sábado, 9 de setembro de 2023

Os Políticos e a Política Divina

Por David Langness.



Ora Deus não é injusto. Não se esquece do vosso trabalho nem do amor que mostraram por ele, ao atenderem, como ainda atendem, às necessidades dos outros irmãos na fé. (Hebreus 6:10)

Cada um, como bom administrador dos bens de Deus, ponha à disposição dos outros a graça que dele recebeu. (1 Pedro 4:10)

Os melhores dos homens são aqueles que servem o povo; os piores dos homens são aqueles que prejudicam o povo. (Alcorão 59:9)

Isto é adoração: servir a humanidade e responder às necessidades do povo. ('Abdu'l-Bahá, Paris Talks, p. 177)

Vou contar-vos uma história verdadeira de um amigo meu que queria servir os outros e acabou por se tornar um líder político.

Este meu amigo – vou mantê-lo no anonimato para proteger sua privacidade - dedicou toda a sua carreira ao serviço público. Iniciou a sua vida profissional como professor idealista e altruísta, pois acreditava que a educação poderia transformar a sociedade. Depois de ter visto, com os seus próprios olhos, as más condições nas escolas das cidades do interior dos Estados Unidos, começou a trabalhar nas bases de um sindicato de professores, na esperança de encontrar formas de melhorar essas condições. Os dirigentes sindicais viram nele uma promessa, e ele rapidamente tornou-se um dos líderes da organização. A partir dessa posição, ele decidiu concorrer a um cargo apartidária no conselho escolar local. Foi eleito. Carismático, inteligente e atencioso, realizou um excelente trabalho nesse conselho, encontrando maneiras de melhorar as escolas do seu distrito e destacando-se no processo.

Outras pessoas viram-no como promissor, e pediram-lhe que concorresse a um cargo na legislatura do estado. Ele perdeu a primeira eleição – mas dois anos depois, concorreu novamente, agora com experiência em financiamentos e debates políticos, e venceu. Com trinta e poucos anos, ele tornou-se um deputado estadual. Trabalhou muito nas suas funções, apresentou propostas de leis inovadoras que, pensava ele, criariam mais imparcialidade e justiça na educação e na sociedade, e até conseguiu que algumas dessas leis fossem aprovadas. Na base do seu sucesso, e devido à sua energia ilimitada, à sua defesa consistente dos menos afortunados e à sua capacidade de se relacionar com pessoas de ambos os partidos políticos, os seus pares elegeram-no para líder da legislatura. De repente, juntamente com o governador do estado, ele tornou-se um dos seus dois mais poderosos líderes eleitos.

A cada passo do seu caminho, o meu amigo enfrentava cada vez mais pressões políticas. Os riscos aumentavam, assim como a natureza crítica das decisões que tinha de tomar. Certa vez, confidenciou-me que o seu trabalho era como uma panela de pressão intensa, com exigências cada vez maiores de tempo, de diplomacia e de ética. Disse que enfrentou decisões incrivelmente difíceis, e a sua posição como líder envolviam-no num constante turbilhão de controvérsias. As decisões difíceis que tomava irritavam alguns e agradavam a outros. Tentou fazer o melhor que podia, mas rapidamente descobriu que forças poderosas e bem financiados – a comunidade empresarial e industrial, os sindicatos, vários interesses económicos, partidos políticos, indivíduos e grupos ricos – apostavam na sua derrota nas próximas eleições. Porquê? Um antigo apoiante disse-lhe: “Você é demasiado ético”.

E para resumir esta longa e complexa história, basta dizer que o meu amigo já não ocupa cargos políticos. Ele poderá voltar a entrar num combate político, mas por enquanto decidiu afastar-se, e trabalhar no sector privado. Perguntei-lhe o que tinha aprendido com a experiência. Ele disse, citando Winston Churchill: “A democracia é a pior forma de governo, com excepção de todas as outras”.

Certamente muitas democracias ocidentais - incluindo os governos estaduais e federais do meu país natal, os Estados Unidos - têm muitas coisas boas; mas também são permeáveis à influência corrupta das forças financeiras. O meu amigo tentou, nesse ambiente, ser um catalisador ético para a justiça e a equidade; mas, no topo da pirâmide do poder, num Estado grande e diversificado, encontrou dificuldades quando confrontado com a tremenda influência e pressão de vários grupos de interesses.

Os ensinamentos Bahá’ís reconhecem essa realidade e elogiam os líderes que a combatem interna e externamente:

Os defeitos dos reis, tal como os seus favores, podem ser grandes. Um rei que não é dissuadido pela vanglória do poder e da autoridade de respeitar a justiça, nem está privado dos esplendores do sol da equidade pelo luxo, riqueza, glória ou pela organização de exércitos e legiões, terá uma posição elevada e uma condição sublime entre a Assembleia no alto. Cabe a todos oferecer ajuda e manifestar bondade a uma alma tão nobre. Bem-aventurado o rei que mantém firmes as rédeas da sua paixão, domina a sua raiva, e prefere a justiça e a imparcialidade à injustiça e à tirania. (Tablets of Baha’u’llah, Words of Paradise, p. 65)

O governo e a administração pública, como todos os sectores da sociedade, atraem uma vasta gama de motivações humanas. Alguns líderes políticos entram neste campo por motivos egoístas, e alguns entram por motivos altruístas, tentando servir a humanidade. É claro que ninguém pode conhecer completamente as motivações de alguém além do próprio, e por isso os ensinamentos Bahá’ís aconselham-nos a abster-nos de julgar alguém:

Todas as religiões ensinam que devemos amar-nos uns aos outros; que devemos olhar para as nossas próprias falhas antes de ousarmos condenar as falhas dos outros, que não devemos considerar-nos superiores aos nossos semelhantes! Devemos ter cuidado para não nos exaltarmos para não sermos humilhados. Quem somos nós para julgar? Como saberemos quem, aos olhos de Deus, é o homem mais íntegro?

...A única diferença real é esta: existem homens celestiais e homens terrenos; servos abnegados da humanidade no amor do Altíssimo, trazendo harmonia e unidade, ensinando paz e boa vontade aos homens. Por outro lado, existem aqueles homens egoístas, que odeiam os seus irmãos, em cujos corações o preconceito substituiu a bondade amorosa, e cuja influência gera discórdia e conflito…

A minha esperança é que neste século iluminado a Luz Divina do amor irradie o seu brilho sobre o mundo inteiro, procurando a inteligência do coração receptivo de cada ser humano; que a luz do Sol da Verdade leve os políticos a livrarem-se de todas as declarações de preconceito e superstição, e com mentes libertas sigam a Política de Deus: pois a Política Divina é poderosa, e a política do homem é fraca! (‘Abdu’l-Bahá, Paris Talks, pp. 147-150)

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Texto original: Politicians and the Divine Policy (www.bahaiteachings.org)


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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site BahaiTeachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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