sábado, 17 de maio de 2025

Lidar com as minhas emoções enquanto a morte me aguarda

Por Mahin Pouryaghma.

Enquanto escrevo este texto no meu lar de idosos, após o meu diagnóstico de cancro no nível 4, estou a sentir-me abençoada porque a pior dor do cancro ainda não me atingiu, e estou a viver uma vida normal. Louvado seja o Criador!

Mas hoje sinto-me tão triste! À medida que envelhecemos e nos aproximamos da nossa transição para o outro mundo, somos frequentemente atormentados por testes e provações mentais e físicas muito difíceis.

Aqui no lar de idosos, estou a fazer novas amizades. Estamos todos na mesma fase das nossas vidas físicas, por isso temos muito em comum. Nas últimas semanas, eu e alguns amigos meus almoçamos juntos no refeitório para os residentes em “cuidados especiais” – o que inclui aqueles que sofrem de demência em diferentes graus. A minha nova amiga, a mulher mais próxima de mim e paciente de cuidados especiais, é muito instruída, deu aulas na faculdade, fala francês e inglês e até escrevia uma coluna para os jornais.

Nos seus dias lúcidos, tínhamos óptimas conversas, mas durante os últimos dois dias a sua raiva, frustração, paranoia e agressividade com os cuidadores aumentou perigosamente. Foi relatado que ela estava a falar em suicídio ou talvez em agredir outras pessoas. Assim, hoje almocei com ela, esperando ser útil.

Ao almoço, ela não foi hostil ou indelicada comigo, mas comportou-se dessa forma com todos os outros. Depois de ter regressado da consulta médica esta tarde, disseram-me que ela tinha sido transferida para um hospital psiquiátrico, com a expectativa de lá ficar alguns meses, ou talvez para sempre. O lar de idosos onde resido agora não consegue lidar com os tipos de problemas que estão a ocorrer na sua mente.

Estes tipos de problemas mentais, juntamente com as inevitáveis doenças físicas que acompanham a idade, geralmente afectam os idosos nas últimas fases das nossas vidas físicas, e podem trazer-nos as maiores provações psicológicas e espirituais.

No entanto, sinto-me confortada pelo facto de os ensinamentos Bahá’ís se referirem a estas provações como doenças puramente mentais e físicas. Bahá’u’lláh, quando questionado sobre tais enfermidades e os seus efeitos na alma, afirmou:

Perguntaste-Me se o homem, para além dos Profetas de Deus e dos Seus eleitos, após a sua morte física, manterá a mesma individualidade, personalidade, consciência e compreensão que caracterizam a sua vida neste mundo. Se for este o caso, como é que, observaste, que ferimentos tão ligeiros nas suas faculdades mentais, como desmaios e doenças graves, o privam da sua compreensão e consciência, a sua morte, que deve incluir a decomposição do seu corpo e a dissolução dos seus elementos, é impotente para destruir esse entendimento e extinguir essa consciência? Como pode alguém imaginar que a consciência e a personalidade do homem se manterão, quando os próprios instrumentos necessários à sua existência e função estarão completamente desintegrados?

Sabe que a alma do homem está enaltecida acima e é independente de todas as enfermidades do corpo ou da alma. O facto de uma pessoa doente apresentar sinais de fraqueza deve-se aos obstáculos que se interpõem entre a sua alma e o seu corpo, pois a própria alma permanece inalterada por quaisquer enfermidades corporais. Considera a luz da lâmpada. Embora um objeto externo possa interferir com o seu brilho, a própria luz continua a brilhar com um poder inalterado. Da mesma forma, toda a doença que aflige o corpo do homem é um obstáculo que impede a alma de manifestar a sua força e poder inerentes. Quando abandona o corpo, porém, evidenciará um tal ascendente e revelará uma tamanha influência que nenhuma força na terra pode igualar. Toda a alma pura, refinada e santificada estará dotada com um enorme poder e regozijar-se-á com uma imensa alegria. (Gleanings, LXXX)

Estou feliz por ser este o caso, embora me sinta intensamente triste, incapaz de a voltar a ver e nem sequer de me despedir dela. Vou sentir muito a sua falta, e sinto que este lugar sem ela não será o mesmo para mim.

Mas agora: é tempo de pânico para mim! Esta noite, senti dores no lado direito do abdómen, exactamente onde, se for devido a um cancro no fígado, provavelmente se manifestaria. Depois tomei alguns medicamentos ligeiros de venda livre e a dor desapareceu quase completamente. A dor pode dever-se a problemas no meu cólon ou estômago, e como a dor não aparece de forma consistente e permanece comigo, então sei que o meu pânico é em vão.

Percebo que a minha luta é comigo mesma.

Aqui, chegando ao fim da minha existência física, digo a mim mesma que estou pronta para tudo e confiando apenas na Vontade de Deus - e, no entanto, temo a dor do cancro. Então, estou verdadeiramente a confiar em Deus ou não estou realmente a confiar n’Ele? Este não é um lugar emocional ou espiritual confortável para mim. As minhas emoções estão a brincar comigo, colocando-me num ciclo de medo e aceitação.

Apesar de tudo isto, percebo que sou muito abençoada por ter a força da minha mente racional, que me ajuda a evitar imaginações vãs e ociosas. Espero manter-me firme na minha crença de que o Criador cuidará de mim até ao último suspiro, como Ele fez durante toda a minha vida, e moderar a oscilação das minhas emoções.

As minhas emoções!

Por todas estas razões, sinto-me tão sozinha esta noite e apetece-me chorar. Sei que estes sentimentos passarão rapidamente, e voltarei a ser eu própria. Vou sair do meu quarto e provocar os outros residentes e cuidadores com as minhas piadas.

E isto fez-me lembrar outra coisa: tenho um plano maravilhoso para a minha viagem de regresso a casa. Já comprei o meu caixão, e é lindo, mas agora mudei de ideias e quero trocá-lo pela versão dupla. A razão? Bem, eu sei que é um longo caminho daqui até ao outro mundo, e não quero passar fome no caminho, por isso vou encher o resto do caixão com muitos chocolates, talvez uma pizza grande de massa grossa com tudo lá dentro, e um grande copo de gelado Oreo Blizzard.

Obrigado por me ouvirem. Agora estou a sentir-me muito melhor e vou provocar os outros.

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Texto original: Dealing with My Emotions as Death Awaits (www.bahaiteachings.org)


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Mahin Pouryaghma, tem quase 87 anos, e é iraniana. Desde 1964 que vive na América do Norte e actualmente vive em Marshallville, Geórgia. Mahin comprometeu-se com a Fé Bahá’í desde os seus 30 anos, com o objectivo de servir Deus servindo a humanidade.

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