segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Nelson Évora: Teimosia de Ouro

Aqui fica um excerto do artigo publicado na revista Visão (28-Agosto-2008) intitulado «Teimosia de Ouro», onde se descreve a forma como João Ganço ajudou Nelson Évora a transformar-se num campeão olímpico. O artigo é de autoria dos jornalistas Rui Tavares Guedes e Patrícia Fonseca. Os sombreados a amarelo são da minha responsabilidade.
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O que tem o corpo do novo campeão olímpico (além do facto de ter sido eleito por um programa da televisão chinesa como o medalhado de ouro mais bonito dos Jogos)? João Ganço descreve-o: «É magro, tem uns músculos gémeos muito longilíneos, bem adaptados a uma prova como o triplo-salto, tem potência (que é a velocidade vezes a força), uma força reactiva poderosa e, acima de tudo, uma grande força mental»

FÉ SEM IGREJA

E, nesse campo, surpreendentemente João Ganço é o primeiro a negar que o "segredo" dessa força mental seja a fé Bahá'í que descobriu aos 25 anos e que Nélson abraçou na adolescência por sua influência.

«Isso foi uma coisa que apareceu naturalmente na minha vida. Mas é raríssimo eu e o Nélson falarmos um como outro sobre esse assunto», esclarece. Mesmo assim, admite haver ensinamentos daquela fé que os ajudam na dedicação ao treino e à competição: «Um princípio que nos orienta é o de tentar perseguir a excelência como ensina a fé Bahá'í. E é isso que fazemos um como outro: eu obrigo-o a evoluir e ele obriga-me a evoluir».

Mas insurge-se: «Não foi, ao contrário do que já li, a fé que ganhou a medalha de ouro. A fé é um elemento como o treino e a força mental. O título olímpico foi ganho, acima de tudo, através do talento do Nélson e de um plano bem pensado, em especial no último ano, em que ambos dedicámos tudo a este objectivo. Por exemplo, eu não cheguei a terminar o mestrado em Alto Rendimento e o Nélson deixou de ir às aulas de Publicidade e Marketing, na Escola Superior de Comunicação Social de Lisboa."

Mais: «O nosso objectivo era a medalha de ouro e o Nélson deixou de ganhar muito dinheiro por causa disso, ao recusar uma série de meetings. Só escolhemos as que interessavam para a nossa preparação».

Em Lisboa, Mário Mota Marques, 66 anos, director de Assuntos Externos da Comunidade Bahá'í em Portugal, ressalva, apesar de tudo, que «há uma força mental enorme em Nélson mas também uma pacificação, uma humildade calma» que se revelam decisivos nos momentos chave da competição. Mas, humilde como devem ser todos os bahá'is, diz que essa força interior poderia ser conquistada com «outra formação de origem espiritual e religiosa».

Em Portugal, existem cerca de 8 mil seguidores Bahá’í que acreditam existir um único Deus, que a humanidade é uma família e que há uma unidade fundamental entre todas as religiões. A comunidade Bahá'í tem muito orgulho em Nelson Évora como atleta mas, sobretudo, como homem: «Ele é a simplicidade e a modéstia em pessoa».

Quando João e Nélson regressarem "'faremos como quando ele foi campeão do mundo: o conselho nacional (nove membros) convida-os para uma oração e depois vamos todos almoçar». João Ganço comparecerá ao repasto com um look diferente: logo depois de ter ouvido o Hino no Ninho de Pássaro, cumpriu a aposta e imitou Nélson Évora: rapou o cabelo' tal como o atleta faz sempre, na manhã anterior a cada prova. E ambos continuam fiéis no objectivo que Nélson definiu, exemplarmente, logo após receber a medalha: «Temos que continuar a trabalhar para que este não seja o ponto mais alto da minha carreira.» Será isso a tal procura da excelência? Ou apenas mais um sinal de teimosia?

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