Nenhum marido Bahá’í deve alguma vez bater na sua mulher, ou sujeitá-la a qualquer forma de tratamento cruel; fazê-lo seria um abuso inaceitável da relação do casamento e contrário aos ensinamentos de Bahá'u'lláh. (Declaração sobre Violência contra Mulheres e Abuso Sexual, A Casa Universal de Justiça, 24 de Janeiro de 1993)Quando trabalhava noutro país, a nossa filha reparou numa família que todas noites depois do trabalho regressava a casa. Via-os praticamente todos os dias e percebeu, após cumprimentar, sorrir e falar brevemente várias vezes com eles, que as duas crianças da família eram excepcionalmente educadas e bem-comportadas. Um dia elogiou a família pelo bom comportamento das crianças.
“As vossas crianças são tão educadas”, disse ela aos pais.
“Obrigado”, respondeu o pai agradado com o elogio. “Bato-lhes todas as noites. A minha mulher também.”
Aquela velha atitude, acreditem ou não, já tinha imperado em todo o mundo. Provavelmente já ouviram a expressão “poupar o chicote é estragar a criança”; mas alguma vez ouviram a expressão “the rule of thumb” (significa “regra de ouro” ou “regra prática”; literalmente significa “a regra do polegar”). Diz a tradição que esta expressão deriva da lei inglesa anterior a 1500, quando os maridos podiam legalmente bater nas mulheres com varas cuja espessura não fosse maior que o polegar do homem. Esse tipo de espancamento das mulheres, aceitável do ponto de vista legal e cultural, existiu durante milhares de anos. Só em 1982 é que a Comissão Americana para os Direitos Civis publicou um relatório pioneiro sobre abuso das esposas, intitulado “Under the Rule of Thumb” (“Sob a Regra do Polegar”).
O relatório da Comissão indicava que o abusa conjugal, físico ou psicológico, era assustadoramente comum. O Fundo das Nações Unidas para a População afirma que uma em cada três mulheres experimenta ataques físicos ou sexuais durante a sua vida – e a maioria destes tem lugar, não com estranhos, mas na relação conjugal.
Apesar de tudo isto, só muito recentemente é que tribunais, governos e polícia começaram a considerar a violência conjugal e doméstica como actos criminosos. Na verdade, ainda há muitos países que consideram a violência conjugal, os crimes de honra, o casamento forçado de crianças, os crimes de dote e o feminicídio como questões familiares e vez de ofensas criminais e violações dos direitos humanos. Se o marido é “dono” da mulher, tal como muitos sistemas legais o definem, então a escravatura doméstica abre as portas à violência doméstica.
Em resposta a este facto tão comum, as Nações Unidas publicaram em 1993 o documento Estratégias de Combate à Violência Doméstica: Um Manual de Recursos. Ali declarava:
... um grande número de países permite... a aplicação, por parte do marido, de castigos físicos moderados à respectiva esposa. Mais uma vez, a maioria dos sistemas legais não criminaliza as circunstâncias em que uma mulher é forçada, contra a vontade, a ter relações sexuais com o marido... De facto, no caso da violência conjugal sobre a mulher, existe a crença generalizada de que esta provoca, tolera ou até aprecia uma certa dose de violência por parte do marido.Para contrariar estas atitudes prevalecentes em tantos locais, as décadas de 1980 e de 1990 testemunharam um grande movimento global para conter a onda de violência doméstica contra mulheres e uma resolução internacional: a Declaração das Nações Unidas sobre Eliminação de Violência contra Mulheres. Afirma:
… a violência contra mulheres é uma manifestação das relações de poder historicamente desigual entre homens e mulheres, que levou à subjugação e discriminação das mulheres pelos homens, e impediu o pleno progresso das mulheres; essa violência contra as mulheres é um dos principais mecanismos sociais pelos quais as mulheres são forçadas a uma posição de subordinação em relação aos homens.A comunidade Bahá’í tem apoiado activamente a resolução da ONU e continua a defender relações de poder iguais entre homens e mulheres.
... saiba-se mais uma vez que enquanto mulher e homem não reconhecerem e conseguirem a igualdade, o progresso social e político não será possível aqui ou em qualquer outro lugar. Pois o mundo da humanidade consiste em duas partes ou membros: uma é a mulher e a outra é o homem. Enquanto estes dois membros não tiverem força igual, não se poderá estabelecer a unicidade da humanidade, e a alegria e felicidade da humanidade não serão uma realidade. ('Abdu'l-Bahá, The Promulgation of Universal Peace, p. 76)“Enquanto estes dois... não tiverem força igual”, afirma 'Abdu'l-Bahá, “a alegria e felicidade da humanidade não serão uma realidade”. Há quase dois séculos que os ensinamentos Bahá'ís defendem relações de poder iguais a que se referem as Nações Unidas.
Vários estudos científicos provam que abusos sexuais, ataques sexuais e as violações são tipicamente cometidas por homens que libertam a sua raiva sobre as mulheres, motivados pelo desejo de dominar e controlar, e também pelo desejo do prazer sexual. Esta combinação de motivações revela algo profundamente desigual na relação de autoridade e domínio entre homens e mulheres em muitas sociedades. Quando os homens têm mais poder – não apenas força física, mas também poder político e social – o poder é muitas vezes usado contra as mulheres “para as manter no seu lugar”.
Porque saímos de uma era passada na história humana em que a força física imperava, e iniciámos uma nova era em que a força intelectual, moral e física prevalecerá, temos agora a possibilidade de tratar ambos os géneros com igualdade – e acabar com os ataques sexuais.
O que podemos fazer para impedir os ataques sexuais e a violência contra as mulheres? Podemos mudar a equação de poder subjacente, e nesse processo fazermos tudo o que for possível para que homens e mulheres – como dizem os ensinamentos Bahá’ís - tenham “força igual”.
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Texto original: Only Equality Stops Domestic Violence (www.bahaiteachings.org)
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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.
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