sexta-feira, 28 de março de 2008

Sam Harris e o Fim da Fé (6)

AINDA O ISLÃO

No livro O Fim da Fé, Sam Harris reconhece o contributo civilizacional do Islão (p.119), mas refere esse facto como se tratasse de uma obra do acaso; uma decadência generalizada das restantes civilizações teriam permitido o surgimento da civilização islâmica. Os muçulmanos tornaram-se portadores de valores civilizacionais e promotores do conhecimento científico porque não havia mais ninguém para o fazer. Ao fazer afirmações destas, o autor evita comparações com a forma como surgiram outras civilizações.

Os actuais problemas do mundo Ocidental com o Islão, não podem ser entendidos com bases em interpretações infantis do Alcorão. E a evidente estagnação da civilização islâmica que Sam Harris aponta(p. 144), deve ser analisada de forma objectiva de sob diferentes perspectivas. O autor do Fim da Fé está longe de ser a pessoa indicada para nos ajudar a perceber o Islão enquanto inspirador de uma civilização, assim como os motivos da ascensão e decadência dessa civilização. Reflectir sobre o que levou uma civilização tão brilhante e evoluída a cair e regredir seria um tema bem mais interessante do que um conjunto de análises politico-religiosas que nada mais são do que mera verborreia preconceituosa.

OUTRAS QUESTÕES

“Haverá paz com o Islão?” (p.149) questiona Sam Harris. O próprio não parece muito optimista na resposta a esta pergunta, o que também não admira, quando ao longo do livro se torna evidentes os seus preconceitos. O Ocidente colabora com tiranos muçulmanos, queixa-se o Sr. Harris (p.143); e tem razão.

E os tiranos não-muçulmanos? Quem vende armamento e tecnologia ao regime chinês? Quem suporta as ditaduras e as pseudo-democracias em África? Quem apoiou os sistemas totalitários na América Latina?

Onde estão os muçulmanos moderados, pergunta Sam Harris (p. 135)? Porque é que a sua voz não se faz ouvir? Lembro o autor já tinha defendido a ideia de que os moderados religiosos apenas fazem o jogo dos fundamentalistas. Mas não obstante estas considerações, o Sr. Harris conclui que é fundamental encorajar a transformação social e política das sociedades islâmicas, apoiando os muçulmanos moderados (p. 163-164). O estranho desta conclusão, é que no mesmo livro o autor já tinha acusado os crentes moderados de dar cobertura aos fundamentalistas. Para quem tanto preza o uso da razão, esta contradição não fica lá muito bem.

Felizmente que no meio desta obsessão anti-islâmica encontramos algum bom senso na forma como Sam Harris cita e se refere a Fareed Zakaria. O autor do Fim da Fé, refere-se ao editor da Newsweek como o homem que vê as origens da violência islâmica não no Islão, mas na história recente do Médio Oriente (p.159); que notou um retrocesso no mundo árabe nos últimos 50 anos (p.159); que aponta o falhanço das instituições políticas do mundo árabe como sendo a causa da ascensão do fundamentalismo islâmico (p.160); que considera a modernização política, económica e social como a chave para a redenção dos árabes (p.161).

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