sábado, 11 de junho de 2016

Como fazer as Empresas pagar impostos

Por David Langness.


Deixem-me fazer-te uma pergunta
O teu dinheiro é assim tão bom
Será que ele te compra o perdão
Pensas que conseguia?
Eu penso que descobrirás
Quando a tua morte te cobrar
Que todo o dinheiro que fizeste
Nunca conseguirá comprar novamente a tua alma (Bob Dylan, Masters of War)
Aquelas almas que estão apegadas a este mundo e à sua riqueza estão privadas de progresso espiritual. ('Abdu'l-Bahá, Star of the West, Volume 4, p. 122)
Há muitos países têm sistemas de sigilo bancário. A Suíça, com as suas leis bancárias confidenciais e as suas contas numeradas, é provavelmente o caso mais conhecido. Mas nas últimas décadas, conforme demonstram os recém-revelados “Papéis do Panamá”, muitos outros países se têm tornado "paraísos fiscais" secretos, onde pessoas ricas, empresas e sociedades de fachada podem movimentar disfarçadamente o dinheiro, esconder os seus activos e evitar o pagamento de impostos nos seus países de origem. Lugares como as Ilhas Virgens Britânicas, Ilhas Cayman, St. Kitts e Nevis, Vanuatu e o Luxemburgo têm funcionado como paraísos fiscais, e muitas outras pequenas e médias nações também escondem riqueza com leis bancárias opacas, regulamentos de não-tributação e políticas rígidas de sigilo.

Cerca de 75% dos Hedge Fund (fundos de cobertura) mundiais têm os seus milhares de milhões nas Ilhas Caimão, por exemplo. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) define um paraíso fiscal como tendo três características principais: ausência de impostos, ou somente as taxas nominais; confidencialidade da informação financeira pessoal (o que significa nenhuma transmissão de dados financeiros para outros governos); e falta de transparência.

Como funciona? Bem, vamos dizer que o leitor possui uma quantia significativa de dinheiro e não quer pagar impostos sobre essa quantia. Criando uma empresa de fachada nas Ilhas Cayman ou noutro paraíso fiscal, é possível contornar as leis fiscais do seu próprio país, ocultando os seus fundos nessa empresa

Os bilionários, os criminosos e os seus parceiros, empresas multinacionais e políticos corruptos, sabem - todos eles - que as diferentes leis tributárias dos diversos países do mundo podem ser usadas para obter vantagens financeiras. Apesar das tentativas de várias nações para forçar as outras a revelar a verdadeira riqueza de pessoas e empresas, ainda existem muitos bancos sem escrúpulos, instituições financeiras e países dispostos a esconder riqueza, ocultar activos e evitar a tributação legítima. Em muitos locais, esses tipos de práticas até são legais. Neste aspecto, as empresas multinacionais têm uma enorme vantagem, porque podem explorar as lacunas e as diferentes leis fiscais de vários países, abrindo filiais em paraísos fiscais e movimentando os seus lucros através dessas nações.

As estratégias de evasão fiscal da empresa americana Google são um bom exemplo. A Google licencia as suas tecnologias - principalmente o seu motor de busca e as receitas de publicidade que este gera - a subsidiárias em países onde não se pagam impostos ou onde os impostos são muito baixos, como Bermuda, Bahamas, Holanda e Irlanda. Isso significa que o Google paga pouquíssimos impostos no seu país de origem, os Estados Unidos; na verdade, paga menos do que qualquer outra grande empresa tecnológica. A Apple e outras empresas tecnológicas multinacionais funcionam de forma semelhante, e apesar de terem lucros enormes, descobriram como evitar o pagamento de grande parte dos impostos sobre os lucros. Como consequência, multiplicam-se as investigações governamentais sobre essas empresas e as suas práticas, com a França, o Reino Unido e os Estados Unidos activamente a tentar obrigar essas empresas a pagar a sua parte justa de impostos, mas até agora tiveram pouco sucesso.

De facto, em 2014 a agência de notícias Reuters publicou uma série de histórias sobre as estratégias de evasão fiscal das grandes empresas multinacionais americanas como a Apple, a Microsoft e a General Electric. Essas estratégias incluíram uma técnica contabilística conhecido como o esquema "Irlandês Duplo com Sanduíche Holandesa" (Double Irish with a Dutch sandwich), que reduz drasticamente os impostos através do encaminhamento lucros para subsidiárias irlandesas e para os Países-Baixos e, em seguida, para as Caraíbas. A Reuters informou que a Apple, de acordo com os seus próprios números, teve em 2013, um lucro off-shore de 54,4 mil milhões de dólares e, no entanto, não pagou qualquer imposto sobre rendimentos nos EUA. Segundo a lei dos EUA, as empresas não são obrigados a pagar impostos de rendimentos sobre lucros no estrangeiro, enquanto esses lucros não entrarem fisicamente nos Estados Unidos. No total, a Reuters revelou que as grandes empresas americanas tinham retido 2,1 biliões de dólares de lucros em 2013, e não pagaram qualquer imposto nos EUA sobre esses lucros.

Apenas uma solução potencial para este tipo de evasão fiscal pode efectivamente acabar com esta corrupção desenfreada (mas por vezes legal): uma lei fiscal global e uniforme.

Do ponto de vista Bahá’í, essa lei fiscal global, aplicada por um organismo governamental internacional democrático, seria aplicada de forma justa e equitativa em todo o mundo. Com a aplicação de uma lei universal, nenhum indivíduo ou empresa poderia fugir ao pagamento de impostos legítimos, porque uma lei fiscal internacional seria aplicada em todo o mundo. Nenhuma empresa multinacional, instituição bancária ou nação poderia "jogar com o sistema" através da criação de empresas de fachada ou encaminhamento de fundos para locais diferentes. O mundo seria realmente um único país, especialmente para fins fiscais, e seria de esperar que todos contribuíssem com a sua quota-parte.

É óbvio que quando isto acontecer, os impostos globais não vão aumentar - vão diminuir consideravelmente, talvez até de forma brusca. E porquê? Porque os biliões de dólares que agora se ocultam em paraísos fiscais seriam equitativamente tributados, reduzindo a carga fiscal sobre todas as outras pessoas. Os super-ricos não teriam onde esconder as suas fortunas, e teriam de pagar impostos como todos nós. As empresas multinacionais teriam de enfrentar uma autoridade tributária internacional, sem que existissem paraísos fiscais como possíveis esconderijos.

O princípio espiritual aqui em causa - a aplicação global de uma lei fiscal universal equitativa, proporcional e justa, imparcial - libertaria o mundo de muita corrupção, garantiria as receitas suficientes aos governos para cuidar das necessidades básicas de todas as pessoas, e permitiria construir um mundo onde todos pudessem viver com dignidade:
Todos devem ser produtores. Cada pessoa na comunidade cujas necessidades são iguais à sua capacidade individual de trabalho deve estar isenta de impostos. Mas se o seu rendimento é maior do que as suas necessidades, ela deve pagar uma taxa até que exista um ajustamento. Isto significa que a capacidade de produção de um homem e as suas necessidades serão compensadas e reconciliadas através dos impostos. Se a sua produção excede, ele pagará um imposto; se as suas necessidades excederem a sua produção, ele deve receber uma quantidade suficiente para compensar ou ajustar. Portanto, a tributação será proporcional à capacidade e à produção, e não haverá pobres na comunidade. ('Abdu'l-Bahá, The Promulgation of Universal Peace, p. 217)

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Texto original: How to Get Corporations to Pay Their Taxes (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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