quinta-feira, 7 de maio de 2009

Jesus e Paulo: Vidas Paralelas (2)

Ícone Ortodoxo mostrando João baptizando Jesus

No livro Jesus e Paulo: Vidas Paralelas, apesar do interesse que a análise da historicidade de alguns relatos bíblicos podem merecer, existe outra característica neste livro que me desagrada. Com alguma frequência, Jerome Murphy-O’Connor apresenta-nos um descreve Jesus quase reduzido à condição humana.

Vejamos alguns exemplos.

1. O autor afirma (p. 50) que Jesus esteve no Templo (enquanto criança ou adolescente) em busca de respostas dos doutores da religião e prolongou a sua estadia porque não encontrava respostas. E queria ter absoluta segurança que os especialistas da Lei não tinham resposta para as Suas questões.

2. Jesus é descrito (p. 40-44) como um rapaz da aldeia numa cidade em crescimento e cheia de vitalidade como Séforis (onde o seu pai se estabeleceu). Estaria fascinado com todos os elementos de modernidade e actividade de construção; os Seus conhecimentos elementares de língua grega teriam sido obtidos nessa cidade; ali teria tomado contacto com a existência de espectáculos que decorriam no teatro romano; e ali teria tido um contacto com um ambiente cosmopolita que o teriam levado a conhecer a existência de estilos de vida alternativos.

3. Noutra ocasião, O’Connor analisa (p. 94) a autoconsciência messiânica de Jesus, para tentar perceber quando é que Ele próprio se viu de maneira tão diferente, afirmando que Jesus estava plenamente consciente de quanto devia a João Baptista, pois teria sido durante a missão confiada a João que Jesus alcançou a percepção que transformaria a percepção da sua vocação. Sem João (uma espécie de catalisador) não teria tido essa oportunidade.

4. As questões económicas da época também teria influenciado Jesus. Ele teria percebido a enormidade dos problemas enfrentados pelos pequenos proprietários rurais face aos grandes latifundiários. O endividamento dos pequenos proprietários face aos grandes, criava problemas sociais terríveis, que teriam sensibilizado o Fundador do Cristianismo. (p.106-112). Algumas das Suas parábolas reflectem essa preocupação. Segundo O’Connor, “deve ter havido uma reflexão pessoa, desesperada, à medida que Jesus lutava por reconciliar aquilo que sabia ser a verdade com aquilo que lhe tinha sido dito ser a verdade. Jesus terá passado pela sua própria crítica mais estrita. Deve-lhe ter parecido incrivelmente presunçoso da sua parte assumir que o seu julgamento pudesse prevalecer sobre a sabedoria de Deus. Quem é que Ele era para se colocar contra todo um povo que aceitava a lei sem criticá-la?”

Esta tentativa de perceber como nasceram os ensinamentos de Cristo, procurando as suas raízes nas condicionantes sociais e políticas do seu tempo, e tentando percebê-las como fruto de uma reflexão pessoal do próprio Jesus, na minha opinião, correm o risco de reduzir Jesus a um filósofo ou pensador, e os Seus ensinamentos como uma ideologia (ainda que cheia de beleza e humanismo).

Devo acrescentar que considero que os Manifestantes de Deus (i.e., os Profetas fundadores da grandes Religiões Mundiais), apesar da Sua aparência humana, possuem uma condição divina que nós não podemos apreciar, nem entender plenamente. Acredito também que o Seu conhecimento da realidade (material e espiritual) não foi adquirido, mas é inato.

Por esse motivo, não faz sentido especular sobre em que pensaria o Jesus perante um determinado episódio, ou tentar interpretar os Seus ensinamentos como frutos de uma reflexão pessoal.

De qualquer forma, seria interessante ouvir as opiniões de amigos cristãos sobre este assunto.

2 comentários:

maria disse...

Olá, Marco

Em primeiro lugar um elogio e um lamento: Louvo o teu esforço de "leitura" de Jesus. Eu não sei nada da tua fé.

Não estou muito de acordo contigo. Concordo mais com o autor que citas. Embora o meu conhecimento da opinião dele é a penas a que veiculas.
Recentemente um autor católico (padre teólogo), J. Pagola, escreveu sobre Jesus mais ou menos como o autor que citas. Isso vai desconstruir algumas ideias e noções que tínhamos, mas não vejo nisso mal.

Não te esqueças que os textos do Canone estão já envoltos na leitura teológica (sobre o ressuscitado) das primeiras comunidades.

A mim, também me custou dar de caras com essa perspectiva diferente, mas depois da primeira impressão, esse Cristo é ainda mais digno de fé.

Um Padre da Igreja dizia:"Tão humano que só pode ser Deus".

abraço

Marco Oliveira disse...

MC

Costumo fazer esta analogia: um animal pode ver um ser humano apenas como outro animal, pois não tem capacidade para perceber a sua racionalidade, emoções e todas as características humanas. Por outras palavras, o ser humano está num plano de existência superior ao de um animal.

Da mesma forma, um Mensageiro Divino - como Jesus - pode ter aparência humana, pode viver entre humanos, e experimentar ao longo da vida todas as vivências humanas. No entanto, nós, simples humanos, não conseguimos compreender todas as Suas capacidades e potencialidades, pois Ele está num plano de existência superior em relação a nós.

É por isso que não me parece correcto tentar compreender Cristo apenas pelo lado humano. Parece-me muito redutor.