quinta-feira, 19 de junho de 2008

Richard Dawkins e A Desilusão de Deus (3)

A CIÊNCIA E A RELIGIÃO

A valorização do conhecimento científico na análise dos ensinamentos religiosos é o princípio que orienta Richard Dawkins no seu livro A Desilusão de Deus (“Deus, um delírio”, na edição brasileira) . Afinal ele é um cientista e naturalmente considera e deve ser a ciência a validar as crenças religiosas, e não o contrário. As maiores críticas do biólogo britânico vão para aquelas convicções religiosas que contradizem abertamente o conhecimento científico, e chegam mesmo a opor-se ao progresso da ciência. Considere-se, por exemplo, os seguintes excertos:

Os criacionistas procuram avidamente uma lacuna no conhecimento ou na compreensão da actualidade. Uma vez encontrado aquilo que parece uma lacuna, presume-se que, por defeito, deve ser Deus a preenchê-la. O que preocupa os teólogos ponderados como [Dietrich] Bonhoeffer é que as lacunas vão diminuindo à medida que a ciência avança, arriscando-se assim Deus a acabar por não ter mais nada para fazer, nem nenhum sítio para se esconder. [p.160]

…o facto de o DI [Intelligent Design] não possuir provas próprias, mas medrar como erva daninha nas lacunas deixadas pelo conhecimento científico, convive mal com a necessidade que a ciência tem de identificar e anunciar essas mesmas lacunas como condição para as investigar. Neste respeito, a ciência encontra-se aliada a sofisticados teólogos como Bonhoeffer; unidos contra inimigos comuns que são a teologia naïve e populista e a teologia das lacunas proposta pelo desígnio inteligente. [p.161-162]
Além de rejeitar um conceito ingénuo sobre Deus (o deus “tapa-buracos”), o Professor Dawkins identifica a incompatibilidade entre algumas crenças religiosas e o conhecimento científico para demonstrar a falsidade dessas crenças. Por outro lado, fica claro que o verdadeiro alvo das suas críticas nada tem a ver com os teólogos “sofisticados” e “ponderados”. Dir-se-ia que o autor sugere que quando a religião está contra a ciência, então é mera superstição.

Será isto uma posição radical?

A importância da razão é repetidamente afirmada nas Escrituras Bahá’ís. Segundo Bahá'u'lláh, a inteligência e a razão são uma dádiva de Deus ao ser humano: “Esta dádiva dotou o homem com capacidade de discernir a verdade em todas as coisas, conduzindo-o àquilo que é correcto e ajudando-o a descobrir os segredos da criação” [1]. A ciência é resultado do uso sistemático destas dádivas divinas.

Uma análise, mesmo que superficial, das Escrituras Bahá’ís permite perceber a ênfase na importância atribuída ao conhecimento científico e na necessidade de coerência entre Ciência e Religião. Durante as Suas visitas à Europa e aos Estados Unidos, 'Abdu'l-Bahá abordou este princípio diversas vezes. Em 1911, em Paris, afirmou:
Não existe contradição há entre a verdadeira religião e ciência. Quando uma religião se opõe à ciência, torna-se mera superstição: aquilo que é contrário ao conhecimento é ignorância.

Como pode o homem acreditar ser real aquilo que a ciência provou ser impossível? Acreditar, a despeito da razão, é antes superstição ignorante, do que fé. Os verdadeiros princípios de todas as religiões estão em conformidade com os ensinamentos da ciência. [2]
É óbvio que 'Abdu'l-Bahá não rejeita a religião; pelo contrário, afirma que quando existe conflito entre ciência e religião, então estamos na presença de um entendimento incorrecto de um ensinamento religioso. Note-se que 'Abdu'l-Bahá usa expressões como “verdadeira religião” e “verdadeiros princípios” para se referir às religiões que não estão em contradição com a ciência.

Existe um paralelismo óbvio na condenação que 'Abdu'l-Bahá e Richard Dawkins fazem da religião que se opõe à ciência. Mas também há uma diferença: o Professor fica-se pela denúncia da falsidade das interpretações literais; 'Abdu'l-Bahá aponta a superior importância do sentido simbólico do Texto Sagrado.

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REFERÊNCIAS
[1] – Selecção dos Escritos de Baha’u’llah, XCV
[2] - 'Abdu'l-Bahá, Palestras em Paris, (12 de Novembro, 1911)

2 comentários:

Anónimo disse...

O Dawkins não se fica "pela denúncia da falsidade das interpretações literais". Ele aproveita isto para condenar praticamente toda a forma de religião. E muito ateus também não se contentam com isto e pensam que todas as religiões são meros patetinhas que acreditam em crendices.

Anónimo disse...

http://www.olavodecarvalho.org/semana/080619jb.html