sábado, 31 de outubro de 2020

O Primeiro Conselho de Deus

Por David Langness


Ó Filho do Espírito! O Meu primeiro Conselho é este: possui um coração puro, bondoso e radiante, para que seja tua uma soberania antiga, imperecível e eterna. (Bahá’u’lláh, As Palavras Ocultas, do árabe, #1)
Antes de iniciarmos a nossa exploração d’As Palavras Ocultas, querem certamente saber alguns factos básicos sobre o livro. Para começar a compreender as frases belas e místicas do livro de Bahá’u’lláh, os leitores consideram útil ter alguma informação de contextualização.

Bahá’u’lláh escreveu este livro (com cerca de 50 páginas) em 1858, quando caminhava nas margens do rio Tigre, onde os historiadores dizem que nasceram as primeiras civilizações e a Bíblia afirma que o profeta Daniel teve a sua visão reveladora. Escrito em duas secções de línguas diferentes, a parte árabe do livro tende a ser um conjunto de conselhos espirituais simples e directos para a humanidade; a parte persa apresenta um conjunto de frases líricas mais extensas, místicas e simbólicas.

A tradução deste livro para inglês surgiu em 1932. A linguagem da tradução tem uma cadência e um tom elevados, quase bíblico, pois Bahá’u’lláh revelou As Palavras Ocultas, num estilo elevado, formal, altamente poético. Estas escrituras majestosas, que pretendem transmitir a voz, os valores e as virtudes de Deus para a humanidade, não podem ser reproduzidas com rigor numa linguagem comum. Mesmo para os leitores modernos, que normalmente não lêem as Escrituras ou os livros sagrados – ou não estão familiarizados estes livros – a tradução d’As Palavra Ocultas apresenta algumas expressões aparentemente arcaicas que pretendem representar ou reproduzir as intenções nobres e sublimes do texto original.

Cada uma das Palavras Ocultas começa com uma invocação e uma exclamação- “Ó Filho do Espírito!; Ó Filho do Homem!; Ó Habitantes da Cidade do Amor!; Ó Filho do Ser!” Estas invocações honoríficas dirigem-se ao leitor, de forma nobre e entusiástica, da perspectiva do Criador, apelando a cada um de nós que escute atentamente e medite profundamente.

(Um aviso: as Escrituras Bahá’ís deixam claro que as palavras “filho” e “homem”, usadas repetidamente nas invocações, não indicam apenas o género masculino. Bahá’u’lláh dirige-Se a toda a humanidade nas Palavras Ocultas, e estes nomes colectivos usados nas invocações iniciais não traduzem correctamente as línguas originais. Na verdade, estes nomes representam todos nós, sem fazer distinções entre homens e mulheres)

A primeira das Palavras Ocultas – e uma das mais conhecidas – apela para que cada um de nós tenha “um coração puro, bondoso e radiante”

Os ensinamentos Bahá’ís dizem que o coração humano – o centro da emoção, amor, espiritualidade e esperança – pertence a Deus, o nosso Criador. E aqui, falando do amor de Deus pela humanidade, Bahá’u’lláh torna claro:
Ele escolheu, de todo o mundo, os corações dos Seus servos e fez de cada um deles um lugar para a revelação da Sua glória. (Gleanings, CXXXVI)
Então o que quer Bahá’u’lláh dizer quando nos pede que tenhamos um coração puro, bondoso e radiante? Talvez uma das formas de compreender este excerto profundo implica pensarmos sobre como podemos esforçar-nos para desenvolver e alcançar virtudes pessoais - os atributos celestiais que são o alvo da nossa nobreza humana. Para fazer isto, podemos colocar a nós próprios umas questões aparentemente simples.

Quero ter um coração puro? Quero que a minha gentileza irradie para os outros? Ou preferia ter um coração cínico? Desejo ser desagradável, malvado(a) ou detestável?

Praticamente todas as pessoas querem desenvolver as qualidades e virtudes que Bahá’u’lláh descreve n’As Palavras Ocultas – pureza, gentileza, radiância. Os nossos corações anseiam por maturidade espiritual e pela saúde psicológica individual que estas qualidades descrevem. Os investigadores descobriram que este desejo ocorre naturalmente em quase todas as pessoas. Queremos ter corações puros, bondosos e radiantes – talvez porque conhecemos pessoas com essas qualidades e queremos amá-las, honrá-las e estar perto delas.

E se desenvolvermos essas qualidades, essas atraentes e refinadas características espirituais, então – diz-nos Bahá’u’lláh – conseguiremos “uma soberania antiga, imperecível e eterna.

Por outras palavras, cada um de nós tem a chave para a sua própria imortalidade. Bahá’u’lláh faz-nos aqui uma promessa implícita, assegurando a cada pessoa que trabalha para desenvolver o seu carácter espiritual, cultivando as suas melhores características e mais evoluídas qualidades, que tornará a sua alma imperecível e eterna.

Mas voltemos a estas perguntas simples – certamente que a maioria de nós deseja ter um coração puro, bondoso e radiante. Infelizmente, nem sempre nos sentimos puros, bondosos ou radiantes. Por vezes, sentimo-nos cínicos e desagradáveis; afinal quem não tem um pequeno ódio no seu coração? No fundo, somos todos humanos.

Este dilema central do ser humano – querer alcançar a pureza e a bondade, mas nem sempre se sentir puro ou bondoso – molda o rumo das nossas vidas e define a luta pela existência. 



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Texto original: God’s First Counsel (www.bahaiteachings.org)


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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site www.bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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