“Qual a maior necessidade do mundo da humanidade?”, perguntou um Bahá’í a ‘Abdu’l-Bahá em 1914, pouco antes de rebentar a Primeira Guerra Mundial.
Falando pouco antes do início do conflito mais mortífero da história da humanidade até então - onde morreriam 19 milhões de pessoas no espaço de quatro anos - ‘Abdu’l-Bahá disse:
Hoje no mundo da humanidade, o assunto mais importante é a questão da Paz Universal. A concretização deste princípio é a necessidade gritante deste tempo. As pessoas tornaram-se impacientes e descontentes. O mundo político de toda a nação civilizada tornou-se uma vasta arena para exibição de militarismo e exibição de espírito marcial. As mentes dos estadistas e dos ministros, de todo o governo, estão principalmente ocupadas com a questão da guerra, e nos municípios ecoa o apelo à guerra.
Os interesses pessoais estão na base de toda a guerra. Ganância, comércio, exploração, alargamento de fronteiras do reino, colonização, a preservação de direitos estabelecidos, protecção de vidas e interesses dos cidadãos, são alguns dos pretextos para lançar uma guerra. E tem sido provado pela experiência que os resultados da guerra são ruinosos, tanto para conquistadores como para conquistados. Os países são devastados, o património público é espezinhado, o comércio fica paralisado, os campos rubros com o sangue inocente e o progresso do mundo é retardado. Como pode uma pessoa corrigir um mal cometendo um mal ainda maior, derramando o sangue dos seus irmãos? A maior parte do rendimento de cada país é gasta na preparação de máquinas militares infernais, enchendo os arsenais com pólvora e munições, na construção de armas de disparo rápido, na construção de fortificações e aquartelamentos militares, e na manutenção anual do exército e da marinha. Desde os camponeses até ao topo, toda a classe social é fortemente tributada para alimentar esse monstro insaciável de guerra. Às pessoas pobres é retirado tudo o que conseguiram com o suor do seu rosto e o trabalho das suas mãos.
Na realidade, a guerra é contínua. O efeito moral das despesas com estas somas colossais de dinheiro em meios militares é tão prejudicial quanto a guerra em si e o seu séquito de carnificinas e horrores. As forças ideológicas e morais das partes em conflito tornam-se bárbaras e brutais, os poderes espirituais ficam atrofiados e as leis da civilização divina são desrespeitadas. Um tamanho sorvedouro financeiro seca as veias e os músculos do corpo político, e congela as sensibilidades delicadas do espírito.
Não existe a menor dúvida que a nação ou governo que faz um esforço extraordinário na promoção da paz universal será cercada por confirmações divinas, e será objecto de honra a respeito entre todos os habitantes da terra. Essa acção será conducente à prosperidade e ao bem-estar da espécie humana. Sobre esta questão da paz universal, há cinquenta anos, sua santidade Bahá’u’lláh escreveu a todos os soberanos e monarcas do mundo explicando em detalhe os benefícios da paz e os males das carnificinas. Entre outras coisas, Ele disse: originalmente, a espécie humana era uma família, unida e compacta; posteriormente, os membros desta família foram divididos e subdivididos através da ignorância e do preconceito. Agora chegou novamente o momento da sua unificação final. A paz universal trará esta consumação há muito desejada. (Star of the West, Volume 4, pp. 41-42)
Na sua notável resposta a esta questão, ‘Abdu’l-Bahá fez várias observações fascinantes e incisivas. Primeiro, Ele salienta que “na realidade a guerra é contínua”, especialmente quando “a maior parte do rendimento de cada país é gasta na preparação de máquinas militares...”
‘Abdu’l-Bahá fez uma observação presciente. Hoje, intelectuais e historiadores referem este tipo de abordagem militarista continuada aos conflitos nacionalistas como “guerra perpétua” ou “guerra eterna”. Muitos escritores perspicazes e especialistas militares - como Dexter Filkins, James Chace, David Keen, James Pinckney Harrison, Tran Van Don e Robert Fisk - concluíram que esta guerra é mentalmente contínua e descreveram-na como factor determinante em locais flagelados pela guerra, como o Médio Oriente, o Afeganistão e outros locais do mundo; é também um grande actor nas tensões globais entre as nações mais poderosas do mundo.
Assim, quando muitos países industrializados levam as suas instalações fabris a centrar as suas energias na produção de armas e gastam a maior parte dos seus orçamentos e recursos nacionais nas suas forças militares – tal como ‘Abdu’l-Bahá previu – isto conduz-nos inevitavelmente a uma guerra:
Considerai agora que os países mais avançados e civilizados do mundo foram transformados em arsenais de explosivos, que os continentes do globo foram transformados em enormes campos de batalha, que os povos do mundo formaram eles próprios nações armadas, e que os governos do mundo estão a competir uns com os outros sobre quem dará o primeiro passo para o campo da carnificina e do massacre, sujeitando assim a espécie humana ao grau extremo de aflição. (Selections from the Writings of Abdu’l-Baha, #225)Os ensinamentos Bahá’ís advertem a humanidade e os seus líderes que fazer uma guerra perpétua leva à ruína, tanto de indivíduos como de nações. Em qualquer competição pela supremacia de armamentos, nenhum poder de fogo é suficiente. Quando um país tenta apenas ficar à frente dos outros, cada adversário gasta enormes quantias numa corrida fútil e guiada pelo medo – que geralmente termina com o mesmo “equilíbrio de poder” com que começou. Ninguém vence uma corrida aos armamentos.
Bahá’u’lláh, nas Suas epístolas aos reis e governantes do mundo, advertiu-nos repetidamente sobre as corridas aos armamentos:
Conciliai as vossas diferenças e reduzi os vossos armamentos, para que o fardo das vossas despesas possa ser aliviado e para que as vossas mentes e corações possam ficar tranquilos. Sarai as dissensões que vos dividem e não mais precisareis de armamentos, salvo naquilo que exigir a protecção das vossas cidades e territórios. Temei a Deus e acautelai-vos para não ultrapassar os limites da moderação e serdes contados entre os extravagantes.
Ficámos a saber que aumentais as vossas despesas todos os anos e que colocais o respectivo fardo sobre os vossos súbditos. Em verdade, isto é mais do que eles podem suportar e é uma penosa injustiça. Decidi com justiça entre os homens e sede símbolos da justiça entre eles. Isto, se julgardes honestamente, é a coisa que vos convém e é digna da vossa condição. (Gleanings from the Writings of Baha’u’llah, CXVIII)
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Texto original: What Really Causes War? (www.bahaiteachings.org)
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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.
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