sábado, 10 de julho de 2021

E se todos tivéssemos um Pai Carinhoso e Amoroso

Por Anne Gordon Perry.



Pais dedicados e amorosos podem ser uma força estabilizadora, capaz de encorajar, proteger, educar, apoiar, acarinhar e dar atenção, e simultaneamente serem exemplos e mentores. E se todos tivéssemos um pai exemplar com essas características?

Os ensinamentos Bahá’ís apresentam um exemplo – ‘Abdu’l-Bahá, o filho e sucessor de Bahá’u’lláh. Apesar de não ser um Profeta, ‘Abdu’l-Bahá tem uma posição única para os Bahá’ís, conforme explicado pela Casa Universal de Justiça na introdução ao “Livro Mais Sagrado” de Bahá’u’lláh:

Esta figura única é simultaneamente Exemplo de um padrão de vida ensinado pelo Seu Pai, intérprete autorizado e divinamente inspirado dos Seus Ensinamentos, e Centro da Aliança que o Fundador da Fé Bahá’ís fez com todos os que O reconheceram.

A Fé Bahá’í pede aos seus seguidores que se tornem cidadãos do mundo, reconheçam e ajam conscientes da unicidade da humanidade, e ofereçam amor e compaixão a todas as pessoas. ‘Abdu’l-Bahá notabilizou-se neste Seu papel como exemplo destes sublimes ensinamentos, conforme indicam claramente diversas narrativas de pessoas que O conheceram.

Wellesca Allen-Dyar ("Aseyeh"), que se tornou Bahá’í em 1901 e fez a sua peregrinação a Akka seis anos mais tarde, descreveu que ‘Abdu'l-Bahá:

... era capaz de ser para nós um pai afectuoso, um companheiro e um amigo, e podíamos conviver e socializar porque não estávamos continuamente a pedir-Lhe que respondesse a perguntas; quando isso acontecia, Ele assumia imediatamente outra atitude e… podíamos sentir a Sua dignidade, a Sua grandeza, a profundidade ilimitada da Sua sabedoria. Ele, de facto, é uma “fonte de água viva que leva à vida eterna”, e o conhecimento e sabedoria saiam dos Seus lábios tal como a água sai de uma fonte, dando vida a todo o coração sedento...”

Myron Phelps, um advogado e escritor de Nova Iorque, viajou para Akka em 1902 e descreveu como ‘Abdu’l-Bahá, conhecido por muitos como “o Mestre”, Se relacionava com outras pessoas:

“Todas as pessoas o conhecem e amam – os ricos e os pobres, os novos e os velhos – até os bebés pulam nos braços das mães. Se ele sabe que alguém está doente na cidade – Muçulmano ou Cristão, ou de qualquer outra seita, isso não importa – ele fica cada dia junto à sua cama, ou envia um mensageiro de confiança. Se é necessário um médico e o paciente é pobre, ele chama ou envia um, e também a medicação necessária. Se ele sabe que um tecto furado ou uma janela partida são uma ameaça à saúde, ele chama um trabalhador e fica à espera de que o problema seja concertado. Se alguém está em apuros – se um filho ou irmão vai para a prisão, ou se alguém é ameaçado pela lei, ou se fica em dificuldades demasiado pesadas – é ao Mestre que vai imediatamente pedir conselho ou ajuda. Na verdade, para conselhos todos vêm, ricos e pobres. Ele é uma espécie de pai de todas as pessoas…”

Juliet Thompson, uma pintora americana, tornou-se Bahá’í durante uma estadia em Paris, em 1901. Encontrou-se com ‘Abdu’l-Bahá em 1909 na Terra Santa e mais tarde na Europa e nos Estados Unidos. Escreveu o seguinte:

Ele dá – dá – dá! O Seu amor nunca parece satisfeito com o que dá. Infatigavelmente, ele dá o seu espírito e coração – tal como um pai dá coisas materiais – pequenas recordações ou flores, símbolos mais carinhosos.”

Também descreveu como Lee McClung, então Tesoureiro dos Estados Unidos, após o seu encontro com o Mestre procurando palavras para descrevê-lo, e tendo dito: “Senti como se estivesse na presença de um grande Profeta – Isaías, Elias…não, não é isso. A presença de Cristo – não. Senti como se estivesse na presença do meu Pai Divino.

Jean LeFranc, um jornalista francês do jornal Le Temps, encontrou-se com ‘Abdu’l-Bahá em Paris e escreveu:

“O rosto venerável de ‘Abdu’l-Bahá, cujos olhos brilham, irradia inteligência e bondade. Ele é paternal, afectuoso e simples; ele inspira confiança e respeito. O seu poder divino vem, sem dúvida, de saber como amar as pessoas e ser amado por elas.”

Lady Blomfield, uma das primeiras Bahá’ís britânicas, recebeu ‘Abdu’l-Bahá como hóspede durante as Suas visitas a Londres. Neste relato, ela descreve um evento ocorrido em Paris:

“Num bairro muito pobre de Paris, num domingo de manhã, grupos de homens e mulheres começavam a provocar desacatos. Destacava-se entre eles um homem grande que tinha na mão um grande pedaço de pão, e gritava, gesticulava e dançava. Saindo do Salão da Missão onde tinha falado para uma congregação muito pobre a convite do seu Pastor, ‘Abdu’l-Bahá entrou no meio dessa multidão. O homem desordeiro que segurava o pão, ao vê-lo parou de repente. Depois prosseguiu… gritando: “Deixem passar, deixem passar! Ele é o meu Pai, deixem passar”. O Mestre passou pelo meio da multidão, que ficara silenciosa e o cumprimentava respeitosamente. “Muito obrigado, meus queridos amigos, muito obrigado”, disse sorrindo para eles. Os pobres eram sempre os seus amigos especialmente queridos. Nunca ficava mais feliz do que quando estava rodeado por eles, os que tinham coração humilde!”

Frederick Dean, Budista e jornalista que se encontrou com ‘Abdu’l-Bahá em várias ocasiões em Nova Iorque, era o repórter do “The Independent” e da “The Weekly Review” com a função de acompanhar o evento na igreja onde ‘Abdu’l-Bahá ia falar:

“Conheci o professor pela primeira vez numa igreja da zona residencial. Tinha sido enviado pelo meu jornal para fazer uma reportagem sobre o sermão. O orador era tão surpreendentemente parecido com o meu pai que, imediatamente após a cerimónia, entrei na antecâmara e falei-lhe dessa notável semelhança. Tranquilamente, ele respondeu: “Eu sou o teu pai e tu és o meu filho. Vem jantar comigo.” Outro compromisso impediu [o jantar], mas perguntei se podia tomar pequeno almoço com ele na manhã seguinte. “Vem”, disse ele. E fui; e após aquele primeiro encontro seguiram-se outros. Caminhámos e falámos no seu jardim. Falei-lhe da sua característica particular que me atraía devido à minha própria perspectiva de vida: que eu vinha de uma família do sudeste asiático e que eu era Budista – um Budista-Cristão. “Também eu”, respondeu o professor. “Eu também sou Confucionista-Cristão e Brâmane-Cristão; Judeu e Muçulmano-Cristão. Sou irmão de todos os que amam a verdade – a verdade em qualquer traje que desejem vestir”… 

No último dia em que o vi, ele deu-me uma rosa – tinha sempre rosas recém-colhidas na sua mesa… Quando me deixou à porta, disse-me: “… Pensa em mim como o teu pai carinhoso e não como algo divino que deve ser adorado…” Quem se encontrou com ele levou consigo algo indescritível que torna os prazeres da vida mais brilhantes.

John E. Esslemont, um médico escocês, encontrou-se com o Mestre em Haifa, em Novembro de 1919 e foi seu convidado durante dois meses e meio. Ele descreveu como, apesar de ter quase setenta e seis anos de idade, ‘Abdu’l-Bahá ainda era “notavelmente vigoroso”:

Os Seus serviços estavam sempre à disposição daqueles que mais necessitavam. A Sua paciência infalível, delicadeza, bondade e tacto tornavam a Sua presença uma bênção. Era Seu hábito passar grande parte da noite em oração e meditação. Desde manhã cedo até à noite, com excepção de uma breve sesta após o almoço, Ele estava energicamente ocupado a ler e a responder a cartas… e tratando dos múltiplos afazeres da casa…

À tarde, Ele tinha usualmente um momento de descontração na forma de caminhada ou passeio, mas mesmo aí Ele costumava ir acompanhado por uma, duas pessoas, ou por um grupo… com quem conversava… ou se tivesse oportunidade… visitava e ajudava alguns pobres. Após o Seu regresso, Ele convidava os amigos para a usual reunião da noite… Ele ficava encantado por reunir pessoas de várias raças, cores, nações e religiões em unidade e amizade cordial ao redor da mesa hospitaleira. Ele era, de facto, um pai amoroso, não só para a comunidade em Haifa, mas para a comunidade Bahá’í em todo o mundo.”

(…)

Thorton Chase, considerado o primeiro Bahá’í americano, encontrou-se com ‘Abdu’l-Bahá durante a sua peregrinação a Akká em 1907. Quando ‘Abdu’l-Bahá foi à Califórnia em 1912, Chase morreu antes da Sua chegada. Mas ‘Abdu’l-Bahá fez uma visita especial ao seu túmulo. Chase tinha escrito as seguintes palavras sobre o Mestre: 

Encontrei em ‘Abdu’l-Bahá um homem forte e poderoso… tão livre e imperturbado quanto um pai com a sua família ou um rapaz com os seus amigos. No entanto, cada movimento – os seus passos, as suas saudações, o sentar-se e levantar-se – eram a eloquência do poder, pleno de dignidade, liberdade e capacidade… ‘Abdu’l-Bahá é um homem distinto, de pensamento amplo e universal, estando acima do mundo e olhando-o na sua fraqueza e pobreza com um amor ilimitado e um desejo intenso de o levantar da sua miséria, consciencializá-lo das ricas dádivas de Deus, que tão abundantemente são oferecidas neste tempo maravilhoso, afastar as diferenças, juntar todos os homens, todos os povos, todas as religiões numa verdadeira humanidade e religião… Eles ergue-se, com braços abertos, o Mestre da Festa, chamando com uma voz clara e forte toda a humanidade: “Venham! Venham! Venham! Agora é o tempo! Agora é o Tempo aceite! Venham e bebam desta Água doce que jorra torrencialmente em todas as partes do mundo!” E, a cada peregrino esfomeado que chega… ele abraça-o junto ao seu peito com tanta sinceridade e entusiasmo de amor que preocupações mesquinhas, pensamentos e ambições mundanas desaparecem, e a pessoa fica em paz e alegria porque chegou ao lar e ali encontrou amor… Deseja-se que o abraço não termine, pois é jubilante e confortador. Na verdade, penso que nunca termina. Abre a porta do amor que nunca será fechada. O lar do amor está ali.

Sheikh Younis el-Khatib era um conhecido poeta e orador Muçulmano, e discursou no funeral de ‘Abdu’l-Bahá e na reunião de homenagem realizada 40 anos após o seu falecimento:

Ai de mim! Nesta tribulação, não há coração, apenas dores de angústia; todos os olhos estão cheios de lágrimas. Ai dos pobres, pois a bondade afastou-se deles, ai dos órfãos, pois o seu pai amoroso já não está com eles! (…) Basta dizer que ele deixou em cada coração a mais profunda impressão, em cada língua os mais maravilhosos elogios. E aquele que deixa uma recordação tão adorável, tão imperecível, de facto, não está morto.

Misteriosamente, a presença de ‘Abdu’l-Bahá no mundo ainda parece bastante tangível - ele é alguém com quem todos nos podemos relacionar, e Ele prometeu que sempre estaria connosco. Na verdade, Ele disse algo muito surpreendente: "Se os crentes ... estabelecerem, de forma adequada, união e harmonia em espírito, língua, coração e corpo, de repente eles encontrarão Abdu'l-Bahá entre eles."

Neste sentido, todos podemos afirmar que ‘Abdu’l-Bahá é uma espécie de figura paterna universal – sempre presente, sempre desejando elevar-nos, sempre a chamar-nos para um plano espiritual mais elevado.

NOTA: alguns dos relatos aqui partilhados foram extraídos da nova compilação de Robert Weinberg, Ambassador to Humanity: A Selection of Testimonials and Tributes to Abdu’l-Baha.

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Texto original: What If We All Had a Kind, Loving Father? (www.bahaiteachings.org)


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Anne Gordon Perry é doutorada em Estudos Estéticos e lecciona Humanidades, no Art Institute of Dallas. Com seu marido, Tim Perry, ela criou um documentário intitulado Luminous Journey: Abdu'l-Baha in America, 1912. O filme segue as viagens de ‘Abdu'l-Baha, nos Estados Unidos e Canadá durante oito meses, mostrando como ele deu às pessoas um vislumbre de um mundo de paz, unidade racial e igualdade de gênero.

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