção única que reflecte rumo nacional, histórico e cultural de cada país. Mas, de uma forma geral, as pessoas de todos os países têm valores e desejos comuns para si e para as suas famílias.

O sucesso da modernidade baseia-se em certos conceitos, como o respeito pelo Estado de Direito e pelos processos institucionais. Bahá’u’lláh, o fundador e profeta da Fé Bahá’í, escreveu a carta régia para instituições administrativas que Shoghi Effendi, o Guardião da Fé Bahá’í, descreveu como "instituições necessárias apenas através das quais a integridade e unidade de Sua fé pode ser salvaguardada.”

Bahá’u’lláh decretou que os membros destas instituições fossem eleitos democraticamente e definiu muitas regras e directrizes rigorosas sobre como deveriam servir os assuntos de uma comunidade. Desta forma, a comunidade mais ampla pode vir a confiar e contar com as suas instituições para proteger os seus interesses, sabendo que as instituições são guiadas por valores espirituais. Então, afirmou Ele, as pessoas deveriam ter uma atitude de “lealdade, honestidade e veracidade” para com essas instituições.

Quando se estabelece a confiança nas autoridades, os resultados - sejam eleitorais ou judiciais - são respeitados e todos acatam as decisões, mesmo que parte da população não concorde. Esse tipo de respeito mostra a maturidade de um país. Apesar de antigamente as disputas pelo poder terem provocado guerras longas e sangrentas, estamos a começar a encontrar maneiras de resolver os conflitos. Apesar de estar longe de ser perfeito, isto é um sinal de uma nova consciência.

A Fé Bahá'í enfatiza que o funcionamento adequado das instituições, seja a nível local ou global, é essencial para alcançar o nosso glorioso futuro colectivo. As escrituras Bahá'ís afirmam que:

A humanidade deve manter-se no estado de companheirismo e amor, seguindo as instituições de Deus e afastando-se dos impulsos satânicos, pois as dádivas divinas trazem unidade e acordo, enquanto as tendências satânicas induzem ao ódio e à guerra. (‘Abdu’l-Bahá, Bahá’í World Faith, p.233)

Os “impulsos satânicos” referidos nesta frase referem-se aos desejos egoístas e oportunistas das pessoas que frequentemente levam ao sofrimento de outros.

Para fazer o meu papel, salvar o mundo dos oportunistas e defender o ideal de Bahá'u'lláh de "lealdade, honestidade e veracidade", fiz duas coisas: acabei com a minha apatia e votei no candidato que acreditava ser o melhor apto para o cargo. Nos últimos cinco anos, votei em todas as eleições municipais, provinciais e federais. Não pertenço a nenhum partido político; não voto em candidatos devido aos seus partidos políticos, mas sim devido ao seu carácter.

Quando se trata da unidade da humanidade, é essencial construir as instituições certas. Inclusão, harmonia, justiça e prosperidade espalhar-se-ão lenta, mas inevitavelmente, pelo mundo.

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Texto original: What Do We Do When Our Democracy Falters? (www.bahaiteachings.org)


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Gopaul é especialista em software e bases de dados, tendo escrito vários livros para profissionais de TI. É casado, pai de duas crianças, e vive no Canadá. Para mais informação ver: www.vmgopaul.com.

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