Por Sonjel Vreeland.
Talvez você
seja como eu. Talvez tenha havido momentos em que lhe perguntaram o que é a Fé Bahá’í e no momento em que os seus lábios proferem a palavra
"religião", o seu interlocutor fica apreensivo. Talvez lhe respondam
que a religião é o opio do povo, que é uma ficção desactualizada que não
responde às necessidades de hoje, que é a causa de desnecessário derramamento
de sangue e guerra, que a religião gera intolerância em relação às pessoas de
outras religiões ou que a fé em algo maior que nós não deve ser organizada e
administrada. A propósito do Dia Mundial da Religião, pensei em explorar o que
significa a palavra "religião" no contexto das Escrituras Bahá’ís.
Aqui estão
algumas palavras de ‘Abdu’l-Bahá que descrevem o que a religião é:
A verdadeira religião baseia-se no
amor e na concórdia. Bahá’u’lláh disse: "Se a religião e a fé são as
causas da inimizade e sedição, é muito melhor ser não-religioso, e a ausência
de religião seria preferível; pois desejamos que a religião seja a causa da
amizade e da comunhão. Se existe inimizade e ódio, a irreligião é preferível
". Portanto, a eliminação desta contenda foi destacada por Bahá’u’lláh,
pois a religião é o remédio divino para o antagonismo e a discórdia humanas.
Mas quando tornamos o remédio na causa da doença, então seria melhor ficar sem
o remédio".[1]
No livro O
Segredo da Civilização Divina, 'Abdu'l-Bahá escreve:
O nosso objectivo é mostrar como a
verdadeira religião promove a civilização e a honra, a prosperidade e o
prestígio, a aprendizagem e o progresso de um povo, outrora abjecto,
escravizado e ignorante, e como, quando cai nas mãos de líderes religiosos que
são loucos e fanáticos, é desviada para fins errados, até que estes grandes
esplendores se tornam a noite mais tenebrosa.[2]
As pessoas
que me fazem perguntas sobre a Fé estão correctas e a sua desconfiança em
relação à religião é perfeitamente compreensível e justificada. O que eles
expressam é apenas uma manifestação subtil de um problema muito maior: uma
crise religiosa global. Na pior das hipóteses, esta crise religiosa é
demonstrada através de actos de violência atroz cometidos em nome da religião e
em nome de Deus. A religião precisa de se "libertar dos grilhões que até
agora a impediram de ter uma influência curadora de que é capaz." [3]
A Casa Universal da Justiça, profundamente consciente de que "a doença do ódio
sectário, se não for examinada de forma decisiva, ameaça ter efeitos
angustiantes que deixarão poucas áreas do mundo imunes"[4] escreveu uma
carta aberta aos líderes religiosos do mundo em 2002. Esta carta apelava à
coragem por parte dos crentes de todas as fés - coragem para combater o
preconceito contra a religião, elevando-a acima de "conceitos rígidos
herdados de um passado distante."[5] Penso que pode valer muito a pena
compreender profundamente o que aconteceu com a religião, como a religião é
vista e como Bahá’u’lláh reformulou o próprio conceito de religião.
O documento Uma
Fé Comum foi preparado sob a supervisão da Casa Universal da Justiça em
2005 e é um comentário maravilhoso que aborda esta questão e que pretende
catalisar um novo entendimento sobre a fé religiosa. O texto contém excertos
das Escrituras e descrições do discurso popular para explicar o mundo em que
vivemos e como evoluir.
Aborda, por
exemplo, os conhecidos equívocos sobre religião. Explica que, para muitas
pessoas, a religião é a multidão de seitas religiosas actualmente existente.
Para outros, são os "grandes sistemas independentes de crenças da
história", como o Cristianismo e o Islão. Para alguns, a religião é
simplesmente uma atitude universalmente disponível e para outros é um estilo de
vida cheio de rituais e sacrifícios. "O que todas as diferentes concepções
têm em comum", afirma-se, "é a medida em que um fenómeno conhecido
por transcender completamente os limites humanos, acabou por ser gradualmente
aprisionado em limitações conceptuais - sejam eles organizacionais, teológicas,
experimentais ou rituais - de origem humana".[6] Analisa o que aconteceu
com a religião ao longo do tempo e como "embora as verdades recebidas das
grandes fés permaneçam válidas, a experiência diária de um indivíduo no século
XXI está inimaginavelmente afastada daquela que ele ou ela teria conhecido em
qualquer uma dessas idades quando essa orientação foi revelada."[7]
O documento
explora aquilo que deve ser o nosso entendimento sobre a religião. Afirma:
[...] Bahá’u’lláh não trouxe à existência uma
nova religião para ficar junto à actual multiplicidade de organizações
sectárias. Em vez disso, Ele reformulou todo o conceito de religião como a
principal força impulsionadora do desenvolvimento da consciência. Como a raça
humana em toda a sua diversidade é uma espécie única, então a intervenção com
que Deus cultiva as qualidades da mente e do coração latente nessa espécie é um
processo único. Os seus heróis e santos são os heróis e os santos de todas as
etapas dessa luta: os seus sucessos são os sucessos de todas as eras. Este é o
modelo demonstrado na vida e no trabalho do Mestre e exemplificado hoje numa
Comunidade Bahá'í que se tornou o herdeiro do legado espiritual de toda a
humanidade, um legado igualmente disponível para todos os povos da Terra.[8]
A declaração
Uma Fé Comum conclui com estas palavras poderosas:
As sucessivas dispensações de um Criador
amoroso e intencional levaram os habitantes da Terra ao limiar de sua
maturidade colectiva enquanto povo único. Bahá’u’lláh apela à humanidade para
estrear a sua herança: "O que o Senhor ordenou como o remédio soberano e o
instrumento mais poderoso para a cura do mundo é a união de todos os seus povos
numa única Causa universal, uma fé comum". [9]
Ler Uma
Fé Comum deu-me um melhor entendimento, um contexto mais claro, sobre os motivos
que levam o meu interlocutor a escarnecer da religião. Espero que me tenha
tornado uma melhor ouvinte das suas preocupações porque vivemos num século
muito mais receptivo do que o último e "uma mudança radical na consciência
humana está em movimento". [10]
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REFERÊNCIAS:
[1] - Promulgation of Universal
Peace, p.232
[2] - 'Abdu'l-Bahá, The Secret of
Divine Civilization, p.80
[3] - The Universal House of
Justice, One Common Faith, p.iii
[4] - Idem.
p.i
[5] - Idem.
p.i
[6] - Idem.
p.18-9
[7] - Idem.
p.15
[8] - Idem.
p.23
[9] - Idem. p.56
[10] - Idem. p.3
TEXTO ORIGINAL: Is the Baha’i Faitha “Religion”? (Baha'i Blog).
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Sobre a
autora: Sonjel Vreeland é bibliotecária e museologista e vive na ilha de Prince
Edward (costa oriental do Canadá). É escritora, leitora ávida, mãe e esposa.
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