segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Livro “Religiões de Angola”, de Eduardo dos Santos (1969)

Recentemente num alfarrabista online reparei num livro intitulado “Religiões de Angola”, de Eduardo dos Santos. O livro foi publicado em Lisboa, em 1969, pela Junta de Investigações do Ultramar. Mas uma citação do texto de introdução chamou a minha atenção. Dizia: “Guardamos para o fim o estudo do bahá’ismo, não só por ser muito recente na Província mas também por se apresentar totalmente alheio à tradição, ao modo de ser e às preocupações, pelo menos por ora, dos Africanos”.

Como é óbvio, ao ver uma referência à Fé Bahá’í em Angola num livro de 1969, não hesitei em comprar o livro.

Trata-se de uma obra extensa (536 páginas) dedicado à história das diferentes religiões e organizações religiosas que se foram instalando no território angolano até ao final da década de 1960. Contem uma longa história do Catolicismo (170 pags), do Protestantismo [incluindo Evangélicos, Metodistas, Adventistas, Testemunhas de Jeová e diversas organizações americanas, inglesas e canadianas] (110 pags), das Religiões Arcaicas [teísmos, deísmos, totenismos, ancestrologias] (140 pags), dos Movimentos Sincréticos [tocoísmo, amicalismo, etc] (50 pags) e do “Baha’ismo” (15 pags). A introdução e a conclusão também contêm referências à Fé Bahá’í (por vezes com críticas subtis).

Para escrever o capítulo sobre a Fé Bahá’í, o autor parecer ter-se baseado essencialmente no livro “Bahá’u’lláh e a Nova Era”, apresentado uma descrição histórica onde destaca os aspectos que lhe pareceram mais relevantes. Percebe-se que o autor fez um esforço para ser objectivo, apesar de existirem pequenos erros pontuais. São citados vários textos de Shoghi Effendi e ‘Abdu’l-Bahá, onde naturalmente estão presentes as traduções brasileiras dos anos 1950/1960. Na descrição da história da Fé e nos ensinamentos Bahá’ís (referidos como “Princípios filosóficos” e “Moral”), o autor usa recorrentemente terminologia Bahá’í, ficando a parecer que não está a usar as suas próprias palavras, mas a transcrever textos de outros autores.

As conclusões (do capítulo Bahá’í e do livro como um todo) resumem a Fé Bahá’í como uma religião que ainda não amadureceu, tendo diversos ensinamentos estranhos e desajustados da realidade africana, insinuando a ingenuidade de alguns ensinamentos Bahá’ís e o possível perigo que podem representar no contexto político da época (ex: pan-africanismo), chegando mesmo a ser condescendente para com os africanos (o problema do alcoolismo).

Com todas as suas virtudes e defeitos, o livro é um reconhecimento da presença Bahá’í em Angola durante os tempos coloniais. Pela bibliografia indicada, percebe-se que o autor fez um significativo trabalho de investigação. Ali encontramos referências aos seguintes livros Bahá’ís:
  • Excertos da Última Vontade e Testamento de ‘Abdu’l-Bahá (1954)
  • Foundations of World Unity, ‘Abdu’l-Bahá (1936)
  • Kitab-i-Iqan, O Livro da Certeza (1957)
  • A Revelação Bahá’í [compilação de Escrituras Bahá’ís] (1957)
  • Seleção de Orações Bahá’ís (1958)
  • Bahá’u’lláh e a Nova Era (1962)
  • A Fé Mundial Bahá’í [do Esselmont, publicado em Lisboa] (1963)
Estas referências bibliográficas, levam-me a deduzir que o autor tenha tido algum contacto com os Bahá’ís em Angola ou mesmo em Lisboa (onde o livro foi publicado). Claro que se alguém tiver alguma informação sobre alguns contactos do autor com a comunidade Baha’i, por favor digam-me alguma coisa.

Encontrei alguma informação dispersa sobre o autor, Eduardo dos Santos. Consegui saber que nasceu em 1930, em Moimenta da Serra (Gouveia), foi funcionário administrativo em Angola, colaborador do Centro de Estudos de Etnologia Ultramarina e investigador da Junta de Investigações do Ultramar). Colaborou em várias revistas e jornais, publicou vários livros e artigos sobre diversas religiões de Angola. Os seus trabalhos mereceram destaque e diversos prémios. Este link apresenta uma biografia mais completa:

Para os interessados, coloquei um documento com todas as partes do livro que referem a Fé (introdução, capítulo Bahá’í, conclusões, bibliografia) neste link. Este documento também tem algumas anotações da minha autoria.

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