domingo, 15 de junho de 2008

Caçar humanos

Tradução do artigo Hunting Humans, da autoria de Nema e publicado no Iranian.com
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Sob a sombra da questão nuclear, a situação dos direitos humanos no Irão deteriorou-se de forma constante. Os adeptos da linha dura exploraram os receios de um conflito com os Estados Unidos para marcar a reforma como uma conspiração estrangeira contra o Islão. Na semana passada[14-Maio-2008], a detenção de sete líderes da pacífica minoria Baha'i – um bode expiatório do regime clerical – foi um desenvolvimento ameaçador.

O Canadá condenou prontamente as detenções, um acto consistente com a sua liderança nas resoluções das Nações Unidas sobre direitos humanos no Irão, nas quais os Baha’is aparecem destacados. Mas as detenções têm um significado mais amplo, pois uma tal perseguição é um teste à tolerância sob uma constituição teocrática que condiciona a condição dos direitos humanos à filiação numa religião aprovada.

As recentes detenções fizerem surgir o espectro da perseguição sistemática aos líderes Baha’is sob acusações de heresia durante os primeiros anos da República Islâmica. Um relatório de 1985 das ONU caracterizava esta inquisição religiosa como genocida. As vítimas incluíram Mona Mahmudnizhad, uma adolescente cujo “crime” era ter dado aulas a crianças baha’is que tinham sido expulsas da escola por motivos religiosos.

Omid Tavakoli é um residente em Ottawa, cujo pai é um dos que foram recentemente presos, nada sabe sobre o seu paradeiro e teme que ele tenha sido torturado. A avaliar pelo caso Zahra Kazemi, que deu aos canadianos um vislumbre das famosas prisões de Teerão, os seus receios são bem fundamentados.

Segundo o Artigo 13 da Constituição, os 350.000 Baha’is do Irão não são reconhecidos como uma minoria religiosa legítima, ao contrário dos Judeus, Cristãos e Zoroastrianos do país. Segundo os clérigos da linha dura, isto confina-os à condição de "infiéis" sem protecção legal.

Esta interpretação radical da sharia é claramente contrária às obrigações do Irão, uma vez que Teerão é signatária de convenções da ONU sobre direitos humanos. Também é contrária à visão de respeitados académicos muçulmanos que consideram a liberdade religiosa um princípio fundamental do Alcorão. A política iraniana de intolerância revela a face de um regime que manipula cinicamente o Islão como instrumento de poder e usa a propagação do ódio para legitimar a sua governação autoritária.

Contrastando com as reformas do tempo de Mohammed Khatami, a administração do Presidente Mahmoud Ahmadinejad intensificou a propaganda de ódio contra os Baha’is nos media controlados pelo governo, onde são demonizados como agentes russos, britânicos, imperialistas americanos, para não falar no Sionismo e até no Wahabismo. Um relatório de 2007 da ONU, elaborado pela relatora paquistanesa Asma Jahangir revelou que o Ministério da Segurança tem estado a recolher informação detalhada sobre os baha’is em todo o Irão. As ameaças de morte, os ataques, as profanações de cemitérios e locais de adoração, a negação de pensões e educação universitária, a hostilização de crianças [de famílias] baha’is nas escolas, tudo isto indicia uma campanha concertada para estrangular esta comunidade no país onde nasceu.

Tal como a repressão dos reformistas islâmicos, dos advogados de direitos humanos, intelectuais, movimentos estudantis, grupos de mulheres sindicatos, e de outros elementos que apelam à construção de um Irão pacífico e aberto, a perseguição aos Baha’is é, acima de tudo, uma medida do desespero do próprio regime. Um governo que tem legitimidade e trabalha para os direitos e bem-estar dos seus cidadãos não necessita de medidas extraordinárias para eliminar minorias do seu seio. E o que é mais trágico é a traição a uma civilização com mais de 2500 anos que atingiu os picos da prosperidade devido à sua capacidade de abraçar o pluralismo e a diversidade.

Existem sinais de esperança, porém, quando os iranianos comuns rejeitam as mentiras com que têm sido alimentados ao longo dos últimos 30 anos pela liderança clerical. Para dar apenas um exemplo, a recente expulsão de um estudante Baha’i de um liceu, provocou um protesto expontâneo de estudantes muçulmanos, revoltados com o facto de um dos seus colegas estar a ver negado o direito à educação apenas devido a motivos religiosos. Existem cada vez mais apelos para que eminentes advogados de direitos humanos, como a Prémio Nobel Shirin Ebadi, a favor de uma Constituição em que todos os cidadãos gozem dos mesmos direitos, independentemente das suas crenças religiosas.

Enquanto os iranianos comuns enfrentam os males do declínio económico, corrupção e repressão por entre o surgimento de uma cultura pós ideológica, muitos questionam a descrição dos Baha’is como fonte de mal. A liderança iraniana tem uma escolha. Ou liberta os baha’is detidos e respeita os seus direitos humanos básicos, ou persiste em proclamar cinicamente uma teologia medieval impotente que confirmará a sua irrelevância e apressará a sua morte.

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