sábado, 9 de janeiro de 2021

Volta os teus olhos para ti próprio...

Por David Langness.


Ó FILHO DO ESPÍRITO!
Criei-te rico; porque te empobreces? Fiz-te nobre; com que é que te rebaixas? Da essência do conhecimento, dei-te existência; porque procuras iluminação de outro além de Mim? Do barro do amor, moldei-te; como é que te ocupas com outro? Volta os teus olhos para ti próprio, para que dentro de ti possas encontrar-Me, forte, poderoso, subsistindo por Mim próprio.

No último artigo desta série de reflexões sobre As Palavras Ocultas de Bahá'u'lláh, explorámos uma das múltiplas implicações da citação anterior. Tal como o nome do livro sugere, existem vários significados em cada uma das Palavras Ocultas; assim este texto irá focar-se numa outra – a noção de que a alma é um espelho polido com capacidade para reflectir o Sol da Verdade.

Há pouco mais de cem anos, o primeiro Bahá’í americano, um executivo de uma companhia de seguros chamado Thornton Chase, escreveu uma carta a 'Abdu'l-Bahá, que estava na Terra Santa. Esta prática, comum entre os primeiros Bahá’ís do Ocidente, resultava por vezes em respostas que apresentavam uma compreensão totalmente nova dos ensinamentos e das Escrituras Bahá'ís. Thornton Chase, curioso sobre a frase “Volta os teus olhos para ti próprio, para que dentro de ti possas encontrar-Me, forte, poderoso, subsistindo por Mim próprio”, pediu a 'Abdu'l-Bahá que a explicasse. A frase (que inicialmente tinha sido traduzida como “Volta a tua face, para que possas encontrar-Me dentro de ti, Forte, Poderoso e Supremo”) tinha despertado o interesse de Chase e recordava-lhe um texto bíblico. ‘Abdu’l-Bahá respondeu:

Esta é a frase que Sua Santidade o Cristo, dirigiu aos Seus Apóstolos no Evangelho, dizendo “O Pai está no Filho e o Filho está em vós”.

Isto é evidente quando os corações são puros e através da educação divina e ensinamentos celestiais se tornam manifestadores de perfeições infinitas, eles são como espelhos limpos, e o Sol da Verdade reflectir-se-á com força, poder e omnipotência nesses espelhos, a tal ponto que tudo o estiver à sua frente ficará iluminado e incandescido. Esta é uma interpretação breve devido à falta de tempo. Portanto, reflecte e pondera nela, para que as portas do significado se possam abrir perante os teus olhos. (‘Abdu’l-Bahá: Extract from Tablet to Thornton Chase, June 1911: Star of the West Vol. II, Nos. 7 and 8, pp. 11-12)

Esta metáfora - com o Sol e os espelhos – tem uma beleza impressionante e surge várias vezes nas Escrituras Bahá’ís, descrevendo a relação entre Deus e o Manifestante, e a forma como cada um de nós se relaciona com a luz e a glória de uma nova revelação.

‘Abdu’l-Bahá pediu a Thornton Chase que reflectisse e meditasse nesta metáfora, e nós também o podemos fazer. Neste outro excerto que usa a analogia do espelho, Bahá’u’lláh elucida a chave do seu simbolismo:

Sobre a mais íntima realidade de todas as coisas criadas, Ele derramou a luz de um dos Seus nomes, e fê-la um receptor da glória de um dos Seus atributos. Sobre a realidade do homem, porém, Ele focou o esplendor de todos os Seus nomes e atributos, e fê-lo um espelho do Seu próprio Ser. Único entre todas as coisas criadas, o homem foi escolhido para uma tão grande graça, uma dádiva tão duradoura.

Estas energias com as quais o Sol da dádiva Divina e Fonte da guia celestial dotou a realidade do homem, porém, jazem latentes nele tal como uma chama se oculta numa vela e os raios de luz estão potencialmente presentes na lâmpada. O esplendor destas energias pode ser obscurecido pelos desejos mundanos tal como a luz do sol se pode ocultar sob a poeira e as impurezas que cobrem o espelho. Nem a vela nem a lâmpada podem acender-se através do seu próprio esforço e sem ajuda, nem será alguma vez possível ao espelho libertar-se das suas impurezas. É claro e evidente que até que uma chama se acenda, a lâmpada não poderá dar luz, e até que as impurezas sejam removidas, a face do espelho nunca poderá apresentar o sol, nem reflectir a sua luz e glória. (Bahá’u’lláh, Gleanings from the Writings of Bahá’u’lláh, XXVII)

Bahá’u’lláh diz-nos aqui que cada um de nós tem todos estes atributos divinos dentro de si, e que acender a lâmpada ou limpar o espelho das nossas almas poderá acontecer se voltarmos o nosso olhar para dentro de nós próprios. Se limparmos os nossos espelhos interiores ao adquirir esses atributos tornamo-nos, dizem os ensinamentos Bahá’ís, uma tocha de fogo de amor de Deus – a personificação brilhante e viva da humildade e espiritualidade.

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Texto original: Turn Your Sight Inward (www.bahaiteachings.org)


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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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