sexta-feira, 17 de julho de 2009

Iranianos em Portugal

Excertos do artigo Iranianos em Portugal: Ver o que se passa no Irão de longe e com espanto, do jornal Público, do passado dia 11 de Julho.
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Said Jalali, professor de Engenharia na Universidade do Minho, que é bahá'i (uma religião que nasceu no Irão, onde é perseguida), saiu do país antes da revolução de 1979 e é tão português como iraniano.

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Said Jalali está em Portugal desde 1972. Na comunidade bahá'i há o que, "nas universidades europeias, se chama hoje intercâmbio", explica Jalali na sala da sua casa em Braga, onde um tapete com inscrições em farsi é o único elemento denunciador da origem da família. Terminado o seu curso, de Engenharia Civil, e com a mulher, estudante de Economia, tinha pensado passar esse "ano de aventura" em África. "Era mais exótico." Mas entretanto "disseram-nos que ainda ninguém tinha ido a Portugal, e viemos para cá".

A ideia era ficar um ano, mas, logo após poucos meses, o jovem engenheiro arranjou trabalho, a sua mulher entrou na universidade, "a vida tornou-se fácil, vieram os filhos, gostámos e ficámos", resume.

Setúbal foi o primeiro destino e ainda hoje confessa torcer pelo Vitória - "também para contrariar os meus filhos, que são portistas ferrenhos". A vinda para Portugal, confessa, "foi mesmo sorte". Ou, acrescenta, de uma forma muito portuguesa: "É destino".

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Said Jalali saiu do Irão do Xá da Pérsia para o Portugal de Salazar, de uma ditadura para outra ditadura. Viveu a revolução portuguesa de 1974 em Setúbal ("era o único engenheiro numa fábrica em Tróia com três mil operários, todos colados ao rádio e a festejar") e a revolução de 1979 no Irão através da televisão e da família que continuava no país.

"Desde o início, pensei que a revolução [islâmica] não ia na direcção certa", confessa - os bahá'i, que já eram discriminados sob o Xá (Said Jalili não conseguiu um lugar de engenheiro na Câmara de Teerão por ser bahá'i), seriam ainda mais perseguidos na República Islâmica. Os bahá'i são vistos pelos xiitas como "hereges" porque o seu profeta, Baha'ullah, aparece na década de 1860, ou seja, é posterior a Maomé, e foi sepultado em Jaffa, onde hoje é Israel (um acaso da História que ainda hoje leva os fiéis iranianos a serem condenados por suspeita de "espionagem").

"Vocês aqui tiveram muita sorte, a revolução desde o início teve o rumo certo, da liberdade. Essa era a palavra-chave. Mas lá, mesmo de princípio, a palavra-chave não era essa. Depois começaram as perseguições: não só aos bahá'is, mas aos cristãos, até aos sunitas, que também são muçulmanos... E, passado pouco tempo, os políticos liberais que pensaram que iam ter o poder foram muito rapidamente, e completamente, afastados pelos religiosos."

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"Incrível, incrível, como as pessoas saíram à rua... Podem não ganhar, pode não acontecer mais nada, mas foi incrível ver as pessoas sair e dizer que não estão contentes com este sistema", diz o professor Said Jalali. "E são tudo pessoas que nasceram com este regime", espanta-se. "Estes jovens a única via que têm é a Internet. No nosso repositório [de artigos científicos da Universidade do Minho], o terceiro país que consulta mais os nossos artigos é o Irão. As pessoas lá estão ávidas de informação."

O modo como tem acompanhado a situação agora é muito diferente da altura em que seguiu a revolução ou a guerra Irão-Iraque: é mais distante, porque não tem pessoas próximas no Irão, mas, por outro lado, vê tudo na Internet. Lembra-se bem de alguns sítios. "Mas os nomes, claro, são completamente diferentes."

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