sábado, 8 de julho de 2023

António Francisco Ebo

Sr. António Francisco Ebo
O sr. António Francisco Ebo foi o primeiro Bahá’í angolano.

Sabemos que nasceu perto de Malanje, provavelmente na década de 1910; pouco se sabe sobre a sua infância e juventude. Era membro da etnia Kimbundu, que habita a área entre Luanda e Malanje. Já na idade adulta, o sr. Ebo mudou-se para Luanda, procurando melhores condições económicas para sustentar a sua família. O sr. Ebo era o chefe de um grupo familiar alargado que, na tradição africana, além de irmãos e irmãs, inclui também primos, sobrinhas, sobrinhos e outros parentes.

O encontro com a Fé Bahá’í


Em Janeiro de 1956, o sr. Ebo, que era membro da Igreja Evangélica em Luanda, ouviu o sr. Rodolfo Duna, um Bahá'í de Moçambique, falar à congregação sobre os princípios Bahá’ís, a convite do pastor da igreja. Curioso e intrigado, o sr. Ebo e o seu sobrinho acompanharam o sr. Rudolfo Duna até o local onde estava hospedado e pediram-lhe para ouvir mais sobre os princípios Bahá’ís. Foi aí que o sr. Ebo ouviu pela primeira vez o nome de Bahá’u’lláh. Nos dias que se seguiram encontraram-se novamente para estudar a Fé Bahá’í.

Ao longo desses encontros, o sr. Ebo ficou cada vez mais convencido de que a Fé Bahá’í era uma nova revelação divina. O seu entusiasmo levou-o a partilhar a novidade com o seu sobrinho Joaquim Sampaio, residente em Malanje. Este sobrinho era considerado por amigos e familiares como uma pessoa mística e profundamente espiritual, cuja sabedoria, amor e conselhos o tornavam merecedor de enorme respeito. O sr. Sampaio recusava filiar-se em qualquer igreja e afirmava que quando a verdade aparecesse, ele iria reconhecê-la.

Ao receber a carta do seu tio Ebo que falava da nova religião, o sr. Joaquim Sampaio respondeu com três perguntas: Qual a origem desta nova Fé? Onde se encontra o seu centro mundial? Qual o ensinamento central do seu Fundador? Ao receber as respostas às suas perguntas, o sr. Joaquim Sampaio escreveu: “Esta é a Fé que eu tenho estado à espera!” Estas palavras foram um enorme encorajamento para o sr. Ebo.

O casal Rudolfo e Angélica Duna percebiam que no sr. Ebo crescia o entusiamo e o fascínio pela revelação de Bahá’u’lláh. Numa ocasião, o sr. Ebo disse “Quero assinar hoje [o cartão de declaração]!”. O sr. Duna respondeu-lhe: “Não. Temos de te preparar. Não queremos que assines já. Vamos estudar todas as noites. Vens todas as noites para aprender sobre a Fé de Bahá’u’lláh”. Uma semana mais tarde, em 15 de Março de 1956, o sr. Duna escreveu: “Hoje fizemos uma festa especial para o Ebo se declarar e ele declarou. Ele trouxe todos os seus amigos. Vieram todos e agora temos três declarações na Fé. Já somos cinco. Se tivermos mais quatro, formamos uma Assembleia.

Um crente dedicado e vigoroso


O coração do sr. Ebo transbordava de alegria; nas semanas seguintes, iniciou intensas actividades de ensino e muitos dos seus familiares e amigos aceitaram a Fé. No Ridvan de 1956, com a ajuda do casal Duna, formou-se a primeira Assembleia Espiritual de Luanda. Entretanto chegou um casal de pioneiros de Portugal (Hilda e José Xavier Rodrigues) para ajudar na consolidação do conhecimento dos novos crentes.

Nos meses seguintes, as actividades de ensino da Fé Bahá’í alargaram-se a Malanje, onde o casal Duna contava com o apoio do sr. Ebo e também do seu sobrinho, Joaquim Sampaio. Havia uma grande receptividade e no Ridvan de 1957 formou-se a primeira Assembleia Espiritual de Malanje. O sr. Ebo foi nomeado para a Comissão de Ensino e ansiava por ser pioneiro no sul para estabelecer a Fé em Nova Lisboa (actual Huambo).

No final de 1957 o casal Duna regressou a Moçambique. O sr. Ebo tornou-se um servo vigoroso da Causa; continuou a servir na Assembleia de Luanda e na Comissão de Ensino da Área, trabalhando e colaborando com pioneiros os portugueses Hilda e Xavier Rodrigues, até 1960 (data em que eles saíram de Angola).

Alguns Bahá'ís de Luanda (final da década de 1950).
Em pé: Francisco Ebo, Andrade Coelho, Silva Miranda, Fernando Nascimento,
José Xavier Rodrigues e Domingos Horácio.
Sentadas: Mariana Nascimento, Hilda Rodrigues.



Quando o casal Duna saiu de Angola e regressou a Moçambique em Dezembro desse ano, o sr. Ebo serviu na Assembleia de Luanda e na Comissão de Ensino da Área, trabalhando com pioneiros portugueses Hilda e José Xavier Rodrigues. Hilda descreveu o sr. Ebo como “um luminar”. Trabalhava num posto de gasolina e sempre mantinha os pioneiros ao corrente do que ia acontecendo. Em 1959, o Mão da Causa John Robarts visitou Luanda e ficou tão impressionado com o sr. Ebo que lhe ofereceu a sua gravata. Este passou a usar essa gravata sempre que exercia funções importantes.

Durante os anos seguintes da Cruzada de Dez Anos, o sr. Ebo tornou-se um servo vigoroso da Causa.

Perseguição e Prisão


Em 1961, teve início a Guerra de Libertação. Embora os Bahá'ís angolanos seguissem rigorosamente o princípio Bahá’í de não-envolvimento em movimentos políticos, acabaram, porém, por ser vistos com desconfiança e vítimas da violência alastrava pelas várias províncias de Angola. Alguns elementos do clero católico fomentaram uma onda de desconfiança em relação aos Bahá’ís, acusando-os de serem terroristas; como consequência, a polícia decretou a proibição da Fé, e começou a prender e interrogar os Bahá’ís. Os pioneiros foram expulsos e a jovem comunidade teve de enfrentar a perseguição e a hostilidade policial.

O sr. Joaquim Sampaio, que se tinha tornado uma figura proeminente entre os Bahá’ís angolanos, foi preso durante uma noite. A sua esposa foi ameaçada e proibida de realizar reuniões Bahá’ís. O sr. Sampaio foi levado para local desconhecido e nunca mais foi visto. Acredita-se que foi executado num campo prisional na Baía dos Tigres (no Namibe); provavelmente, terá sido o primeiro mártir Bahá’í angolano.

Em Outubro de 1963, o sr. Ebo foi preso juntamente com outros Bahá’ís de Luanda (José Avelino, Isaac Miguel e Joaquim Figueiredo Gamboa). A PIDE revistou a sua casa, e confiscou livros e documentos. Os agentes da PIDE queriam saber quem era o líder Bahá’í e onde estava guardado o dinheiro (supostamente para apoiar o terrorismo). O sr. Ebo respondeu que não havia um líder, que tudo era feito em grupo, que não havia financiamento externos e tudo era pago de acordo com os seus rendimentos limitados. O sr. Ebo conseguiu salvar muitos itens preciosos, nomeadamente cartas e correspondência entre crentes e instituições Bahá’ís para futuros arquivos, colocando-os numa mala enterrando-a. Infelizmente, após as guerras e a cessação da administração Bahá’í, não foi ainda possível localizar essa mala.

O sr. Ebo e os seus companheiros Bahá’ís estiveram presos em Luanda durante seis meses, e foram posteriormente enviados para um campo prisional na Baía dos Tigres, na costa sul de Angola. Ali ficaram durante seis anos; nesse campo encontraram outros seis Bahá’ís de Malanje. Durante o cativeiro, esforçaram-se por manter o ânimo entoando orações e canções Bahá’ís que tinham memorizado; também falavam dos ensinamentos Bahá’ís, levando outros prisioneiros a aceitar a Fé.

Durante esses anos no campo prisional, o sr. Ebo cresceu espiritualmente. Os outros prisioneiros Bahá'ís viam-no como um “pai”; transmitia-lhes confiança e optimismo; afirmava que um dia seriam novamente livres e os pioneiros voltariam para os ajudar a espalhar a Fé.

O “pai” da comunidade Bahá’í


Após a libertação em 1969, o reencontro com os Bahá’ís foi pleno de alegria e emoção. Tal como o sr. Ebo dizia durante os anos na prisão, tinham chegado novos pioneiros. Seguiu-se uma nova fase na história da Fé Bahá’í em Angola. O sr. Ebo serviu novamente na Assembleia Espiritual de Luanda e foi membro da Comissão Nacional de Ensino. Destacava-se como um “pai” da comunidade. Estava sempre pronto a fazer viagens de ensino às aldeias próximas de Luanda, encorajava os crentes, compunha canções com temas Bahá’ís, dinamizava todas as reuniões e encontros Bahá’ís. Reanimou a comunidade de Malanje, transmitindo força e esperança a todos os amigos, e voltou a fazer planos para ser pioneiro em Nova Lisboa.

No início dos anos 1970, José Xavier Rodrigues escreveu ao sr. Ebo, mas a carta veio devolvida com a indicação “Já não existe”; isto deixou José Xavier profundamente consternado. Mas essa dor tonar-se-ia alegria quando viu o rosto do sr. Ebo - obviamente vivo - numa foto enviada para Portugal em 1973, por uma pioneira americana, Marvel Grey.

Ocasionalmente, o sr. Ebo recordava os anos de cativeiro com um sorriso triste, e dizia: “Não fomos muito bem tratados”, mas nunca expressou qualquer palavra de indignação.

Os anos finais


Em 1974 eclodiu a guerra civil em Angola. A violência atingiu dimensões dramáticas; as condições de vida agravaram-se para a população; vários pioneiros Bahá’ís abandonaram o país; vários crentes angolanos ofereceram-se para proteger os pioneiros nas suas famílias, oferecendo-lhe comida e abrigo. Em Outubro do ano seguinte, o último pioneiro Bahá'í abandonou Angola, sem ter podido despedir-se dos Bahá’ís angolanos, pois a comunicação na capital tinha-se tornado quase impossível.

Apesar de tudo, o sr. Ebo continuou a corresponder-se com amigos fora de Angola, falando sobre os trabalhos de ensino, a realização de Festas de Dezanove Dias, os esforços para estabelecer um Centro Bahá'í e conseguir o reconhecimento oficial da Fé Bahá’í em Angola. Numa das suas últimas cartas, escreveu que ainda estava firme na sua convicção de divulgar os ensinamentos e que a sua meta era a adesão quinhentos almas para que a comunidade Bahá’í conseguisse o reconhecimento oficial.

João Lucala (Angola), Rafael Mafuiani (Moçambique) e Antonio Francisco Ebo (Angola)
Convenção Bahá'i na Suazilândia (1976)

O sr. António Francisco Ebo abandonou este mundo no dia 17 de Abril de 1977, após uma breve doença. Teve um funeral Bahá'í onde se reuniram vários crentes angolanos. Ao saber do seu falecimento, a Casa Universal de Justiça escreveu em 7 de junho de 1977, expressando a esperança de que a sua vida possa ser uma fonte inspiração para os amigos Bahá’ís em Angola.

Que assim seja!

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FONTES:
Heroes and Heroines of the Ten Year Crusade in Southern Africa, Lowell Johnson e Edith Johnson
The Bahá’í World, vol. XVII, pags. 432-433

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