quinta-feira, 19 de junho de 2025

Uma Peregrinação à Casa do Báb

Por Manijeh Khorshidi.


Aos doze anos, encontrei-me num espaço sagrado — o quarto onde o Profeta de Deus agraciou a existência em meados do século XIX. Quão prontamente, nos lugares sagrados, a alma se apercebe do amor de Deus e alcança o mistério do sacrifício. Quão facilmente a alma encantada inala o ar doce e perfumado com a fragrância das vestes do Amado e discerne a harmonia tranquila da criação.

No primeiro dia de primavera, ao alvorar do dia, um grupo de Bahá’ís — incluindo os meus pais e os seus filhos — iniciou uma peregrinação gloriosa e inesquecível àquele local santificado. O pequeno grupo, que teve a honra de ter o Sr. Afnan como guia, caminhou em silêncio e reverência em direcção à Casa do seu Amado — a Casa do Báb.

Shiraz, deslumbrante na primavera, com as suas colinas e jardins repletos de cores, onde o jasmim e as rosas competem para perfumar o ar, tornou-se o local escolhido na terra onde se ouviu o chamamento de Deus – em Maio de 1844. Uma cidade que viu nascer poetas como Saadi e Hafiz, foi favorecida por Deus como o lugar do José do Amor, o Seu jovem Profeta, Siyyid Ali Muhammad, o Báb.

A brisa da graça de Deus soprou sobre a terra dos rouxinóis e das flores, fazendo de Shiraz a anfitriã do Rouxinol Espiritual. Naquela noite espetacular e histórica, a Terra — jubilosa e expectante, a esfera celeste pronta a receber — testemunhou a revelação da condição do Profeta e ouviu a Sua mensagem. O manto da aceitação da poderosa Revelação de Deus através do Seu novo Mensageiro naquela noite posou sobre um jovem erudito, o primeiro crente, Mulla Husayn.

Ó tu que és o primeiro a acreditar em Mim! Em verdade Eu digo: Eu sou o Báb, a Porta de Deus. (The Dawnbreakers, p.57)

Mais de um século depois, nesse dia de primavera, o nosso pequeno grupo de peregrinos – à semelhança de milhares vindos de todo o mundo – viajou até à Casa sagrada onde o chamamento de Deus tinha rejuvenescido cada átomo da Terra. Ansiosa por ver a Casa do Profeta, esta criança com grandes expectativas imaginou uma casa palaciana rodeada de jardins grandiosos. No fundo, a mais preciosa dádiva de Deus à humanidade, o Seu Mensageiro – o construtor de uma nova civilização – vivera e caminhara naquele lugar.

No beco estreito não se viam casas ou jardins imponentes; apenas muros altos e portas de madeira fechadas emolduravam o caminho para a Casa do Báb. E então, surgiu uma casa modesta e pequena. Esta era a morada do Bem-Amado do mundo — um ponto brilhante no vasto universo que albergara o Ponto Mais Exaltado, o Ponto Primordial, o iniciador da era Bahá’í nos reinos da existência.

Como é grande o eco destas Palavras em cada coração receptivo, abrangendo o tempo e o espaço para a eternidade:

Eu sou o Ponto Primordial do qual foram geradas todas as coisas criadas. Eu sou o Semblante de Deus, cujo esplendor nunca poderá ser obscurecido, a Luz de Deus, cujo brilho nunca poderá apagar-se. Quem Me reconhece, estão-lhe reservados a segurança e todo o bem, e quem não Me reconhece, esperam-no o fogo infernal e todo o mal… (Epistle to Muhammad Shah)

Assim, cada tijolo daquela Casa tinha uma história para contar, pois “…o Semblante de Deus…, a Luz de Deus…” apareceram ali.

Entrámos no pátio e subimos à sala superior — a sala privilegiada que ouviu o chamamento do Divino, onde estas Palavras foram erguidas:

"Esta noite, esta própria hora, serão celebradas nos dias vindouros como um dos maiores e mais significativos festivais. Agradece a Deus por te ter ajudado graciosamente a alcançar o desejo do teu coração, e por teres sorvido do vinho selecto da Sua palavra." (The Dawn-Breakers, p.62)

As paredes brancas, com nichos para Livros Sagrados e objetos ornamentais, os vitrais, os tapetes persas e a lamparina a óleo ornamentada no centro compunham a beleza simples da sala. Ajoelhei-me no chão, seguindo os outros. Os meus pais, numa oração profunda com olhos fechados, pareciam livres deste mundo — até da relação entre pais e filhos. Recordo a harmonia das cores, o ambiente tranquilo, a forma como tudo pedia que a vida fosse celebrada.

Recitei orações em silêncio, mas elas ecoavam no meu coração. Como esta bela oração do Báb descreve o anseio de cada alma:

Ó meu Deus, meu Senhor e meu Mestre! Desprendi-me dos meus parentes e procurei, através de Ti, tornar-me independente de todos os que habitam a terra e sempre pronto a receber o que é louvável aos Teus olhos. Concede-me o bem que me torne independente de tudo, excepto de Ti, e concede-me uma parte mais ampla dos Teus favores ilimitados. Em verdade, Tu és o Senhor da graça abundante. (Bahá'í Prayers)

Extasiados e sentindo-nos próximos do nosso Senhor, descemos as escadas do lado oposto e regressámos ao pátio, onde se destacava como testemunha a laranjeira que o próprio Profeta tinha plantado. Ver aquela árvore transportou-nos para os dias alegres em que o jovem Profeta e a sua esposa se poderiam ter sentado debaixo dela, apreciando as suas flores e frutos.

A Casa evocava um reflexo luminoso daquela alegria — por mais breve que fosse — quando o Báb e a Sua esposa ali viveram. Transportava a mente para cenas onde os primeiros crentes, as Letras dos Viventes, frequentavam a Casa e levavam ao mundo a poderosa mensagem do Profeta de Deus.

Na profundeza das emoções despertadas naquela Casa Sagrada, era fácil recordar o significado do chamamento do jovem Profeta — que resgatou a Sua vida no altar da existência apenas seis anos após a Sua Declaração. O Seu chamamento preparou os corações dos Seus seguidores para o chamamento ainda maior de "Aquele Que Deus tornará manifesto" — Bahá'u'lláh.

Profeticamente, o Báb previu esse futuro com estas palavras:

... Sacrifiquei-me completamente por Ti; aceitei os insultos por amor a Ti; e por nada ansiei salvo o martírio no caminho do Teu amor.... (O Bab, citado por Bahá’u’lláh no Livro da Certeza, ¶258)

Eu tinha doze anos, não conseguia imaginar como a vida iria mudar para sempre por causa daquela experiência. Aquele lugar sagrado na Terra proporcionou momentos inesquecíveis, indescritíveis.

Estas palavras comoventes de ‘Abdu’l-Bahá vêm-me à mente:

Os lugares sagrados são, sem dúvida, centros de efusão da graça divina, porque ao entrar nos locais iluminados associados aos mártires e às almas santas, e ao observar a reverência, tanto física como espiritual, o coração é tocado com grande ternura. (Synopsis and Codification of the Kitáb-i-Aqdas, p. 61)

A destruição da Casa do Báb pelo regime islâmico no Irão em 1979 — após muitas tentativas anteriores — repercute o medo dos corações que se abrem à brisa da Primavera Divina. Revela o tormento que alguns sentem perante a novidade, o ar fresco da renovação espiritual que chama a humanidade à unidade:

Sois os frutos da mesma árvore e as folhas do mesmo ramo.

Hoje, as almas sedentas em todo o mundo estão privadas da oportunidade de contemplar este edifício sagrado. No entanto, a alma do universo e os mundos de Deus preservam este Lugar Sagrado — quer os seus tijolos e paredes permaneçam no mundo material ou não.

Estas palavras encantadoras de Bahá'u'lláh trazem consolo e esperança:

Bem-aventurado o lugar, a casa, o espaço, a cidade, o coração, a montanha, o refúgio, a gruta, o vale, a terra, o mar, a ilha e o prado onde foi feita a menção de Deus e o glorificado Seu louvor. (Bahá’u’lláh, Baha’i Prayers, p. iii)

Na Revelação de Bahá’u’lláh, nenhuma alma é privada da experiência de “…efusão da graça divina…

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Texto original: Where the Soul Remembers: A Pilgrimage to the House of the Bab (www.bahaiteachings.org)


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Manijeh Khorshidi nasceu e cresceu numa família Bahá'í em Teerão, no Irão. Licenciou-se em odontologia Infantil pela Universidade de Teerão. Em 1979, devido à perseguição sistemática e implacável dos Bahá’ís no Irão pela revolução islâmica, ela abandonou o Irão. Estabelecendo-se na Europa, viveu na Irlanda do Norte e em Londres. Posteriormente, foi para os Estados Unidos da América para prosseguir os seus estudos e a sua carreira. Trabalha como Médica Dentista Infantil há 28 anos em Wisconsin e lecciona no Waukesha Technical College como médica dentista supervisora há 16 anos. A sua paixão na vida, assim como a de milhões de pessoas, é trabalhar pela "Unidade da Humanidade", o princípio fundamental da Fé Bahá'í. O seu livro "Prompts of the Heart, Prose and Poetry" foi publicado em 2023. Alguns dos seus escritos foram publicados em reedsy.com e medium.com. Vive com o marido, Robert Malouf, um poeta, em Brookfield, Wisconsin.

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