Escrituras, n. Os livros sagrados da nossa religião sagrada, diferentes dos textos falsos e profanos em que todas as outras religiões se baseiam. (Ambrose Bierce, O Dicionário do Diabo)
O famoso escritor satírico americano Ambrose Bierce alude à possibilidade de todos os livros sagrados serem verdadeiros na sua definição intencionalmente irónica da palavra “Escrituras”. No fundo, os dicionários comuns definem as Escrituras como “qualquer livro sagrado”.
Tente pensar da seguinte forma: e se as Escrituras Sagradas de todas as grandes religiões do mundo fossem capítulos do mesmo livro? E se todos estes capítulos com nomes distintos, tivessem o mesmo autor? E se as Escrituras Sagradas de todas as religiões narrassem uma revelação contínua para a humanidade? E se as Escrituras Sagradas de todas as religiões revelassem a sagrada palavra de Deus?
Os ensinamentos Baha'is definem a palavra “Escritura” exactamente desta forma, e aplicam a definição aos textos sagrados de todas as grandes religiões. Para os Baha'is, as sagradas Escrituras de todas as religiões testificam eloquentemente, não só a sua própria unidade essencial, mas também a unidade da humanidade:
Se alguém meditasse naquilo que revelaram as Escrituras, enviadas do céu da santa Vontade de Deus, reconheceria prontamente que o seu propósito é que todos os homens sejam considerados como uma só alma, de modo que o selo que contém as palavras “O Reino será de Deus” possa ser gravado em cada coração, e a luz da generosidade, da graça e da misericórdia Divinas possa envolver toda a humanidade. (Baha'u'llah, Gleanings, CXXII)
Vamos prosseguir com a nossa discussão sobre as Escrituras com esta definição em mente. Todas as Escrituras, escreveu Baha'u'llah, são “enviadas do céu da santa Vontade de Deus…”, o que afirma que estas Escrituras sagradas chegam até nós inspiradas pelo Criador.
Cada profeta de Deus, cada fundador de uma grande religião - dizem os ensinamentos Bahá'ís - traz um livro sagrado. As palavras sagradas reveladas nesse livro, iluminadas pela luz da generosidade divina, transcendem as simples palavras humanas. De facto, os ensinamentos Baha'is dizem que a “irresistível Verbo de Deus” é “a Causa de toda a criação…”
Aquele que comunica a influência geradora e aquele que recebe o seu impacto são de facto criados através do irresistível Verbo de Deus, que é a Causa de toda a criação, enquanto todo o resto para além do Seu Verbo são apenas as criaturas e os efeitos do mesmo. Em verdade, o teu Senhor é o Esclarecedor, o Sapientíssimo.
Sabe, além disso, que o Verbo de Deus – exaltada seja a Sua glória – está mais elevado e é muito superior àquilo que os sentidos podem perceber, pois está santificada de qualquer propriedade ou substância. Transcende as limitações dos elementos conhecidos e está exaltado acima de todas as substâncias essenciais e reconhecidas. Tornou-se manifesto sem qualquer sílaba ou som, e não é mais do que o Mandamento de Deus que permeia todas as coisas criadas. Nunca foi negado ao mundo da existência. É a graça omnipresente de Deus, da qual emana toda a graça. É uma entidade muito distante de tudo o que foi e será. (Baha'u'llah, Epístola da Sabedoria, ¶9 ¶10)
Se olharmos com atenção, podemos ver esta ideia fundamental do Verbo Criador em cada livro sagrado:
E disse Deus: Ajuntem-se as águas debaixo dos céus num lugar; e apareça a porção seca. E assim foi. E chamou Deus à porção seca Terra; e ao ajuntamento das águas chamou Mares. E viu Deus que era bom. (Gen 1:9-10)
E a palavra de Deus crescia e multiplicava-se. (Actos 12:24)
Na verdade, foi Ele quem criou os céus e a terra; e no dia em que Ele disser: ‘SÊ’, então é. A Sua palavra é a verdade… (Alcorão, sura 6)
Glorificado seja o Teu nome, ó Senhor meu Deus! Suplico-Te pelo Teu poder que envolveu todas as coisas criadas, e pela Tua Soberania que transcendeu toda a criação, e pelo Teu Verbo que estava oculto na Tua sabedoria, e através do qual criaste o Teu céu e a Tua terra, ambos para nos capacitar a ser firmes no nosso amor por Ti e na nossa obediência ao Teu agrado, e a fixar o nosso olhar na Tua face e a celebrar a Tua glória. (Baha’u’llah, Baha’i Prayers, p. 159)
As palavras sagradas, as palavras santas, as palavras criativas nas Escrituras do mundo — são todas simbolizadas pela água vivificadora e corrente. Ilimitada e imortal, fonte de toda a vida na Terra, nunca estagnadas, mas sempre fluindo, a água representa a generosidade e o amor eterno do Criador:
Ó amigos do Deus Puro e Omnipotente! Ser puro e santo em todas as coisas é um atributo da alma consagrada e uma característica necessária da mente não escravizada. A melhor das perfeições é a imaculabilidade e libertarmo-nos de todos os defeitos. Quando o indivíduo estiver, em todos os aspectos, limpo e purificado, então tornar-se-á um centro focal que reflete a Luz Manifesta.
Primeiro, no modo de vida de um ser humano, deve haver pureza, depois vitalidade, decência e independência de espírito. Primeiro o leito do rio deve estar limpo, e depois as águas doces do rio podem ser conduzidas para ele. Os olhos castos desfrutam da visão beatífica do Senhor, e sabem o que significa este encontro; um sentido puro inala as fragrâncias que sopram dos jardins de rosas da Sua graça; um coração lustroso reflectirá a bela face da verdade.
É por isso que, nas Sagradas Escrituras, os conselhos do céu são comparados à água, tal como diz o Alcorão: “E enviámos água pura do céu”, e o Evangelho: “Aquele que não for baptizado da água e do espírito, não pode entrar no Reino de Deus.” Assim torna-se claro que os Ensinamentos que vêm de Deus são efusões celestes de graça; são aguaceiros de misericórdia divina e purificam o coração humano. (Selections from the Writings of 'Abdu'l-Bahá, #129)
Se vemos os livros sagrados das grandes religiões como água vivificadora e corrente, capaz de nutrir e sustentar a alma, não gostaríamos de nos hidratarmos todos os dias? Não faria sentido refrescarmos e alegrarmos as nossas almas com a água da vida? No próximo artigo desta série, veremos exactamente como pode fazer isso acontecer.
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Texto original: The Living Water of the Sacred Words (www.bahaiteachings.org)
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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA
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