sábado, 15 de junho de 2019

Normalizar a Menstruação é Promover a Igualdade

Por Nadia Kardan.


Quando tinha 11 anos, estava na escola e fiquei pela primeira vez com o período durante as aulas. Era a segunda vez que tinha o período e apesar da idade e a experiência estarem a confirmar o que a minha mãe me tinha dito (“Todas as mulheres no mundo têm o período”) eu sentia-me humilhada ao ponto de ficar momentaneamente traumatizada. Os rapazes fizeram troça de mim durante semanas e eu fiz tudo o que pude para esquecer aquilo. Desde então, sempre que tinha o período, nada era mais importante do que garantir que não me sujava. Todos os meus pensamentos, ansiedades e preocupações durante esses dias do mês centravam-se na quantidade de pensos e tampões que tinha na minha bolsa e nas oportunidades que tinha para ir à casa de banho.

Não demorou muito até perceber que isto era uma preocupação partilhada pelas minhas amigas. Durante os nossos dias na escola passávamos sub-repticiamente umas às outras pensos e tampões dentro de sacos castanhos – para que ninguém visse – ou através das mangas da camisa de cada uma como se se tratasse de contrabando em vez de produtos essenciais para a nossa saúde e bem-estar. Não falávamos sobre os períodos salvo através de sussurros e usávamos eufemismos como “o nosso amigo do sul” se era necessário falar em público ou em voz alta. As personagens na televisão nunca falavam sobre os seus períodos; nos filmes ninguém parecia afectado com isso. As modelos e as vedetas estavam sempre lindas e nunca perturbadas com dores, enxaquecas ou vómitos; por isso, mantínhamos um sorriso no rosto, excepto quando nos queixávamos umas às outras, em casa, nos nossos pijamas a ver televisão, aceitando o silêncio e o secretismo como a atitude normal das mulheres menstruadas.

Sempre fui apaixonada pela minha religião e espiritualidade; falo frequentemente da forma como a Fé Bahá’í defende os direitos das mulheres, mas nunca vi como a minha humilhação ou secretismo sobre o meu período tivesse alguma relação como o princípio da igualdade de género. Quando era adolescente, li o Kitab-i-Aqdas (o Livro Mais Sagrado) que uma professora Bahá’í me tinha oferecido. Encontrei as seguintes palavras:
Deus, de igual modo, como uma dádiva da Sua presença, aboliu o conceito de “impureza”, com o qual diversas coisas e pessoas foram consideradas impuras. Ele, certamente, é o Que Sempre Perdoa, o Mais Generoso. Em verdade, todas as coisas criadas foram imersas no mar da purificação quando, no primeiro dia de Ridvan, derramámos sobre toda a criação os esplendores dos Nossos mais excelsos Nomes e dos Nossos mais enaltecidos Atributos. (Bahá’u’lláh, The Kitab-i-Aqdas, ¶75)
E a nota nº 20 do Kitab-i-Aqdas confirmou:
Em algumas Dispensações religiosas anteriores, as mulheres nas suas regras eram consideradas ritualmente impuras e era-lhes proibido que observassem os deveres da oração e jejum. O conceito de impureza ritual foi abolido por Bahá’u’lláh.
Este excerto despertou a minha curiosidade e comecei a ler e a aprender mais: o conceito de menstruação como algo “impuro” era quase universal, afectava a auto-estima de uma aluna da escola secundária num subúrbio de New Jersey, que se sentia humilhada pela realidade do seu próprio corpo, e desenvolvimento educacional de praticamente todas as meninas no Médio Oriente, África Sub-Sahariana e Sudeste Asiático. Já não se trata apenas de ficar envergonhada por uma mancha de sangue; as meninas em vários pontos do globo sofrem de isolamento físico durante o ciclo menstrual e ficam em casa porque não têm acesso aos produtos de higiene necessários para fazer uma vida minimamente normal. Obter pensos e tampões é frequentemente impossível para meninas e mulheres em zonas rurais, onde os períodos são assunto tabu e a falar disso significa o ostracismo social.

Nos países sub-desenvolvidos a relação entre o período e a educação das meninas é inegável: segundo o site www.her-turn.org, num relatório das Nações Unidas datado de 20 de Maio de 2016, “no Nepal e no Afeganistão, 30 por cento das meninas afirmavam faltar às aulas quando tinham o período”. No Afeganistão, a taxa de alfabetização dos homens é o dobro das mulheres. No Nepal, cerca de 76% dos homens são alfabetizados e nas mulheres esse valor é apenas 55%.

Conhecendo o quão clara e intensamente a puberdade afecta o progresso escolar das mulheres, é importante recordar as palavras de ‘Abdu’l-Bahá:
A educação da menina é hoje mais importante do que a do rapaz, pois ela é a mãe da futura raça … (‘Abdu’l-Bahá, 'Abdu’l-Bahá in London, p. 91)
O conselho de ‘Abdu’l-Bahá é que as meninas sejam educadas e que a sua educação tenha prioridade em relação à do irmão ou irmãos. Como podemos permitir que as meninas deixem de ir à escola porque têm vergonha ou receio de falar sobre períodos?

O tabu da menstruação não está relacionado com comportamento ou decência. Evitar ou ignorar conversas sobre menstruação, esconder produtos de higiene menstrual, taxá-los como produtos de luxo (como acontece em alguns locais dos EUA) e envergonhar mulheres porque sangram ou falam dos seus períodos, apenas perpetua o estigma. Tudo isto alimenta nas meninas inseguranças sobre os seus corpos e condiciona as suas capacidades para pedir ajuda ou procurar a sua própria normalidade. ensinamentos Bahá’ís e a igualdade de direitos entre homens e mulheres.
Além disso limita a capacidade dos homens para desenvolver compreensão pelas suas parceiras que realizam as mesmas tarefas que eles enquanto perdem sangue e sentem os efeitos secundários, como fadiga, dores e até enxaquecas debilitantes. Perpetuar o estigma da menstruação limita o desenvolvimento de meninas e mulheres no mundo, e está em contradição com os

Hoje sou professora do 6º ano na cidade de Nova Iorque. Todos os anos, quando apresento a casa de banho das meninas aos novos alunos, mostro-lhes como usar correctamente os produtos de higiene menstrual. Digo-lhe que podem tirar um penso se não tiverem um consigo. Quando eles riem e gracejam porque dizem que é estranho falar sobre o assunto, digo-lhes que eu própria, a Profª Kardan, informo os professores homens que estou com o período, porque eles precisam de saber que não estou a fugir ao trabalho quando lhes peço que me substituam nas aulas para eu poder ir à casa de banho de duas em duas horas.

Todos os anos, as minhas alunas se sentem suficientemente confortáveis para me dizerem se estão com o período ou se necessitam de mudar de calças. Sentem-se suficientemente confortáveis para chamar por mim ao serem apanhadas de surpresa pelo período quando estão na casa de banho e precisam de um penso. Não se envergonham quando percebem que há sangue na sua cadeira – como aconteceu comigo quando estava no 6º ano – porque têm uma professora que lhes diz que elas são humanas e que o período faz parte daquilo que as torna humanas.

Lutar pela igualdade entre homens e mulheres é mais do que fazer leis; é fazer com que as meninas sintam a si próprias, na sua mais elementar e verdadeira biologia, e não tenham vergonha disso. A nossa Fé transformou isto em lei; é tempo de agirmos sobre isto.

Se desejar explorar mais sobre este assunto, aqui ficam alguns links (em inglês) que podem ser úteis:

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Texto original: Normalizing Menstruation Promotes Equality. Period. (www.bahaiblog.net)

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Nadia Kardan vive em Nova Iorque e é escritora, professora e activista feminista. Além de dar aulas e estar a escrever um romance, também organiza encontros devocionais sobre o tema “Feminismo e Espiritualidade” com o objectivo de aprofundar os participantes nas soluções espirituais para a igualdade de género.

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