Deus criou o mundo como um só – as fronteiras foram marcadas pelo homem. Deus não dividiu as terras ... É por isso que Bahá'u'lláh diz: "Que vão se vanglorie o homem que ama o seu país, mas que aquele que ama a sua espécie." Todos são uma família, uma raça; todos são seres humanos. ('Abdu'l-Baha, Abdu'l-Bahá in London, p. 55)Ao longo da sua nova encíclica sobre a pobreza e o ambiente, o Papa entrelaça preocupações ecológicas e sociais:
Não pode ser autêntico um sentimento de união íntima com outros seres da natureza, se ao mesmo tempo não houver, no coração, ternura, compaixão e preocupação pelos seres humanos… exige-se uma preocupação pelo meio ambiente, unida ao amor sincero pelos seres humanos e a um compromisso constante com os problemas da sociedade. (¶91)No capítulo 3 da Laudato Si ', o Papa explora as raízes humanas da crise ecológica, com foco no paradigma tecnocrático dominante, no lugar dos seres humanos e na acção humana no mundo. Aqui, a consciência social do Papa é particularmente evidente:
Hoje, crentes e não-crentes estão de acordo que a terra é, essencialmente, uma herança comum, cujos frutos devem beneficiar a todos. Para os crentes isto torna-se uma questão de fidelidade ao Criador, porque Deus criou o mundo para todos. Por conseguinte, toda a abordagem ecológica deve integrar uma perspectiva social que tenha em conta os direitos fundamentais dos mais desfavorecidos. O princípio da subordinação da propriedade privada ao destino universal dos bens e, consequentemente, o direito universal ao seu uso é uma regra de ouro do comportamento social… (¶93)
... deveriam indignar-nos sobretudo as enormes desigualdades que existem entre nós, porque continuamos a tolerar que alguns se considerem mais dignos que outros. Deixámos de notar que alguns se arrastam numa miséria degradante, sem possibilidades reais de melhoria, enquanto outros não sabem sequer o que fazer ao que têm, ostentam vaidosamente uma suposta superioridade e deixam atrás de si um nível de desperdício tal que seria impossível generalizar sem destruir o Planeta. Na prática, continuamos a admitir que alguns se sintam mais humanos que outros, como se tivessem nascido com maiores direitos. (¶90)Este foco na enorme desigualdade entre as pessoas, tão fortemente proclamado na Laudato Si' , é um eco claro do mesmo que encontramos nos ensinamentos Bahá'ís:
Um financeiro com riqueza colossal não deveria existir, enquanto perto dele houver um homem pobre em necessidade extrema. Quando vemos que se deixa a pobreza chegar a uma situação de fome, isso é um sinal certo de que em algum lugar se encontra a tirania. Os homens devem agir nesta matéria, e não devem adiar mais a alteração das condições que trazem a miséria da pobreza opressiva a um vastíssimo número de pessoas. Os ricos devem doar parte da sua abundância, suavizar os seus corações e cultivar uma inteligência compassiva, pensando naqueles pobres seres que sofrem com a falta de meios elementares de subsistência.
Devem existir leis especiais que tratem destes extremos de riqueza e pobreza. Os membros do Governo devem considerar as leis de Deus quando elaborarem planos para dirigir os povos. Os direitos gerais da humanidade devem ser protegidos e preservados.
Os governos dos países devem seguir a Lei Divina que confere justiça igual para todos. Este é o único meio pelo qual podem ser abolidas a deplorável superabundância de grande riqueza e a miserável, desmoralizante e degradante pobreza. Enquanto isto não for feito, a Lei de Deus não será obedecida. ('Abdu'l-Bahá, Paris Talks, pp 153-154.)
Taxa de Pobreza, baseada na Paridade de Poder de Compra |
Ao isolarmo-nos da realidade natural e espiritual, caímos na armadilha da sociedade de consumo. O nosso excessivo antropocentrismo atravessa-se no caminho da compreensão mútua e impede qualquer esforço para fortalecer os laços sociais. "Se o ser humano se declara autónomo da realidade e se se constitui dominador absoluto, desmorona-se a própria base da existência." (¶117) Centrámo-nos em nós próprios e demos prioridade absoluta às nossas conveniências imediatas, e relativizámos todo o resto. Qual foi o resultado? Individualismo desenfreado, com muitos problemas sociais relacionados com a actual cultura egocêntrica de satisfação imediata. O mercado tenta promover o consumismo extremo num esforço para vender os seus produtos; por isso, somos facilmente apanhados num consumismo compulsivo de compras e gastos desnecessários. Quando as pessoas se tornam egocentristas, a sua ganância aumenta:
...quanto mais vazio está o coração da pessoa, tanto mais necessita de objectos para comprar, possuir e consumir. Num tal contexto, parece não ser possível para uma pessoa, que a realidade lhe imponha limites… a obsessão por um estilo de vida consumista, sobretudo quando pouco têm possibilidade de o manter, só poderá violência e destruição recíproca. (¶204)Qualquer sociedade que se foca exclusivamente na vida material da humanidade - afirmam o Papa e os ensinamentos Bahá'ís - interrompe o seu progresso espiritual e ignora o enorme impacto negativo que tem sobre a própria Terra.
O ser humano não é plenamente autónomo. A sua liberdade desvanece-se quando se entrega às forças cegas do inconsciente, das necessidades imediatas, do egoísmo, da violência brutal. Neste sentido, ele está nu e exposto frente ao seu próprio poder que continua a crescer, sem ter instrumentos para o controlar. Talvez disponha de mecanismos superficiais, mas podemos afirmar que carece de uma ética sólida, uma cultura e uma espiritualidade que lhe ponham realmente um limite e o contenham dentro de um lúcido domínio de si. (¶105)
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Texto original: Extreme Poverty and Extreme Wealth, Explained (bahaiteachings.org)
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Arthur Lyon Dahl foi investigador do Museu de História Natural de Washington e consultor da UNCED (United Nations Conference on Environment and Development). É autor de diversas publicações e actualmente é Presidente do Forum Ambiental Internacional, em Genebra (Suiça)
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