sábado, 10 de setembro de 2016

Combater o Culto do Corpo

Por David Langness.


O teu propósito na vida é encontrar o teu propósito e dar-lhe todo o teu coração e alma. (Gautama Buda)
Isto é uma verdadeira afirmação Zen - e não vem de um dos Seus discípulos, mas do próprio Buda. "O teu propósito na vida é encontrar o teu propósito..." Soa bastante paradoxal, não é?

No entanto, se pensarmos profundamente, esta parábola Zen faz sentido. Esforçamo-nos, durante toda a vida, a procurar e depois a realizar o que consideramos ser mais valioso. O Buda pede-nos que procuremos um propósito real, e assim que o encontrarmos, dar-lhe tudo o que temos.

O leitor já encontrou o seu propósito na vida?

Conhece o seu propósito - o seu objectivo, intenção, projecto, a sua esperança mais profunda. Tem uma direcção final, um desígnio, uma aspiração? Tal como um barco no oceano, você tem um destino?

Por outras palavras, qual é o sentido da sua vida?

Muitos de nós estamos tão envolvidos nas tarefas necessárias à vida e à sobrevivência que não pensamos muito profundamente no seu objectivo maior. Vamos para o trabalho ou para a escola, pagamos o aluguer ou a hipoteca, comemos, dormimos, tratamos das nossas famílias e tentamos manter a nossa saúde. A natureza implacável da vida - o seu ritmo quotidiano puro – faz-nos focar simplesmente em concluir esforços e ultrapassar obstáculos, tentando manter o nosso equilíbrio, e passar para a tarefa seguinte.

Assim, a maioria das pessoas, parece às vezes, passar a vida apenas a sobreviver, apenas a satisfazer os seus instintos e impulsos, apenas a satisfazer as necessidades do corpo físico:
Se um homem é bem-sucedido no seu negócio, arte ou profissão fica capacitado para aumentar o seu bem-estar físico e dar ao seu corpo a quantidade de comodidades e conforto com que se deleita. Hoje, à nossa volta, vemos como o homem se rodeia com todas as conveniências e luxos modernos, e nada nega ao lado físico e material da sua natureza. Mas, acautelai-vos, para que ao pensar demasiado nas coisas do corpo vos esqueceis das coisas da alma; pois os benefícios materiais não elevam o espírito de um homem. A perfeição em coisas mundanas é uma alegria para o corpo de um homem, mas isso de modo algum glorifica a sua alma.

Pode acontecer que a um homem que tenha todos os benefícios materiais e que viva rodeado por todos os grandes confortos que a civilização moderna lhe pode dar, lhe seja negado o dom importantíssimo do Espírito Santo.

Na verdade, progredir materialmente é uma coisa boa e louvável, mas ao fazê-lo, não vamos negligenciar o progresso espiritual que é mais importante, e fechar os olhos para a Luz Divina que brilha entre nós.

Apenas ao melhorar espiritualmente assim como materialmente podemos fazer algum progresso real, e tornarmo-nos seres perfeitos. Foi para trazer esta vida e luz espirituais ao mundo que todos os grandes Professores têm aparecido. Eles vieram para que o Sol da Verdade se pudesse manifestar e brilhar no coração dos homens, e que através do seu poder maravilhoso os homens pudessem alcançar a Luz Eterna. ('Abdu'l-Bahá, Paris Talks, p. 62)
"Acautelai-vos", aconselha 'Abdu'l-Bahá, "para que ao pensar demasiado nas coisas do corpo vos esqueceis das coisas da alma..." As nossas sociedades modernas parecem muito focadas em pensar demasiado seriamente nas coisas do corpo, não é? Para onde quer que vamos, vemos a idealização do físico. Em anúncios, em ecrãs de cinema, na internet, em revistas e até mesmo na publicidade em paragens de autocarro, somos continuamente bombardeados com imagens de perfeição física, como se isso fosse o único objectivo da vida. Os media gritam "Juventude! Beleza! Músculos esculturais! Cabelo esplendoroso! Pele brilhante! Abdominais rijos!"e nós compramos tudo isto.

Há uma expressão para descrever esta tendência: o culto do corpo. Os nossos corpos físicos exigem uma grande dose de atenção constante - comida, água, exercício, descanso, roupas, abrigo e cuidados de saúde - mas quando nós exageramos, e "pensamos demasiado" nas nossas necessidades físicas, perdemos as mais importantes e duradouras realidades da vida. Quando o culto do corpo aparece, torna-se uma obsessão, uma preocupação constante que se pode transformar numa obrigação quase religiosa. Em vez de cuidar da aparência geral do corpo físico, e de considerar a nossa saúde como uma forma de conservar os nossos corpos para que as nossas mentes e almas possam fazer coisas boas, algumas pessoas obcecadas da aptidão física vêem a perfeição física e material como o objectivo derradeiro da vida.

Quando isso acontece, temos o culto do corpo em acção.

É claro que nenhum esforço consistente que possamos fazer com o corpo - halterofilismo, muitas horas no ginásio, praticar um desporto ou correr centenas de quilómetros - trará dividendos físicos e mentais. O problema? Os dividendos não duram. Os nossos corpos têm datas de validade registadas no nosso ADN. A determinado momento, os nossos corpos envelhecem e ficam frágeis. Todos nós nos libertamos destas camadas físicas exteriores e passaremos para uma existência mais espiritual. Nunca houve alguém que conseguisse contornar esta dura lei da existência.

O conselho sábio de 'Abdu'l-Bahá para que nos esforcemos para sermos seres perfeitos "melhorando tanto espiritual como materialmente" aplica-se aqui. Ao criar um equilíbrio saudável, inteligente entre nossas necessidades físicas e espirituais, podemos realmente progredir e dar o primeiro passo para encontrar o nosso maior objectivo na vida.

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Texto original: Combatting the Cult of the Body (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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