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A coragem é um aspecto da condição humana que me tem intrigado há muito tempo. As maneiras como se constrói, as maneiras como se perde e, em seguida, se encontra novamente, e a forma como é simultaneamente tão comum à experiência humana, mas também, de alguma forma, milagrosamente sagrada.
A pessoa mais corajosa com que falei nas últimas semanas foi Lilly, uma sobrevivente de ataque sexual com 22 anos de idade. Lilly e eu conhecemo-nos em 19 de Setembro, na Casa Branca. Naquele dia, um grupo de pessoas reuniu-se para o lançamento da campanha "It’s On Us" (em português, É Connosco). A campanha aborda o tema da agressão sexual no campus, de uma forma multifacetada e com os diferentes elementos dispostos no site itsonus.org. Uma série correspondente de acções estão programadas para se realizarem nos campus de todo o país.
A beleza no interior da Casa Branca é cativante - arte, ornamentação e a história que se desenrolou dentro das suas paredes não se podem registar adequadamente em vários volumes de livros. Mas o que aumentava a beleza desse dia era o facto de estar rodeada por tantos indivíduos comprometidos. Homens e mulheres, jovens e idosos, de várias áreas, estavam todos lá em solidariedade com os sobreviventes e reuniam-se para garantir que a praga da agressão sexual, especialmente nos campus universitários, é debatida e termina.
Lilly, que apresentou o Vice-Presidente, subiu ao palco com a postura de uma rainha e narrou a sua história angustiante de ter sido violada durante o seu primeiro ano de faculdade. Depois partilhou graciosamente como reconstruiu a sua vida. Poder-se-ia ouvir um alfinete cair na sala. Esta história fez-me lembrar rapidamente, quando, há alguns anos na minha investigação de pós-graduação, ouvi muitas horas de histórias de mulheres que tinham sido presas e torturadas, e muitas que perderam os seus entes queridos no Irão, por serem membros da Fé Bahá'í. Testemunhei como o pior da capacidade humana para infligir crueldade foi enfrentada com coragem indescritível, a mesma coragem que Lilly também mostrou naquele dia. Já descrevi a minha obsessão com este tipo de coragem. Como é que as pessoas não desistem diante destas experiências? O que os incita a continuar?
Deixei a Casa Branca perguntando a mim própria: Como é que nós, enquanto sociedade, mudamos a nossa forma de retratar as mulheres e os homens? Como é que nos afastamos de um entendimento da natureza humana que assume que todos nós somos gananciosos, animalescos e egocentristas, para entender que a violência não é caracterizadora da nossa natureza enquanto seres humanos? O Presidente Obama também falou sobre o assunto no seu discurso, afirmando: "Desde as ligas desportivas à cultura pop e à política, a nossa sociedade não valoriza suficiente as mulheres", e acrescentou: "Ainda não condenamos agressão sexual tão veementemente como deveríamos."
Como ficou claro no evento, e desde o momento que comecei a fazer a defesa da igualdade de género, que isto é um assunto de todos. Mulheres e meninas são prejudicadas pela violência desenfreada e pelas injustiças estruturais e sociais que enfrentam; tal como são os homens e os rapazes, que também sofrem violência, marginalização e abuso. Ninguém está imune ao mal que a desigualdade provoca, mas a boa notícia é que, à medida que as nossas sociedades se tornam mais justas, todos beneficiam.
A minha própria experiência pessoal no ensino superior foi inestimável, marcada por altos e baixos, pelas novas amizades, desilusões e por um esforço académico pessoal maior do que alguma vez pensei ser possível. Tragicamente, para uma em cada cinco mulheres, e também para muitos homens, após uma experiência de ataque sexual, a atenção muda da busca da excelência académica para como reconstruir a vida.
Legislação governamental, como a The Violence Against Women Act, Title IX e a The Cleary Act tem proporcionado uma tremenda protecção social e psicológica na nossa sociedade, ao criar uma maior equidade de género. Estas ferramentas são valiosas como sempre, e o que é mais esperançoso é que agora, além das leis, há uma vaga de fundo constituída por pessoas, faculdades, empresas, entidades governamentais, celebridades e atletas que ecoam a necessidade de protecção e igualdade na nossa sociedade.
Espero que essa vaga de fundo continue a crescer e a ganhar força, e que todos possamos conhecer as Lillys do mundo não apenas como sobreviventes de ataques sexuais, mas antes como amigas, colegas e concidadãos.
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Texto original (em inglês): What We Can Learn From Survivors of Sexual Assault (HuffingtonPost.com)
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Donna Hakimian, é representante dos Bahá'ís dos Estados Unidos para Igualdade de Género e Avanço das Mulheres. Tem um Mestrado em Women's Studies pela Universidade de Toronto um um bacharelato em Religious and Middle Eastern Studies pela McGill University. Tem trabalhado em temas relacionados com violência de género e escrito diversos trabalhos sobre direitos das mulheres no Irão.
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