quinta-feira, 11 de junho de 2020

Marchas de Protesto contra o Racismo: devo participar? E depois?

Por David Langness.


Aos longo dos anos, várias cidades e vilas nos Estados Unidos têm sido palco de marchas de protesto e manifestações contra a morte de muitos afro-americanos às mãos da polícia.

Muitas destas marchas têm sido pacíficas e produtivas, permitindo que uma ampla diversidade de pessoas expresse livremente as suas opiniões e mostre a sua oposição pública ao racismo e injustiça. Uma ampla cobertura mediática dessas marchas pacíficas mostrou à América que o racismo não é apenas um “assunto de pretos” – porque os protestos incluíam uma significativa diversidade de participantes.

Mas algumas marchas não foram pacíficas, tendo alguns participantes optado pela violência, destruindo propriedades, e agredindo outros participantes e polícias. Por outro lado, algumas marchas pacíficas suscitaram uma resposta policial desproporcionada, hiper-militarizada e violenta.

Assim, qual a nossa posição sobre a participação em marchas em defesa da justiça racial? Quem entre nós já participou numa marcha pacífica? Sentiram que tinham atingido o objectivo pretendido?

De uma perspectiva espiritual, aplicam-se vários princípios Bahá'ís a estas questões importantes:

  • Deus ama a justiça e pede-nos que trabalhemos pelo seu aparecimento no mundo: “A mais amada de todas as coisas aos Meus olhos é a justiça; não te afastes dela…” (Bahá'u'lláh, As Palavras Ocultas)
  • A unicidade da humanidade é o espírito desta época: “Apagai os fogos da guerra, elevai os estandartes da paz, trabalhai pela unicidade da humanidade e lembrai-vos que a religião é o canal do amor para todos os povos.” ('Abdu'l-Bahá, Selections from the Writings of Abdu'l-Baha)
  • Os ensinamentos Bahá'ís pedem a cada pessoa para “derrubar as barreiras” entre as raças: “Rejeitando de uma vez por todas a doutrina falaciosa da superioridade racial, com todos os seus males, confusões e misérias associadas, e acolhendo e encorajando a mistura de raças, derrubando as barreiras que agora as dividem, eles devem esforçar-se, noite e dia, por cumprir as suas responsabilidades particulares na tarefa comum que enfrentam com tamanha urgência” (Shoghi Effendi, The Advent of Divine Justice)
Os Bahá'ís não são violentos e obedecem às leis civis do país onde residem; por esse motivo, não participam em marchas ilegais ou violentas – mas podem organizar e aderir a marchas pacíficas contra o racismo, contra os preconceitos e contra a opressão. Na verdade, os Bahá'ís americanos participam nas marchas em campus universitários contra o preconceito racial desde a década de 1940 – um acontecimento que o Guardião da Fé Bahá'í, Shoghi Effendi, favorecia e aprovava. Os Bahá'ís participaram activamente nas lutas pelos direitos civis e anti-apartheid. As instituições Bahá'ís eleitas a nível local, nacional e internacional, têm sido firmes na defesa dos direitos humanos e na eliminação de ideologias e políticas racistas, muito antes dessas causas se terem tornado movimentos de massas populares. Os ensinamentos Bahá'ís – com o seu foco tão intenso na unicidade da humanidade e na erradicação do preconceito e do fanatismo – encorajam todas as pessoas a agir neste assunto de importância vital.

No entanto, os Bahá'ís não se limitam a participar nas marchas e depois vão para casa. Os Bahá'ís tentam fazer muito mais do que isso, com esforços constantes para detectar e destruir a fonte do preconceito nos nossos corações e mentes; com a educação das crianças e jovens sobre a unidade da raça humana; e ao construir comunidades saudáveis e funcionalmente integradas que incluam todos os grupos étnicos e raciais.

Na verdade, muitos comentadores consideram que a Comunidade Bahá'í global constitui o grupo organizado mais diversificado de pessoas no planeta.

Constituída por uma amostra verdadeiramente representativa de toda a humanidade, os Bahá'ís provêm de todos os grupos étnicos na terra. Na comunidade Bahá'í, encontramos pessoas de todas as tonalidades e cores. A Fé Bahá'í não exclui qualquer nacionalidade, grupo étnico, cultura ou classe social. E isto, porque a mensagem essencial de Bahá'u'lláh sobre a unidade acolhe milhões de pessoas de mais de 2100 origens raciais, étnicas e tribais.

Esta abertura e ausência de divisões ou barreiras sociais cria algo especial e único, algo que nunca aconteceu antes na nossa longa história: quem acredita nos ensinamentos de Bahá'u'lláh sobre unicidade da humanidade tem uma oportunidade única de se integrar na mais diversificada comunidade humana que existe hoje no mundo.

Integrar a comunidade mundial Bahá'í dá um sentido de cidadania global a cada Bahá'í, permitindo-lhe encontrar-se com pessoas de todas as origens. Quando isso acontece, os nossos horizontes alargam-se. Encontramos, conhecemos e desenvolvemos amizades com pessoas de diferentes círculos sociais, diferentes grupos raciais e com diferentes perspectivas de vida. Essa experiência enriquecedora, abrangente e civilizadora pode servir como um antídoto natural contra o preconceito:

... há necessidade de um poder superior para ultrapassar os preconceitos humanos, um poder ao qual nada no mundo da humanidade possa obstar e que obscureça os efeitos de todas as outras forças que funcionam no mundo humano. Esse poder irresistível é o amor de Deus. É minha esperança e prece que possa destruir o preconceito desse ponto único de distinção entre vós, e vos una permanentemente sob a sua santificada protecção. Bahá'u'lláh proclamou a unicidade do mundo da humanidade. Ele fez com que várias nações e credos divergentes se unissem. Ele declarou que a diferença de raça e de cor é como a beleza diversificada das flores num jardim. Quando entramos num jardim, vemos flores amarelas, brancas, azuis, vermelhas em abundância e beleza – cada uma radiante por si própria, apesar de diferente das outras, partilhando com elas o seu próprio encanto. As diferenças raciais no mundo humano são semelhantes. Se todas as flores num jardim fossem da mesma cor, o efeito seria monótono e enfadonho para os olhos.

Por isso, Bahá'u'lláh disse que as várias raças humanas dão uma combinação harmoniosa e uma beleza de cor ao todo. Que todos se associem, pois, neste grandioso jardim humano, tal como as flores crescem e ficam lado a lado, sem discórdia ou desentendimentos entre si. ('Abdu'l-Bahá, The Promulgation of Universal Peace)

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Texto original: Hands Up, Don't Shoot: Should I Protest? And Then What? (www.bahaiteachings.org)


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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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