Em 29 de Junho de 1850, Vahid foi martirizado. Trata-se de uma das figuras mais conhecidas dos primeiros tempos das religiões Babi e Baha'i. Bahá'u'lláh referiu-se a ele como "essa figura única e incomparável do seu tempo". Para assinalar esta data, aqui fica um pequeno relato do que foram os seus encontros com o Báb.
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Quando em meados do século XIX, a religião do Báb se começou a espalhar pela Pérsia, vários elementos do clero e do governo quiseram averiguar a natureza daquele movimento. O Xá Muhammad (pai do Xá Nasiri'd-Din) pretendeu avaliar a veracidade das informações que ia recebendo; para esse fim pediu a uma das pessoas em quem mais confiava que se deslocasse a Shiraz e entrevistasse pessoalmente o Báb, e lhe desse uma opinião mais formulada sobre a natureza e propósitos daquela nova religião.
O homem escolhido para essa missão foi Siyyid Yahyay-i-Darabi[1], para os baha'is ficou conhecido como Vahid. O monarca confiava na imparcialidade, competência e visão espiritual deste homem; muitos dirigentes religiosos admiravam a sua eloquência e conhecimentos. Dizia-se que conhecia quase todo o Alcorão do cor e que tinha memorizado mais de trinta mil tradições islâmicas.
Em Shiraz, graças a um amigo que se tinha convertido à religião babi, Vahid conseguiu ser recebido várias vezes pelo Báb. No primeiro encontro, começou por falar durante mais de duas horas sobre temas metafísicos do Islão, excertos mais obscuros do Alcorão, e tradições e profecias misteriosas sobre os Imans[2]. O Báb foi ouvindo todas as suas questões e foi dando respostas breves e concisas; Vahid não conseguia evitar um crescendo de admiração com a lucidez das repostas. Os seus sentimentos iniciais de orgulho e superioridade intelectuais desvaneceram-se lentamente. Quando a entrevista terminou, confidenciou ao amigo: "Ele consegue responder com palavras simples às minhas questões e maiores perplexidades. Senti-me tão humilhado que só pensava em vir-me embora".
Ao iniciar-se a segunda entrevista, Vahid (que tinha uma memória prodigiosa) percebeu que se tinha esquecido de todas as questões que queria colocar ao Báb. Começou a falar de assuntos irrelevantes para o inquérito; mas imediatamente percebeu que o Báb estava a responder, com a mesma lucidez e simplicidade, às questões que ele se havia esquecido. Estranhando a coincidência, pediu para se retirar.
Para a terceira entrevista desejou que o Báb revelasse um comentário ao Sura de Kwathar[3]. Aquilo seria para ele uma derradeira prova da divindade do Báb. Pensou para si próprio que se Ele, sem ser solicitado, revelasse um tal comentário, e de forma diferente dos tradicionais comentadores do Alcorão, então isso seria um prova inequívoca do carácter divino da Sua missão; caso contrário recusaria reconhecer-Lhe esse estatuto.
Assim que entrou na presença d’Ele foi tomado por um invulgar sentimento de medo. O Báb levantou-Se segurou-lhe na mão e disse-lhe: "Procura em Mim o que quer que seja o desejo do teu coração. Eu to revelarei." E perguntou-lhe: "Se eu revelasse um comentário ao Sura de Kawthar, reconhecerias as Minhas palavras como nascidas do Espírito de Deus?" As lágrimas correram pelo rosto de Vahid e apenas conseguiu balbuciar umas palavras.
Pouco depois, o Báb pediu um estojo de canetas e papel e começou a revelar um comentário ao Sura de Kawthar. Vahid foi testemunha da revelação desse comentário; o Báb murmurava as palavras rapidamente e a caneta, em igual ritmo, registava essas palavras. E assim continuou até ao pôr do sol, quando o Báb deu o comentário por completo. Nessa ocasião pousou as canetas e pediu chá; pouco depois começou a ler o texto em voz alta.
O estilo das Suas palavras, o vigor dos argumentos e o tom poético do texto deixaram Vahid profundamente impressionado. Quando terminou a leitura, o Báb pediu a Vahid e a um secretário que procedessem à transcrição rigorosa do texto, validando as referências às tradições islâmicas citadas. Foi tarefa que os ocupou durante três dias.
Aqueles três encontros de Vahid com o fundador da religião babí alteraram o rumo da sua vida. Aceitou de forma plena e sincera a Mensagem do Báb e passou então a dedicar-se à divulgação da nova religião, viajando pela Pérsia. Vários milhares de pessoas aceitaram a Fé depois de ouvirem as suas palavras; alguns dos primeiros crentes desses tempos também tomaram conhecimento da nova religião graças aos seus esforços. No decorrer de uma dessas viagens chegou mesmo a encontrar-se com Bahá'u'lláh, em Teerão.
Vahid escreveu um relato detalhado dos seus encontros com o Báb e entregou-o ao camareiro do Xá, para que fosse apresentado ao monarca. Quando este soube da conversão de Vahid, comentou com o primeiro ministro: "Fomos informados que Siyyid Yahyay-i-Darabi se tornou babi. Se isto é verdade, então temos que deixar de menosprezar a Causa deste Siyyid[4]".
Os seus dias terminariam durante os massacres que se seguiram após o cerco ao forte de Khajih, em Nayriz. Vahid foi estrangulado e o seu cadáver, arrastado por um cavalo foi exibido pela cidade. Dez dias mais tarde, o próprio Báb seria martirizado em Tabriz.
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NOTAS
[1] - O termo Darabi indica a proveniência. Vahid nasceu em Darab.
[2] - Sucessores de Maomé
[3] - O capítulo mas pequeno do Alcorão
[4] – Refere-se ao Báb
5 comentários:
E depois aparecem estas mentes malsãs a vituperiarem a a Fé Bahá'í sem dela nada conhecerem.
No famoso Dicionário Larrouss - não aquela amostra de bolso do círculo de leitores -, diz que a Fé Bahá'í é uma Fé mágico-religiosa fundada pelo Báb e continuada por Bahá'u'lláh. Isto por causa das lendas que se formaram à volta deste episódio magnifico narrado por Nabil na sua obra "Os Rompedores da Alvorada".
Por vezes isso resulta de não sermos capazes de transmitir uma imagem correcta.
Lembro-me de uma fulana que disse que a única coisa que não compreendia era o "ritual do chá".
Cada vez que ia a um encontro com baha'is, havia sempre alguem a oferecer um chá...
Eh eh eh eh
Se esse dicionário contém uma coisa dessas acredito mais que tenha sido por incapacidade de algume transmitir correctamente os principios desta religião.
Tinha um amigo que dizia: "...então não é que o fulano ia a todas as reuniões e depois de ter bebido alguns dez litros de chá ainda perguntava onde tinha nascido a Fé bahá'i..."
Devia ser o correspondente do Larrousse na américa latina..., ou alentejano. A Ana que me perdoe, pois essa saboreou o chá logo à primeira e, ainda que lhe dissessem que ainda era cedo para se declarar, não quiz saber de mais nada e atirou-se de cabeça que nem um Zorro.
O que seria de todas as causas (sejam políticas ou religiosas) sem os seus heróis e os seus mártires?
Ontem não dei para consultar o Blog, mas já voltámos aos temas interessantes.
Mas quanto á questão do dicionário Larrouss (não sei se é francês), esse comentário representa a mediocridade de muitos dos jornalistas e académicos latinos.
Lembro-me de ter investigado enciclopédias britânicas, portuguesas, francesas e espanholas sobre o que era a Fé Bahá'í e a única a fazer um juízo objectivo e imparcial (que não quer dizer favorável) era a britânica. Digo isto porque quando consultei o que elas diziam sobre as Testemunhas de Jeová a situação repetiu-se os britânicos descrevem a realidade, nós entedemos por bem colocarmos as nossas opiniões pessoais (talvez por serem brilhantes...) no meio de uma descrição que pretende ser objectiva e sincera.
Desculpem o desabafo.
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