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Aleksandr Nikolayevich, conhecido nos livros de história como Czar Alexandre II, era o filho mais velho do Grão-Duque Nikolay Pavlovich (Nicolau I) e de Alexandra Fyodorovna. A sua infância e juventude foram vividas sob a personalidade dominante e autoritária do pai, e pelos incentivos da mãe ao seu desenvolvimento moral e intelectual. Alexandre sobiu ao trono em Fevereiro de 1855, em plena Guerra da Crimeia. A derrota russa nessa guerra provocou entre a elite militar um enorme desejo de mudança; a este desejo o novo Czar respondeu com uma série de reformas destinadas a modernizar o país e a colocá-lo entre os mais avançados do mundo.
Logo após a assinatura do tratado de paz em Paris (1865), Alexandre II lançou um programa de construção de linhas de caminho de ferro (foram construídos mais de 20.000 km durante o seu reinado); estas infra-estruturas fizeram despertar a economia numa sociedade que até então era predominantemente agrícola e feudal. Uma outra medida de modernização foi a abolição da servidão; a Acta da Emancipação publicada, de 1861, concedeu liberdade pessoal a dezenas de milhões de pessoas. Esse acto foi classificado por alguns historiadores como "a maior revolução social desde a revolução francesa". No entanto, isso só por si não permitiu o surgimento de uma nova classe de camponeses proprietários.
Foi também criado um sistema judicial comparável aos ocidentais; as reformas administrativas do estado levaram à criação de assembleias eleitas a nível local; os poderes dessas assembleias permitiram algumas melhorias no bem-estar social (educação, cuidados básicos de higiene e saúde e redução do analfabetismo). A reestruturação do exército em 1874 introduziu o recrutamento obrigatório, fazendo com que os jovens de todas as classes sociais prestassem serviço militar.
Alguns prisioneiros políticos foram libertados e foi permitido o regresso de exilados na Sibéria; foram também atenuadas as perseguições às minorias étnicas e religiosas do Império, e aboliram-se os castigos corporais. Como consequência destas tímidas reformas políticas, na Polónia surgiram manifestações nacionalistas. Mas Alexandre II não era propriamente um liberal. Continuou a reger-se por métodos autocráticos, convencido que seu poder tinha origem divina; a própria Rússia não parecia estar preparada para um governo constitucional ou representativo. Após escapar a um atentado em 1866, Alexandre II tomou medidas repressivas. Em 1877, entra em guerra com o Império Otomano (que já estava em guerra com a Sérvia); após uma série de derrotas iniciais, o exército russo acaba por triunfar e alcançar o mar de Marmara. Como consequência dessa guerra, a Bulgária separa-se do jugo Otomano e torna-se independente[1].
Em 1879, o ressurgimento do terrorismo revolucionário foca-se na pessoa do próprio Czar; Alexandre II foi alvo de vários atentados e respondeu com novas medidas ainda mais repressivas. Em 13 de Março de 1881, quando, após muitas hesitações, decidiu proclamar uma nova constituição (que conciliava algumas opiniões politicamente moderadas), foi assassinado num atentado à bomba.
Alguns historiadores descrevem Alexandre II simultaneamente como déspota e autor da modernização da Rússia no séc. XIX (apesar de nem todas as suas reformas terem sido bem sucedidas). Foi ele que abriu as portas para o declínio do imperialismo russo na Ásia: a venda do Alasca aos EUA (1867) foi "compensada" pela aquisição de territórios na China, pela fundação de Vladivostok como capital do extremo oriente (1860), pela subjugação definitiva do Cáucaso (1860’s) e pela conquista da Ásia Central (1870’s).
Os Bahá'ís e a Rússia
A Pérsia do século XIX, vivia sobre pressão britânica e russa. Já aqui referi como uma série de eventos que rodearam o surgimento da religião Babí não passou despercebido aos representantes diplomáticos russos e britânicos. Alguns crentes chegaram a refugiar-se na Rússia quando as perseguições se acentuavam na Pérsia; foi também na Rússia, na cidade de Isqabad[2], que se construiu o primeiro templo baha'i.
O Templo Bahá'í de Isqabad, na Rússia
No entanto, Bahá'u'lláh preferiu ficar em Teerão. Nos meses que se seguiram, Ele foi encarcerado na tristemente célebre Syha-Chal (em português, "o fosso escuro"). A atitude do embaixador russo foi recordada durante muito tempo, como um acto de generosidade para com o Fundador da religião baha’i.
A EPÍSTOLA DE BAHÁ'U'LLÁH
O Czar Alexandre II foi um dos foi um dos monarcas a quem Bahá'u'lláh dirigiu uma epístola. Essa missiva, em língua árabe, foi revelada durante o exílio em ‘Akká; o tom dessa epístola é semelhante de outras epístolas reveladas para outros reis e governantes do Seu tempo[3]. No texto Bahá'u'lláh anuncia abertamente a Sua condição e missão de Profeta, identifica-Se como o Pai Celestial e apela ao monarca para que aceite a nova Causa Divina.
Alguns excertos dessa epístola:
Nunca houve resposta do Czar.Ó Czar da Rússia! Dá ouvidos à voz de Deus, o Rei, o Santíssimo, e volve-te para o Paraíso, Lugar onde habita Aquele que, entre a Assembleia no Alto, possui os mais excelsos títulos e que, no reino da criação, é chamado pelo Nome de Deus, o Esplendoroso, o Todo-Glorioso. Acautela-te para que o teu desejo não te impeça de te volveres para a face do teu Senhor, o Compassivo, o Mais Misericordioso. Nós, em verdade, ouvimos aquilo que suplicaste ao teu Senhor enquanto comungavas secretamente com Ele. Por conseguinte, as brisas da Minha misericórdia agitaram-se e o mar da Minha mercê encapelou-se, e Nós respondemo-te, em verdade. O teu Senhor, verdadeiramente, é o Omnisciente, o Sapientíssimo. Enquanto Eu estava acorrentado e algemado na prisão, um dos teus ministros estendeu-Me o seu auxílio. Por esse motivo, Deus ordenou-te uma posição que o conhecimento de pessoa alguma pode compreender, salvo o Seu conhecimento. Guarda-te de desprezar essa posição sublime...
Acautela-te para que a tua soberania não te prive Daquele que é o Soberano Supremo. Em verdade, Ele veio com o Seu Reino, e todos os átomos clamam em voz alta: "Eis! O Senhor veio na Sua grande majestade!" Aquele que é o Pai já veio, e o Filho[4], no vale santo, exclama: "Eis-me, eis-me, ó Senhor meu Deus!" enquanto Sinai circula ao redor da Casa e a Sarça Ardente clama: "Veio o Todo-Generoso, montado sobre as nuvens! Bem-aventurado quem Dele se aproximar, e ai dos que estão afastados".[5]
Levanta-te entre os homens em nome desta Causa irresistível e convoca, então, as nações a Deus, o Excelso, o Grande. Não sejas dos que invocaram Deus por um dos Seus Nomes mas que, ao aparecer Aquele que é Objecto de todos os nomes, O negaram e Dele se afastaram, e, por fim, decretaram a Sua condenação, com injustiça manifesta. Considera e recorda os dias em que apareceu o Espírito de Deus[6], e Herodes O condenou. Deus, porém, ajudou-O com as hostes do invisível, protegeu-O com a verdade, e mandou-O para outra terra, segundo a Sua promessa. Ele, em verdade, ordena o que Lhe apraz. O teu senhor preserva, verdadeiramente, a quem Ele deseja, quer se ache no meio dos mares, na garganta da serpente ou debaixo da espada do opressor...[7]
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NOTAS
[1] - A guerra Russo-Otomana é descrita por Eça de Queirós nas Cartas de Inglaterra e Crónicas de Londres. Eça manifestava um enorme desprezo político pelo Czar e pelo Sultão e não escondia a sua simpatia pelo povo russo.
[2] - A cidade de Isqabad pertence hoje ao Turquemenistão. O templo em causa foi confiscado após a revolução soviética e posteriormente destruído por um terramoto nos anos 30.
[3] - Ver Epístolas a Napoleão III, à Rainha Vitória, ao Kaiser Guilherme I, ao Imperador Francisco José e ao Papa Pio IX.
[4] - Jesus
[5] – Note-se as imagens utilizadas por Bahá'u'lláh para mostrar que Ele é o Prometido de todas as religiões.
[6] - Jesus
[7] - O texto completo desta epístola encontra-se na Baha'i Reference Library.
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