quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

Kitáb-i-Iqán (13)

A Cidade de Deus

A expressão Cidade de Deus remete-nos imediatamente para a obra de Stº Agostinho. Nesse livro, o Bispo de Hipona descreve a história da humanidade como um conflito entre a Cidade de Deus (constituída pelos que abdicam dos prazeres mundanos e se dedicam à promoção dos valores cristãos) e a Cidade dos Homens (constituída pelos que se afastaram da Cidade de Deus). Tratam de representações figurativas das reacções e comportamentos humanos face à revelação divina.

St. Agostinho (354-430 EC) tem a sua visão da Cidade de Deus descendo do Céu.Mas a expressão "Cidade de Deus" também é usada com alguma frequência para descrever um Manifestante de Deus e os Seus ensinamentos. Compreende-se facilmente a analogia: tal como as cidades foram centros de desenvolvimento material das civilizações, também cada Profeta com os Seus ensinamentos foram sementes de desenvolvimento espiritual das civilizações.

E assim encontramos referências a uma "cidade espiritual" nas Escrituras Sagradas e em místicos do Islão. Os salmos mencionam a Cidade do Senhor dos Exércitos(48:9); S. Paulo refere-se à "Jerusalém, lá do alto, é livre, e esta é nossa mãe." (Gal 4:22-26) que não é cativa em contraposição a uma Jerusalém física que estava cativa dos Romanos. O livro do Apocalipse anuncia o aparecimento de uma "nova Jerusalém" (21:2). No Mathnavi de Rumi podemos ler: "Nesta cidade dos eventos ele é o Senhor, neste reino Ele é o Rei que planta todos os eventos" (XVI).

No Kitáb-i-Íqán, Bahá'u'lláh refere-Se em termos poéticos à Cidade de Deus (a). Ela é o alvo de qualquer pessoa que procura aprofundar a sua ligação com o Criador, é o centro de todo o conhecimento divino que um ser humano pode alcançar, e renova-se ciclicamente. Essa cidade não está reservada a alguns eleitos; esteve sempre disponível para toda a humanidade. Nas Suas palavras:
Essa Cidade não é senão o Verbo de Deus revelado em cada era. No tempo de Moisés, foi o Pentateuco; no de Jesus, o Evangelho; no de Maomé, o Mensageiro de Deus, o Alcorão; neste dia, o Bayán, e na era d'Aquele que Deus tornará manifesto, o Seu próprio Livro - Livro esse ao qual todos os Livros das eras anteriores se devem referir, o Livro que sobressai entre todos eles, transcendente e supremo.[219]
Neste parágrafo Bahá'u'lláh mostra-nos duas coisas. Em primeiro lugar, mostra-nos que o objectivo final de tantos místicos e peregrinos, a chave da transformação dos corações, os alicerces de novas civilizações, se encontra nas Escrituras Sagradas de todas as religiões. Em segundo lugar, reafirma a continuidade da revelação divina. Também 'Abdu'l-Bahá confirmaria a interpretação esta expressão: "Por «aquela grande cidade, a sagrada Jerusalém, descendo do céu vinda de Deus» pretende-se significar a Lei Sagrada de Deus, e esta está exposta em muitas Epístolas e ainda se pode ler nas Escrituras dos Profetas do passado"(b).

O uso desta expressão - com toda a sua carga simbólica anteriormente descrita - é recorrente nas escrituras Bahá'ís. Nos Sete Vales, a expressão "Cidade de Deus" é usada para descrever o objectivo da caminhada de todos os peregrinos que procuram Deus. Na Epístola aos Judeus, Bahá'u'lláh usa este termo para Se referir à Sua própria revelação:
Diz: Este é o Dia em que a Cidade de Deus apareceu e é vista com todos os seus adornos. Esta é a cidade em que o Deus de tudo se tornou manifesto. Reflecti sobre as palavras de João em que ele profetizou sobre a Cidade Santa: "E não vi cordeiro no seu interior, pois o Senhor Deus Omnipotente é o Templo. E a cidade não tinha necessidade de sol, nem de lua, que ali brilhassem, pois a Glória de Deus (Bahá'u'lláh) iluminava-a".

Tomai o bordão da renúncia em nome de Deus e guiai o povo errante, com total ruptura, à Cidade de Deus, para que porventura os que se perderam possam alcançar a verdadeira terra natal e os cegos possam receber uma visão perspicaz. Em verdade, Ele é Poderoso para fazer o que deseja. Todas as coisas estão nas mãos do Seu Poder. Em verdade, Ele é o Grandioso!
(c)
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NOTAS:
(a) - Ver também:
A Study of Baha'u'llah's Kitab-i-Iqan, The Book of Certitude
(b) - Selections from the
Writings of 'Abdu'l-Baha, p. 165
(c) - Citado em Bahá’í Scriptures, nº 47

5 comentários:

Anónimo disse...

Lindo o teu post e muito elucidativo!

João Moutinho disse...

Aterrei agora no "Povo de Bahá", vá lá já deixamos os cartoons.

. disse...

Só te digo que em muitas coisas que disseste, concordo contigo. É bom saber que não te situas entre os críticos que andam por aí, a coberto de peles de ovelhas, e que no fundo são verdadeiramente intolerantes contra os que acusam de ser OS intolerantes. Não serão esses também fundamentalistas?

Marco Oliveira disse...

Tens razão, Estrelinha.
Anda tanta gente aos gritos com as suas críticas que ainda corremos o risco de não nos conseguirmos ouvir uns aos outros.

Anónimo disse...

Hola!!

Te escribo desde Concepción, Chile, te felicito por tu blog. Estamos en contacto