Todos nós já ouvimos falar de falsas profecias; mas, e as verdadeiras? As profecias verdadeiras são profecias genuínas — aquelas que realmente cumprem uma visão real do futuro.
É claro que as profecias podem ser cumpridas por várias pessoas e podem ser cumpridas mais do que uma vez. É preciso fé e discernimento para distinguir entre afirmações verdadeiras e falsas sobre o cumprimento das profecias.
As falsas profecias que analisámos até agora nesta série de artigos foram muitas vezes escritas após os factos. De um modo geral, as verdadeiras profecias são de natureza mais genérica. Regra geral, quanto mais detalhada e específica for a profecia, mais duvidosa poderá ser e, por conseguinte, exigirá uma verificação mais minuciosa.
As verdadeiras profecias realizam-se quando um verdadeiro profeta, que fala a verdade ao poder, proclama que a profecia se cumpriu. Os estudiosos da religião designam essa declaração como afirmação da verdade. A verdade ou falsidade de uma dada afirmação de verdade não pode ser determinada objectivamente, em termos gerais. Em vez disso, se uma afirmação é amplamente aceite pelos seguidores de uma fé, então é geralmente considerada verdadeira.
Algumas profecias - sobretudo as militantes - serviram até de carne para canhão para os líderes revolucionários e para as revoluções que lideraram.
Para evitar interpretações erradas, devemos primeiro determinar se uma profecia é literal ou figurada (i.e., simbólica).
Um discurso pode ser literal, ou figurado, ou ambos. Normalmente estas duas características combinam-se no discurso. O discurso literal - quando o falante pretende que as suas palavras sejam interpretadas literalmente - significa que não há necessidade de interpretação envolvida. No discurso literal, as palavras significam o que dizem e as palavras dizem o que significam.
O discurso figurado é diferente. Mais uma vez, as palavras significam o que dizem, mas nem sempre dizem o que querem dizer. Por exemplo, considere-se as seguintes palavras de Jesus:
Mas Jesus respondeu: «Vão lá dizer a essa raposa que eu expulso espíritos maus e faço curas hoje e amanhã, mas ao terceiro dia termino. (Lc 13:32)
Aqui, Jesus está a falar do Rei Herodes, e chama-lhe “raposa”. Obviamente, Jesus não o quis dizer literalmente. Os leitores compreendem intuitivamente que Jesus está a falar metaforicamente. Por outras palavras, Jesus usa uma metáfora.
Quando aplicado ao Rei Herodes, a palavra “raposa” é entendida como referindo-se ao carácter do Rei, que entendemos como astuto, esperto, manhoso, trapaceiro, evasivo, tortuoso, evasivo, dúbio, falso, enganoso, dissimulado, indigno de confiança, desonesto e traiçoeiro. Esta interpretação, no entanto, pode estar errada. Como diz um estudioso:
Ao tentar compreender o que Jesus disse, a questão crítica para o tradutor é que ideia ele [Jesus] transmitiu aos seus ouvintes através do uso da metáfora “Herodes é uma raposa”. Em particular, qual era o ponto de semelhança que Jesus estava a estabelecer entre uma raposa e Herodes? …
Jesus não pretendia que os seus ouvintes compreendessem que Herodes era astuto quando respondeu lhe disseram de que Herodes o queria matar. Em vez disso, estava a comentar a inépcia ou incapacidade de Herodes para cumprir a sua ameaça. Jesus questionou a linhagem, a estatura moral e a liderança de Herodes, rebaixando-o e colocando-o no seu devido lugar. …
Esta conclusão está de acordo com a compreensão da metáfora conhecida como teoria da metáfora conceptual, onde a metáfora “Herodes é uma raposa” é vista como uma extensão de uma metáfora mais básica, “As pessoas são animais”. No Antigo Testamento há outra extensão da metáfora básica “As pessoas são animais”, ou seja, “O rei é um leão” (ver, por exemplo, 2 Sam 17.10; Pv 19.12; 20.2; 28.15), mostrando que esta é uma metáfora reconhecida no hebreu bíblico.
Assim sendo, é muito provável que quando Jesus se referiu a Herodes como "essa raposa", aqueles com quem estava a falar tivessem em mente a metáfora básica habitual para um rei e reconheceriam imediatamente que, ao utilizar a metáfora "Herodes (o rei) é uma raposa", Jesus pretendesse transmitir que Herodes estava em extremo contraste com alguém que se conformava com o seu conceito normal de rei: "O rei é um leão". (E.A. Hermanson, “Kings are Lions, but Herod is a Fox: Translating the Metaphor in Luke 13.32,” The Bible Translator, pp. 235, 237)
Bahá’u’lláh afirmou que as profecias são um “teste”, de tal modo que só os puros de coração podem verdadeiramente perceber a natureza da profecia em si e a verdade do seu cumprimento. No Livro da Certeza, Ele escreveu:
Sabe tu, em verdade, que o propósito subjacente a todos estes termos simbólicos e alusões abstrusas que emanam da Causa sagrada dos Reveladores de Deus tem sido testar e provar os povos do mundo, para que a terra dos corações puros e iluminados se distinga do solo árido e perecível. Desde os tempos imemoriais esse tem sido o caminho de Deus entre as Suas criaturas e disto dão testemunho os registos dos livros sagrados. (¶53)
Assim, em vez de provarem verdadeiras ou falsas, as profecias provam se o entendimento do leitor é verdadeiro ou não. Ou seja, o propósito das verdadeiras profecias, segundo Bahá’u’lláh, “tem sido testar e provar os povos do mundo”.
Isto leva-nos a uma questão importante: por que razão são utilizadas metáforas nas Escrituras? Segundo Hermanson, “a metáfora é frequentemente utilizada porque é a forma mais precisa pela qual o autor pode expressar o que quer dizer, e não apenas para efeito retórico”.
Com estes princípios interpretativos em mente, o próximo artigo considerará o regresso de Jesus. O que “regresso” realmente significa é mais bem compreendido pelo que não significa, como ‘Abdu’l-Bahá explicou:
Mas voltemos ao nosso tema original. Nos Livros Sagrados e nas Sagradas Escrituras é mencionado de um “regresso”, mas os ignorantes não conseguiram compreender os seus significados e imaginaram que se referia à reencarnação. Pois o que os Profetas de Deus queriam dizer com “regresso” não é o retorno da essência, mas dos atributos; não é o regresso do próprio Manifestante, mas das Suas perfeições.
No Evangelho é dito que João, filho de Zacarias, é Elias. Com estas palavras não se quer dizer o regresso da alma racional e da personalidade de Elias no corpo de João, mas sim que as perfeições e os atributos de Elias se tornaram claros e manifestos nele. (Some Answered Questions, newly revised edition, p. 333)
Portanto, regresso não é reencarnação. No próximo artigo desta série, exploraremos o que significa realmente o regresso.
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Texto original: Do Prophecies Prove Anything? (www.bahaiteachings.org)
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Christopher Buck (PhD, JD), advogado e investigador independente, é autor de vários livros, incluindo God & Apple Pie (2015), Religious Myths and Visions of America (2009), Alain Locke: Faith and Philosophy (2005), Paradise e Paradigm (1999), Symbol and Secret (1995/2004), Religious Celebrations (co-autor, 2011), e também contribuiu para diversos capítulos de livros como ‘Abdu’l-Bahá’s Journey West: The Course of Human Solidarity (2013), American Writers (2010 e 2004), The Islamic World (2008), The Blackwell Companion to the Qur’an (2006). Ver christopherbuck.com e bahai-library.com/Buck.
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