sábado, 7 de maio de 2016

O Irão parece ter um rumo; mas os Bahá'ís continuam sem saída.

Discriminação e expulsões das universidades continuam a prejudicar a vida desta minoria religiosa.


Por Shabnam Moinipour.

"Meninas, vamos sair do Irão", disse o meu pai de uma forma calma, mas firme.

Tinha apenas 14 anos quando os meus pais nos sentaram (a mim e às minhas duas irmãs) para dar a notícia. Adorávamos o nosso país e não conseguíamos perceber porque é que os nossos pais tomavam aquela decisão. Mas naquela idade "ir a outros lugares" era tão apelativo, que não me opus. Pensei que iríamos voltar. Mas nunca voltámos.

Como Bahá'ís, os meus pais acreditavam na importância da educação, especialmente para as meninas, pois as mulheres são as primeiras educadoras da próxima geração. A minha mãe tinha lágrimas nos olhos quando nos contou a forma como a sua própria educação tinha sido interrompida em 1979, quando estava a realizar os seus exames universitários.

A Revolução Islâmica tinha começado e depois disso todos os Bahá'ís foram expulsos da universidade e outros estudantes foram impedidos de entrar - uma prática que continua até hoje. A minha mãe pertencia à primeira geração de Bahá'ís a quem tinha sido negado o acesso à educação como política de Estado. Os meus pais não queriam que eu e minhas irmãs também passássemos por isso. Foi uma escolha entre a sua terra natal e a educação das suas filhas. Nunca saberei quão grande foi a carga emocional que eles suportaram.

Passaram anos desde que os meus pais tomaram a decisão de deixar o Irão. Agora tenho 32 e ao escrever este texto penso como tive sorte por ter a oportunidade e a liberdade para concluir um Doutoramento, que espero, tal como desejavam os meus pais, possa ser um instrumento através do qual eu contribua para melhorar a sociedade.

Mas isto não é sobre mim ou sobre a história da minha vida. É sobre todos os outros Bahá'ís que ainda estão no Irão e que não têm acesso ao ensino superior. É sobre aqueles que decidiram permanecer na sua terra natal e exigir os seus direitos de acesso à educação, na esperança de que eles também sejam capazes de contribuir para a prosperidade do país que amam.

Aos 14 anos de idade, eu estava alheia a tudo o que ia acontecendo no Irão. Só muito mais tarde, quando comecei a olhar para o meu passado e para a minha identidade como Bahá'í, é que percebi que a exclusão total dos Bahá'ís no artigo 13º da Constituição iraniana deixou uma comunidade inteira sem qualquer protecção. Depois, soube das políticas de Estado "confidenciais", como o Memorando de 1991 elaborado a pedido de Ali Khamenei, o líder supremo do Irão, instruindo o governo a lidar com os Bahá'ís para "que o seu progresso e desenvolvimento sejam bloqueados".

Depois de muita pressão internacional, o regime iraniano tem permitido a entrada de alguns Bahá'ís nas universidades para manter uma boa imagem aos olhos da comunidade internacional. No entanto, até mesmo estes estudantes Bahá'ís são expulsos antes de concluir os seus estudos. Deixem-me contar-lhes alguns exemplos reais: Elham, que estudava Engenharia Informática na Universidade Malard-Azad; Sahba, que estudava Ciência Aplicada na Universidade de Kermanshah; Shomeis, que estudava Teatro na Universidade Teerão-Azad; e Arsalan que estudava Engenharia de Materiais na Universidade de Ahvaz-Shahid Chamran. Todos foram expulsos a meio dos seus estudos devido às suas convicções Bahá'ís.

Para enfrentar esta expulsão em massa, a comunidade Bahá'í desenvolveu uma resposta pacífica e criativa com a criação do BIHE (Bahá’í Institute for Higher Education / Instituto Bahá'í de Ensino Superior), uma universidade privada constituída por Professores expulsos das universidades públicas devido às suas crenças religiosas. O BIHE foi alvo de rusgas em diversas ocasiões, tendo professores e pessoal administrativo sido presos.

Reconheço que, ao deixar o Irão aos 14 anos, fui poupada à decepção e à consternação que milhares de estudantes Bahá'ís enfrentam todos os anos quando lhes é negada a matrícula nas universidades com a justificação de um "processo incompleto". É difícil imaginar o que terá sentido Dorsa, uma jovem Bahá'í estudante de arquitectura, quando foi chamada à sede do Gabinete de Informação e lhe foram apresentadas três opções: manter suas crenças e ser expulsa da universidade; ir para o estrangeiro para continuar os seus estudos; ou negar as suas crenças e continuar os seus estudos. As autoridades têm plena consciência que os Bahá'ís, por uma questão de princípio, não negam ou mentem sobre a sua filiação religiosa.

A Fé Bahá'í vê a religião como um sistema divino e progressivo de conhecimento que fornece ensinamentos espirituais e sociais que permitem o progresso a humanidade. Os Bahá'ís reconhecem Bahá'u'lláh como o mais recente "Educador Divino" - ou manifestante de Deus - que trouxe ensinamentos espirituais e sociais adequados aos tempos em que vivemos. Os ensinamentos de Bahá'u'lláh sobre a igualdade entre homens e mulheres, a educação universal e a ausência de clero são um desafio para muitas das crenças e práticas actualmente instituídas no Irão.

O acesso à educação é um direito humano universal. Todos, incluindo os Bahá'ís, têm esse direito, segundo o artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. No entanto, porque já houve várias gerações de Bahá'ís que foram barradas e expulsas das universidades iranianas, muitos podem ter-se tornado insensíveis a esta realidade discriminadora e considerar esta violação dos direitos humanos como um procedimento normal. Temos de garantir que a comunidade internacional não cede à tirania com esta falsa sensação de conforto.

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Texto original (em inglês): Iran’s coming in from the cold but Bahá’ís are still frozen out (Times Higher Education)

Shabnam Moinipour é estudante de doutoramento na Universidade de Westminster. O tema da sua tese é Direitos Humanos e Meios de Comunicação Social no Irão.


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