sábado, 29 de junho de 2024

Será que Deus existe?

Por David Langness.
 

Será que Deus existe? A ciência, porque lida com o mundo material, não pode responder a esta questão – mas cada um de nós pode testemunhar a existência da criação. Será que este facto óbvio implica que também existe um Criador?

Este grande mistério – facilmente o assunto mais proeminente na longa história da filosofia humana – levou as pessoas a explorar intensamente o assunto durante milhares de anos.

Em última análise, este discurso contínuo levou a maioria dos grandes pensadores da história à conclusão de que só poderiam abordar a existência de um Criador através de provas fundamentadas, sem confiar apenas na autoridade das Escrituras. Utilizando esta abordagem filosófica puramente racional, chegamos a alguns argumentos muito persuasivos e penetrantes a favor ou contra a existência de um Ser Supremo, geralmente categorizados de quatro formas: cosmológico, moral, ontológico e teleológico.

Nesta exploração do assunto, vamos cingir-nos apenas a uma destas categorias, a prova ontológica da existência de um Criador. A palavra ontologia, a ciência do que realmente existe e tem existência, provém das palavras gregas ontos, que significa ser; e logia, que significa lógica – logo, a lógica do ser.

Muitos filósofos ocidentais, começando por Sócrates, Aristóteles e Platão, abordaram esta grande questão. Mais tarde, Anselmo, Descartes, Liebniz e uma multidão de outros opinaram com as suas versões e sugeriram aperfeiçoamentos da prova ontológica. Mas o lendário e influente filósofo islâmico Mulla Sadra, na sua principal obra filosófica al-asfar al-arba’a (Quatro Jornadas), apresentou uma das provas ontológicas mais conhecidas e logicamente consistentes da existência de um Criador, a que chamou o Argumento dos Justos. É assim:
  • Temos a existência; e não podemos conceber uma existência mais perfeita
  • Por definição, Deus é a perfeição personificada
  • A existência é una – o que significa que não existe pluralismo metafísico
  • A existência tem níveis de perfeição
  • A escala da perfeição deve ter um ponto limite, um ponto de maior intensidade
  • Essa maior intensidade, por definição, é Deus.
Acontece que, desde Mulla Sadra, a maioria das provas ontológicas da existência de um Ser Supremo centram-se em torno deste ponto subtil e poderoso, que envolve a imperfeição e a perfeição.

Afinal – se alguma coisa é imperfeita, isso não implica a existência da perfeição?

Se vemos uma cadeira frágil, por exemplo, com apenas três pernas e o assento partido, compreendemos imediatamente as imperfeições da cadeira. Podemos ver imediatamente a sua óbvia falta de utilidade como cadeira funcional. Mas só podemos fazer este julgamento porque a nossa mente contém o conceito de uma cadeira perfeita, que inclui as quatro pernas e, portanto, é completa, íntegra e funcional em todos os aspetos. Da mesma forma, dizem os ensinamentos Bahá’ís, a própria existência da imperfeição prova a existência da perfeição a todos os níveis da criação:

...todos os seres criados são limitados, e esta mesma limitação de todos os seres prova a realidade do Ilimitado; pois a existência de um ser limitado denota a existência de um Ser Ilimitado. (Selections from the Writings of Abdu’l-Baha, #21)

À primeira vista, isto pode parecer um argumento obscuro e abstrato, mas tem uma lógica interna inegável:

É possível que o trabalho manual seja perfeito e o artesão imperfeito? Será possível que uma pintura seja uma obra-prima e o pintor seja imperfeito no seu ofício, apesar de ser o seu criador? Não: a pintura não pode ser como o pintor, caso contrário ter-se-ia pintado a si própria. E por mais perfeita que seja a pintura, em comparação com o pintor é totalmente imperfeita.

Assim, o mundo contingente é a fonte das imperfeições e Deus é a fonte da perfeição. As próprias imperfeições do mundo contingente testemunham as perfeições de Deus. Por exemplo, quando consideramos o homem, vemos que ele é fraco, e esta mesma fraqueza da criatura implica o poder d’Aquele que é Eterno e Todo-Poderoso; pois se não fosse o poder, a fraqueza não poderia ser imaginada... Sem poder não poderia haver fraqueza. Esta fraqueza torna evidente que existe um poder no mundo.

...É certo que todo o mundo contingente está sujeito a uma ordem e a uma lei que nunca poderá desobedecer. Até o homem está forçado a submeter-se à morte, ao sono e a outras condições – isto é, em certos assuntos ele é compelido, e esta mesma compulsão implica a existência d’Aquele Que é Todo-Dominante. Enquanto o mundo contingente for caracterizado pela dependência, e enquanto esta dependência for um dos seus requisitos essenciais, deve haver Alguém que, na Sua própria Essência, seja independente de todas as coisas. ('Abdu’l-Bahá, Some Answered Questions, newly revised edition, cap. 2)

Assim, como salientam os ensinamentos Bahá’ís, as dualidades essenciais que existem em toda a vida – fraqueza e força, dependência e independência, impotência e poder, e assim por diante – tornam óbvio que a escala da perfeição deve culminar naquilo a que chamamos o Criador.

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Texto original: Does God Exist? (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site BahaiTeachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.


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